Bom, com atraso devido aos textos sobre a tragédia que se abateu na última segunda feira, temos a nossa coluna “Cacique de Ramos”, assinada pelo historiador, publicitário e um dos dezessete torcedores da Imperatriz Leopoldinense Fabrício Gomes.
O tema de hoje é a vida de um dos principais políticos dos tempos do Segundo Reinado e do princípio da República, Joaquim Nabuco. Boa leitura.
Joaquim Nabuco: as mil faces de um diplomata no Império

“O verdadeiro patriotismo é o que concilia a pátria com a humanidade.” (Joaquim Nabuco)

Joaquim Aurélio Barreto Nabuco de Araújo  foi uma das figuras públicas mais emblemáticas, principalmente por suas atuações e reflexões durante o Império no Brasil. Uma personalidade que só agora, nas efemérides do centenário de sua morte, começa a ganhar novos tons de estudos e análises.

Nascido em Recife, em 19 de agosto de 1849, Nabuco foi de tudo um pouco: político, poeta, orador, diplomata, historiador, jurista, memorialista, jornalista e, vejam só, um dos fundadores da Academia Brasileira de Letras – tomou assento na cadeira que pertenceu a Maciel Monteiro – e muito amigo de Machado de Assis, com quem trocou diversas correspondências – recentemente publicadas em livro.

Educado em família escravocrata, fez do contraponto pessoal (vocacional) sua própria virtude, sendo uma das principais personalidades entusiastas (e responsáveis) da Lei Áurea. “A escravidão permanecerá por muito tempo como a característica nacional do Brasil”, sentenciou. Escreveu duas grandes obras, perpetuadas nas égides da memória anti-escravagista: “O Abolicionismo” e “Minha Formação”, desafiando a elite conservadora da época. Uma de suas principais bandeiras foi a campanha contra a escravidão, na Câmara dos Deputados, em 1878.

Embora a historiografia até meados da década de 1980 considerasse improvável um monarquista ser, ao mesmo tempo abolicionista, Joaquim Nabuco era a mais completa tradução desses dois conceitos, que se auto-completavam em sua personalidade. A abolição não deveria ser feita de maneira ruptúrica, ou violenta; mas assentada numa consciência nacional dos benefícios que tal resultaria à sociedade brasileira. Atribuía à escravidão a responsabilidade por grande parte dos problemas enfrentados pela sociedade brasileira, defendendo, assim, que o trabalho servil fosse suprimido antes de qualquer mudança no âmbito político.

Também não creditava a movimentos civis externos ao parlamento o papel de conduzir o processo abolicionista. Este só poderia ocorrer no parlamento. Fora desse âmbito cabia somente assentar valores humanitários que fundamentariam a abolição quando instaurada. Foi um crítico feroz da Igreja Católica, que acusava de ser omissa quanto à escravidão. Com a Proclamação da República, em 1889, Nabuco retirou-se do cenário nacional durante algum tempo. Nessa fase de espontânea abstenção política, Joaquim Nabuco viveu no Rio de Janeiro, exercendo a advocacia e fazendo jornalismo. Freqüentava a redação da “Revista Brasileira”, onde estreitou relações e amizade com Machado de Assis, José Veríssimo, Lúcio de Mendonça; cujo convívio fez nascer a Academia Brasileira de Letras em 1897.

Em 1901, voltou à diplomacia como embaixador do Brasil em Londres e, a partir de 1905, em Washington. Em 1906, veio ao Rio de Janeiro para presidir a 3ª Conferência Pan-Americana. Era defensor do pan-americanismo, no sentido de uma ampla e efetiva aproximação continental. Foi um difusor nato da obra de Luís de Camões, chegando a escrever conferências sobre o tema.

Era dotado de grande prestígio entre as autoridades americanas. Quando faleceu, em 17 de janeiro de 1910, em Washington, seu corpo foi conduzido em ato solene para o cemitério da capital norte-americana e depois trasladado para o Brasil. Do Rio de Janeiro foi transportado, finalmente, para o Recife.

Lutou pela liberdade religiosa no Brasil, justamente numa época onde o catolicismo era a religião oficial do país. Tendo Ruy Barbosa como parceiro nas causas defendidas, defendeu a laicização do Estado brasileiro, seja no ensino público, como também na vida civil.

Ainda nos Estados Unidos, fez doutorado em Letras na Universidade de Yale, recebendo diversas honrarias. Mas sua atuação não se restringiu apenas à América do Norte, tendo vivido, ainda na Inglaterra e na França, onde presidiu a Conferência de Pan-Americanos, em 1906.

Exatamente um século depois de sua morte, em 2010, foi aprovado e instituído através de lei federal o Ano Nacional Joaquim Nabuco – quando fez-se o acordo entre Brasil e Vaticano prevendo a possibilidade de ensino religioso nas escolas públicas – o que por coincidência era extremamente contraditório com os firmes propósitos de Nabuco.”