Neste texto, irei explanar sobre um dos principais motivos que levaram à guinada do eleitor carioca para candidatos representantes de propostas conservadoras e de direita: o avanço das seitas evangélicas.
Os últimos trinta anos tem sido marcados por um progressivo avanço destas denominações religiosas. Representam um tipo muito particular de protestantismo, distante da pregação original de fundadores como Lutero e Calvino. Sua doutrina é representada especialmente pela “Teoria da Prosperidade”, concebida no início do século passado. Esta prega, grosso modo, que podemos conseguir tudo que desejamos desde que ofereçamos ao Senhor o nosso esforço, especialmente monetário.
Aqui no Brasil, tais seitas religiossas grassaram especialmente a partir do final da década de setenta do século passado; que, historicamente marca uma fase de crise econômica no país e queda do padrão de vida das famílias. Em uma época onde a pobreza aumentava a doutrina das igrejas neo-pentecostais soava como um conforto e uma promessa de melhora material, especialmente às comunidades mais carentes.
Outro fator que nos ajuda a entender a expansão dos chamados “crentes” é um movimento duplo e praticamente simultâneo: o esgarçamento da instituição familiar por um lado e a retirada por ordem do Papa João Paulo II da Igreja Católica de uma maior ação social. Nas classes C/D/E, em especial nas duas últimas a igreja evangélica assumiu um conceito ampliado de família substituindo o núcleo local. Por outro lado substituiu progressivamente a Igreja Católica em assistência social.
Além da Teoria da Prosperidade e de toda a polêmica que a cerca – sobre a qual não explanarei aqui neste momento – estas denominações como um todo adotam uma visão da Bíblia bastante particular; não se deve empreender diversões que não sejam as da Igreja, não se pode beber, não pode fumar, música e dança somente as religiosas. Reivindicar seus direitos também não é correto pois “basta dar o dízimo e tudo retornará”.
Sem dúvida, há um componente econômico aí: dinheiro não gasto em “prazeres mundanos” é mais dinheiro doado à Igreja. Além do mais, gera toda uma engrenagem de Cds e DVDs “religiosos” com mercado consumidor certo. Ou seja, é um grande negócio.
Onde chegamos à política ?
Em duas direções. Primeiro no interesse das seitas em questão de terem seus representantes nas câmaras e assembléias a fim de defender seus interesses e influir em políticas públicas. Segundo que, por devotarem obediência absoluta aos pastores os membros destas Igrejas constituem um “voto de cabresto” bastante dócil e numeroso. Um maná de votos.
O auge da influência destes grupos nas políticas públicas foi sem dúvida alguma o Governo Rosinha Garotinho. A influência estendeu-se a tal ponto que para obter o “Cheque Cidadão”, principal programa de assistência social do Estado era obrigatório que o requerente pertencesse a uma destas seitas. Inclusive a distribuição dos cheques era feita tendo como intermediários pastores evangélicos.
Neste mesmo 2002 em que Rosinha se elegeu, o Bispo e então número dois na hierarquia da Igreja Universal do Reino de Deus Marcelo Crivella (foto) se elegeu senador, e o Presidente da Assembléia de Deus, Manoel Ferreira, ficou muito próximo de obter a segunda vaga – batendo candidatos como o ex-governador Brizola e o petista Édson Santos. Cerca de 30% da Assembléia Legislativa escolhida na época era ligada a um destes movimentos cristãos.
De lá para cá houve um refluxo nesta participação direta – muito pelo combate que a classe média fez a estes representantes – mas representando aproximadamente 30% do eleitorado carioca possui força suficiente para movimentar o pêndulo para um lado ou outro. Então chegamos ao objetivo deste post.
Ainda que com menor influência na elaboração de políticas públicas, embora  continue representativa, a instituição e seus líderes tendem a se aliar a políticos conservadores em sua práxis política. O posicionamento extremamente conservador em termos de costumes e regras encontra eco nos posicionamentos políticos conservadores e a mesma Teoria da Prosperidade implica em defesa de valores como a propriedade privada, a existência de classes sociais e da desigualdade – tudo é explicada por Jesus Cristo, e só se movimenta na pirâmide social aquele que mais oferece.
Resumindo, a existência de um “voto de cabresto” expressivo e bem definido somado à posição política dos líderes evangélicos semelhante a dos partidos de direita, com afinidades conservadoras leva a um “colchão” de votos bastante significante – e com “donos” bem definidos. Ainda que sozinhos não elejam prefeitos da capital ou governadores – as últimas eleições majoritárias deixaram isso bem claro – são uma força que empurra o poder político para a direita.
Finalizando, nas próximas eleições o candidato a governador deverá ser o ex-ocupante do cargo Antony Garotinho. Dada a sua rejeição em outros segmentos do eleitorado tenho dúvidas se terá forças para se eleger; entretanto será um ator político fundamental no quadro. Este capital de votos a “baixo custo” ainda atrai o atual governador, mas sua penetração é apenas marginal entre os principais líderes destas seitas.
O quadro político e a guinada à direita não se esgota aqui, embora seja um dos maiores fatores causadores. Retornarei ao tema.
P.S. – Escrevi aqui e aqui anteriormente outros dois textos (aviso, polêmicos) sobre as seitas evangélicas.

4 Replies to “Sobre a política carioca – III”

  1. já passei por várias religiões,hoje transcedi esta fase e acredito demais em Deus,adoro a doutrina de Jesus Cristo,sou devoto de São Judas Tadeu e Nossa Senhora,bom em termos de religião é isso,nada contra quem tenha ou deixe de ter,não sou ateu,muito pelo contrário mas não tenho religião,quanto a questão política migão como tem gente que gosta de ser enganada né não?votar em rosinha e garotinho sinceramente equivale a votar em arruda e roriz,como diria o canhota:é brincadeira he he e ontem no twiter disse que queria saber a sua nota para a atuação do torozinho ontem he he he e aí o que achou?fraquinho o jogo né,não entendi vaiar o love,pelo menos ele correu bastante,um abraço,ronaldo.

  2. Caro Pedro, como comentei lá no blog do Marco, acho que os votos do Garotinho nao se explicam puramente pelos evangélicos, como também nao concordo com a expressao que eles votam no cabresto dos pastores. Achar isso, é o mesmo que achar que os pobres que votam no Lula nao sabem o que fazem. Eu acredito na inteligencia das pessoas.
    Mas como o debate é sobre a política carioca ou fluminense, acho que a questao aqui é sobre como garotinho consegue votos, e eu acho q isso se explica na trajetória dele, a qual eu infelizmente conheco um pouco.
    um abraco.
    Brand Arenari

  3. Caro Brand, pelo menos a experiência que eu tenho mostra que boa parte dos evangélicos vota sim em quem o pastor indica. Obviamente que não todos.

    Seria interessante, a meu ver, que voc~e discorresse um pouco sobre a ascensão de garotinho. Publico até como um post à parte se assim preferir.

    abração e seja bem vindo

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