Tem cada maluquice que eu vou te contar. Semana passada dei uma pequena entrevista, com meu camarada Beto Mussa, sobre a decisão do Ministério Público que liberou o uso de imagens religiosas nos desfiles das escolas de samba. Saiu no Jornal do Brasil de quarta feira.
Para minha completa surpresa recebi por email a informação de que dois importantes jornais franceses publicaram a coisa nas edições impressas e virtuais. Para ler as matérias é só clicar aqui e aqui .
Depois dessa só me resta publicar de novo, com pequenas mudanças, um texto que escrevi em 2006 em homenagem ao Carnaval e a um antigo professor de Francês. Lá vai:
Ninguém no mundo fedia mais que o meu professor de francês, o Patrick. Coisa impressionante. Só lembro de cheiro parecido quando, num calor de 45o , em um carnaval no início dos anos 80, o Manoelzinho Mota saiu fantasiado de faraó Ramsés II e passou da sexta-feira gorda à quarta-feira de cinzas com a mesma roupa, sem lavar sequer as mãos um único dia.
Mas o Patrick, como eu dizia, era um caso sério. Francês, pinta de intelectual, cheio das frescuras. Fedia como um gambá. Parecia honrar a memória do rei Luís XIV, que passou mais de cinquenta anos sem tomar um único banho, limitando-se a paninhos úmidos que atenuavam seu majestoso futum.
Falei do Patrick e, imediatamente, me lembrei do corsário Dugay-Trouen, o francês que, no início do século XVIII, apareceu por aqui com uma cacetada de navios de guerra e piratas da pior espécie e declarou que a cidade do Rio de Janeiro estava sequestrada. O governador, quando soube do sequestro, picou a mula e a população teve que se virar para pagar o resgate exigido pelo mequetrefe dos sete mares.
Uma testemunha desse episódio, o alferes João Alves de Lobato, lugar-tenente do alcaide, escreveu uma carta aos membros da câmara dos homens bons clamando por uma intervenção que tirasse os piratas franceses do Rio de Janeiro, argumentando que a população não aguentava mais o cheiro podre que os gauleses espalhavam pela Guanabara. Sequestro tudo bem, mas aquela fedentina não.
Dugay-Trouen deixou o Brasil, após receber o resgate, falando horrores dos trópicos e exaltando a civilizada França. O Patrick, por sua vez, também passava a maior parte das aulas cagando uma goma violenta sobre as maravilhas de Paris e defenestrando os hábitos cariocas. Esculhambava o nosso metrô, com suas modestas linhas 1 e 2, exaltando o monumental metrô parisiense. Como dizia minha avó, era um bom sujeito, mas metido a limpar cocô de galinha com colher de prata. E fedia, como fedia…
Um dia o Patrick declarou que voltaria a Paris em curto espaço de tempo, tendo por isso que deixar a turma. A rapaziada, que no fundo gostava (de longe) do monsieur, fez uma festinha de despedida. Clima amigável, boas recordações, comes e bebes e outros salamaleques.
Como somos um povo gentil, quase todos os alunos levaram lembrancinhas pro mestre, eu inclusive. Na hora da despedida, entreguei ao conterrâneo do queijo roquefort uma fita com noventa minutos de música. Falei pro caboclo:
– Professor, gravei uma fita com nossas músicas pro senhor sempre se lembrar do Brasil.
Ele agradeceu sinceramente comovido.
Nunca mais o encontrei. Imagino, porém, que a fita não tenha agradado muito. O que gravei? Bossa nova, sambas, choros e outros ritmos do patropi? Nem a cacete. Numa atitude digna de um devoto do espírito de porco, gravei uma única canção, uma marchinha carnavalesca, repetida mais de vinte vezes, a genial Paris , da dupla Alberto Ribeiro e Alcyr Pires Vermelho, composta para os jogadores canarinhos que foram à Copa do Mundo da França e gravada pela Carmen Miranda em 1938.
Pausa. Eu ia colocar agora a letra da marchinha, mas vejo que cometi um erro. Chamei o escrete de 38 de canarinho. Não era canarinho. A seleção ainda usava a camisa branca. Só passamos a usar a amarela em 1954, após concluírmos que a branca tinha dado azar e sido a verdadeira responsável pela derrota em 1950. Agora sim, a letra:
E eu também quis ir um dia a Paris
Pra conhecer o que havia lá
E ao ver o metrô a saudade apertou
E vim correndo pra cá
Paris ! Paris!
Teu rio é o Rio Sena
Paris! Paris!
Tem loura mas não tem morena
Que lindas mulheres de olhos azuis
Tu és a Cidade Luz
Paris, Paris, je t´aime
MAS EU GOSTO MUITO MAIS DO LEME !
Quando cheguei de alegria chorei
E achei o Rio lindo como que
Disquei 43-0023
– Amor, como vai você?
Pois é queridos, foi a minha pequena e implicante vingança e, ao mesmo tempo, acreditem, uma forma de homenagear o mestre fedorento.
Mais importante que isso foi ter sabido, tempos depois, que essa é a marchinha predileta do grande Tiago Prata, o maior conhecedor do gênero em sua geração, já que pesquisa marchinhas desde os seis anos de idade.
Ah! Chegamos em terceiro lugar na Copa de 1938; o Leônidas da Silva comeu a bola mas não deu pra ganhar o caneco. A saudade do Leme falou mais alto no peito da rapaziada.
Evoé!
Pois é, Simas, acabo de chegar de Paris e por lá, a fedentina continua: povo e cidade. Vale mesmo pelos museus, igrejas e alguns monumentos (apesar de muita coisa ser butim de bucanerias passadas).
Juntando a França com os PIIGS, a coisa anda ruim pra eles e já estou até vendo europeu desembarcando aqui, como ilegal. Temos que recebê-los dignamente: a bala de canhão (é a hora do troco!).
Grande abraço!
Oi Simas, para alguma coisa a fedentina francesa serviu. Ela deu um justo e grandioso motivo para os fabricantes de perfume! Já tive um professor francês mas, felizmente ele logo se naturalizou brasileiro e preferiu nossos hábitos de vários banhos por dia, então não tive o desprazer de conviver com o fedor francês, e ele continua aqui mais brasuca do que fracês. Valeu pelo texto! Evoé!
Simas, fui lendo,lendo, lendo, quando chegou na parte do Manoelzinho Mota, soltei um expontanea gargalhada das boas. Até me esqueci do fedor francês.
Abraços
Jairo Costa
GUIGO, os cabras fedem mesmo.Não conheço Paris, mas o Leme é bom pra cacete. Abraço.
DENISE, viva os índios, que sempre gostaram de banho!
JAIRO, aguarde que o Manoelzinho vai aparecer mais. Abração!