Fechando o sábado com chave de ouro, mais uma coluna sobre o blog e a diversidade de opiniões. Desta vez sob um ângulo mais histórico e menos pessoal.
E História é a especialidade da coluna “Cacique de Ramos”, do publicitário e historiador Fabrício Gomes. Que apesar de estar em campo radicalmente oposto na esfera política é um grande amigo e extremamente inteligente.
Sem delongas, passemos a palavra a ele:
A diversidade de opiniões: das raízes históricas ao mundo virtual
“Neste jubileu de 1 ano do blog Ouro de Tolo, gostaria de escrever sobre algo que me parece a gênese deste espaço virtual: a diversidade de opiniões e o que está implícito por trás dessa iniciativa.
É interessante constatar que se hoje é possível entrar num blog, escrever uma carta – ou e-mail – a um jornal, telefonar e enviar um vídeo para um programa de TV, nem sempre a história nos privilegiou com esse tipo de democracia. Na Grécia Antiga, por exemplo, era comum as pessoas se reunirem para ouvir discursos, ao mesmo tempo em que era possível debater sobre política (não no stricto sensu que conhecemos hoje), filosofia ou parábolas. Mas a democracia é um conceito recente, se comparada com a amplitude dos tempos antigos.
À medida que o tempo passa, gerações têm o privilégio de contar com meios de acesso a informações e isso acaba sim, por gerar maior quantidade de divergência de opiniões. Natural e muito saudável, já que não somos uma sociedade robotizada, tampouco standartizada. É conseqüência natural a diversidade quando contrastada com os novos tempos da internet, por exemplo, onde as redes sociais permitem que cada um de nós seja direcionado para comunidades específicas as quais nos sentimos atraídos. Hoje, qualquer um pode dizer “Ah, esta não é a minha praia”. Será que há 50 anos, isso seria possível, por exemplo?
Talvez seja por isso, ainda que quando nos deparamos com exemplos de ditaduras ainda existentes pelos quatro cantos do planeta, sejamos acometidos de um misto de sentimento que abrange espanto e criticidade. Justamente porque a tirania não combina mais com a realidade em que vivemos. Mas uma ressalva: o que hoje entendemos por Tirania, é influenciado pela conotação negativa que o termo adquiriu. Tirania era uma forma de governo usada em situações excepcionais na Grécia em alternativa à democracia. Nela o chefe governava com poder ilimitado, embora sem perder de vista que devia representar a vontade do povo. Hoje, entre sociedades democráticas ocidentais, o termo tirania tem conotação negativa. Algumas raízes históricas disto, entretanto, podem estar no fato de os filhos do grande tirano grego Pisístrato (que era adorado pelo povo, pois fez a reforma agrária e dava subsídio) terem usufruído do espaço público como se fosse privado, sendo assim, banidos e mortos.
O cerceamento de liberdade de expressão é algo inconcebível para a sociedade contemporânea. Peguemos o exemplo de dois torcedores de futebol, que torçam para times ultra-rivalizados: um gremista e um colorado – fazendo aqui uma homenagem à Terra dos Pampas. Ambos certamente irão divergir sobre todos os assuntos que falem sobre futebol. Mas tente retirar deles a capacidade de se expressarem. Nesse ponto, ambos irão dar as mãos e gritar que são unidos pela mesma causa – a de poderem dizer o que acham e pensam sobre tudo – incluindo o fato de ambos maldizerem o juiz da partida.
Acontece a mesma coisa quando analisamos o poder de comunicação que um blog possui. Quem visita um blog, está interessado, antes de mais nada, em debater sobre um fato analisado pelo colunista – ou colunistas, pegando como exemplo este blog que aqui reside. A relação entre emissor e receptor torna-se um positivo emaranhado de subjetividade, onde o sujeito é multidisciplinar: tanto pode ser o colunista, como também aquele que debate e argumenta com uma opinião concordante ou discordante (na maioria dos casos). Se há moderação no blog, temos aí mais um sujeito – que nesse caso, é um sujeito “oculto”. Mas não interessa aqui definir os atores sociais do microcosmo em questão; mais do que nunca, a importância reside justamente na aplicabilidade do conceito de democracia – e porque não, POLÍTICA – que iniciamos este artigo. Democracia porque permite a convivência, no mesmo ethos virtual, de internautas sem rosto, mas com opiniões e senso crítico. E Política porque, utilizando o conceito da filósofa alemã Hannah Arendt, na medida em que mais pessoas debatem – e divergem em suas opiniões – eis a política.
Para Hannah Arendt “O sentido da política é a liberdade”. Segundo ela, a idéia de política e de coisa pública surge pela primeira vez na polis grega considerada o berço da democracia. O conceito de política que conhecemos nasceu na cidade grega de Atenas e está intimamente ligado à idéia de liberdade que para o grego era a própria razão de viver.
Segundo Arendt, “a política baseia-se no fato da pluralidade dos homens”. Destarte, ela deve organizar e regular o convívio dos diferentes e não dos iguais. Para os antigos gregos não havia distinção entre política e liberdade e as duas estavam associadas à capacidade do homem de agir, de agir em público que era o local original do político. O homem moderno não consegue pensar desta maneira pelas desilusões em relação ao político profissional e a atuação desse no poder.
Torna-se imprescindível então, recorrer à análise da biografia da própria autora, judia, que viveu os horrores da Segunda Guerra Mundial, e acreditava na ação do homem e na sua capacidade de “fazer o improvável e o incalculável”.
Por isso que divergir de opinião é condição ‘sine qua non’ para alcançar o status de “ser político”. No entanto, essa comparação pode trazer uma amardilha implícita já que algumas pessoas, por não terem capacidade de argumentação, acabam utilizando os meios virtuais simplesmente para fazer propaganda apenas de suas ideologias, sem se preocupar em argumentar e, batendo na mesma tecla novamente, “fazer política” no sentido de expor suas idéias próprias. A saída para essas pessoas, na maioria dos casos, é recorrer às mais primitivas formas de expressão, desprovidas de qualquer senso de inteligência: ofensas, palavrões e imposições vazias de argumentação.
Não é o caso deste blog, que a cada dia, a cada Page view, torna-se mais político por permitir às pessoas utilizarem sua “polis” virtual para expressar liberdade de opinião.
Parabéns ao Ouro de Tolo!”

P.S. – Não deixe de participar da promoção de aniversário do Ouro de Tolo. O post para inscrição está aqui.