De volta após o recesso de final de ano, a coluna “Samba de Terça” vem mostrar um samba que, infelizmente, acabou sendo marcado pelos percalços no desfile, mas que merece ser relembrado ao trazer à avenida a reforma agrária, antes de movimentos como o MST.
O enredo é “Se esta terra, se esta terra fosse minha”. A escola, a Unidos de Vila Isabel, que vinha de um campeonato em 1988 e de um resultado bastante reclamado em 1989, quando a escola questionou diversas notas.
Para 1990, a escola de Noel preparou um enredo que partia de um argumento simples, mas eficiente: o que o branco, o negro e o índio fariam com a terra. Sob este simples argumento, a defesa da reforma agrária.
Lembro aos leitores que eram tempos de redemocratização. Fernando Collor havia acabado de ser eleito Presidente depois de 38 anos sem eleições diretas para o cargo. A oligarquia agrária era ainda muito poderosa – até hoje – e era uma grande ousadia da escola de Vila Isabel falar sobre o tema.
O enredo, de autoria de Paulo César Cardoso, foi desenvolvido pelo carnavalesco Ilvamar Magalhães, campeão pela escola em 1988. O samba era de autoria de Jorge Tropical, Jorginho Pereira, Anninha Guedes (falecida), Antonio Grande e Vilani Silva (Bom Bril).
A Vila Isabel foi a quinta escola a desfilar no domingo de carnaval, 25 de fevereiro. A escola veio com fantasias e alegorias que retratavam fielmente o tema sem cair na vala comum do panfletarismo. O belo samba foi cantado com garra pelos seus componentes, mas problemas com um dos carros comprometeram a Harmonia da escola e a impediram de obter a colocação que merecia.
Em uma apuração confusa, onde os quesitos tinham pesos, a escola obteve apenas o décimo segundo lugar, com 529 pontos. Era meu primeiro ano de Sapucaí e a avaliação que eu faço é de que, mesmo com os problemas enfrentados na avenida, a escola poderia ficar melhor colocada. Pelo menos a escola não foi rebaixada.
Vamos à letra do samba:
“Vem de longo tempo o mesmo cantar
Se esta terra fosse minha, se esta terra
Eu iria semear, semear
Assim disse o português
Ao ver tanto riqueza neste chão
Quando os invasores aportaram
Com a sede louca da ambição
Cana-de-açúcar e Pau-Brasil
Uma delirante obsessão
Brilhou no ouro a cobiça
Levando os bandeirantes ao sertão
Com o progresso e a colonização
Era o índio massacrado sem perdão
E o herói guarani
Gritou forte defendendo a sua terra
Mas de nada adiantou
Aquele grito de guerra
Se minha fosse esta terra
Das pedras nasceriam flores
Como sangue, suor e lágrimas
Cantou o negro em suas dores
Vindo lá das bandas do agreste
Terra seca do nordeste
O homem em busca de aventura
Quando a vontade mais pura do irmão
Era produzir no seu quinhão
Se esta terra fosse minha
É a Vila a cantar
Que felicidade é dividir
Com igualdade pra reforma, reformar“
Semana que vem – e até o carnaval – a coluna irá se deter nos Anos 2000, com desfiles em que estive presente. Iniciaremos esta minisérie com Paraíso do Tuiuti 2001, o primeiro desfile de minha vida.
Eu estava lá, foi justamente no dia que estreei à Sapucaí (domingo de carnaval). O desfile foi mais ou menos.
A melhor escola daquela noite, DISPARADA, foi o Salgueiro (“Sou amigo do Rei”, de Rosa Magalhães).
eu gosto muito deste samba. O Salgueiro foi muito bom, realmente.