Neste dia de aniversário do Ouro de Tolo, teremos dose dupla da coluna “Sobretudo”, assinada pelo publicitário e amigo Affonso Romero. Hoje em edição especial e amanhã em coluna “normal”.
O tema de hoje é justamente sobre o blog e seu fundador. Acho que não mereço metade do que ele escreve, mas fica o recado.
Aproveito para dizer que posso até discordar do que os colunistas escrevem, mas a inteligência e o bom texto são cultivados e estimulados. Isto é o mais importante. Um bom debate enriquece bastante o ser humano.
Por outro lado, minha filosofia é publicar os textos dos colunistas exatamente da maneira que foi escrito. No máximo, correções ortográficas ou ligeiras correções de estilo a fim de tornar melhor a visualização.
P.S. – Ele escreve sobre o Toró, mas eu publiquei um texto de autoria dele mesmo onde minha oposição era muito mais inflexível e discordante…

P.S.2 – O post com a promoção dos livros está aqui.
Vamos ao texto:
OURO DE TOLO, 1 ano – Ah, se a imprensa toda fosse assim…
Quando eu escrevo para esta coluna Sobretudo aqui no Ouro de Tolo, meu texto vem sempre acompanhado de um sentimento tão fundamental ao ser humano quando raro: liberdade.
E antes de explicar exatamente como eu vivencio esta liberdade, permita-me contar um pouco de como os meus textos acabaram vindo parar aqui.
Eu e o Migão participamos de uma mesma lista de discussão sobre o Flamengo: a Fladeverdade. Minha chegada na lista não foi, digamos, das mais tranquilas. Acontece que, naquela época, eu estava dirigente do rubro-negro da Gávea. O verbo é este mesmo: “estava”.
Alguns dirigentes esportivos “são” cartolas por uma vida inteira. Tenham ou não outras atividades profissionais, são sujeitos que, para o bem ou para o mal (infelizmente, no mais das vezes, para o mal mesmo), entram na vida política de um clube para não mais sair. E, gestão após gestão, seja na ativa ou na oposição, eles participam das decisões do clube e, em muitos casos, vivem disso sem, no entanto, terem o compromisso de serem profissionais da área.
Graças a Deus, nunca foi o meu caso. Eu estava no meio a um Mestrado em Administração e tinha interesse no estudo da gestão de empresas e/ou instituições ligadas à indústria do entretenimento. Em especial, ao esporte, ao futebol e ao Flamengo que, além de ser uma paixão, eu sou sócio desde que nasci. Meio que por acaso, eu acabei sendo sondado para ocupar uma posição de retaguarda na administração do clube. Claro que o convite me honrou profundamente, e eu procurei fazer um bom trabalho. Entretanto, mantive um espírito crítico, de quem não tem ambições ou filiações políticas.
Sobretudo (ops!), meu negócio era propor soluções para o problema da falta de conforto e segurança nos estádios e, por tabela, eu acabei atuando na área de Marketing e, depois, em questões de Planejamento. Enfim, eu era um dirigente muito atípico. Se era para atuar full-time naquilo, que fosse como profissional de Administração e Marketing que, por formação acadêmica, eu sou. Como dirigente amador, minha validade tinha prazo curto.
Na lista, por algumas oportunidades, eu abri publicamente questões que até então eram tratadas a sete chaves no meio político do clube. Nunca tive medo de escancarar estas discussões. Mesmo assim, era clara a má-vontade de alguns membros daquela lista em relação à presença de um dirigente.
Até que uma discussão específica azedou completamente o caldo: eu afirmei, assim meio que por provocação a uma colocação anterior feita, que o Flamengo era tratado como se não tivesse dono, mas que tinha dono sim, e que estes eram os seus sócios-proprietários.
Amigo, deixe-me explicar melhor, antes que eu me torne um antipático até para o caro leitor: o Flamengo, como sentimento, tradição, conceito, glórias etc., não é e nunca vai ser uma instituição privada, e isso independe do aspecto jurídico ou societário. A posição que eu quis marcar era a de que, do ponto de vista patrimonial, no arcabouço jurídico, o Flamengo tem donos, e é uma pena que estes donos patrimoniais não tratem do clube como donos que são. Porque, se cuidassem do que é seu, não deixariam as seguidas administrações fazerem e desfazerem, a ponto de acumular uma dívida de 300 milhões.
Mas quem estava aberto para ouvir a explicação? Logo no primeiro post recebi uma enxurrada de ofensas. Acho que, na minha tendência natural para a polêmica, eu exagerei na mão e levei a pior. Hoje, depois de uns anos de convívio virtual, a turma já acostumou com meu jeito de ir escrevendo as coisas de uma forma direta e rude. Algumas pessoas não estão mais na lista e eu deixei de ser dirigente há tempos. Ainda assim, quando querem pisar nos meus calos, me lembram desta história de o Flamengo ter dono, como se eu tivesse falado algo irreal.
O Migão me conheceu assim. E sempre procurou ponderar o que eu estava dizendo, nunca teve uma atitude preconceituosa em relação ao que eu escrevi naquela lista. Na dúvida, antes de atacar ou entrar na polêmica fácil, ele mandava em privado a opinião dele. Muitas vezes, eu o tive como oponente em alguns debates. E, entre nós, nunca nos negamos o direito ao controverso, a emitir uma opinião divergente. E, assim, nós fomos construindo uma relação de confiança. Vejam bem: não quer dizer uma relação de concordância permanente, quer dizer que nós abrimos e mantivemos aberto um canal leal e decente de diálogo. Isso, numa lista que envolve uma grande paixão de ambos, o Flamengo, e em que o sentimento está à flor da pele o tempo inteiro.
O Migão é o cara que contemporiza sem ser “Maria-vai-com-as-outras”. Ao contrário: a opinião dele é firme, delimitada. Às vezes, até inflexível. Quando ele cisma com alguém ou alguma coisa, não há o que faça o teimoso relativizar. O Toró é um perna-de-pau inútil, não tente convencê-lo de que talvez ele possa ser usado em determinada situação. Não, e pronto. E, ainda assim, é este mesmo cara que é capaz de defender até a morte o seu direito de dizer o oposto ao que ele pensa.
Eu, qualquer dia ainda vou testar este limite do Migão ao controverso, esta mabeabilidade democrática, fazendo uma coluna em ode ao Toró. Se ele publicar, publicará qualquer coisa.
Foi por isso que eu acreditei que poderia vir a fazer uma coluna semanal (ou quase semanal) aqui, que esta coluna poderia se chamar “Sobretudo” e que realmente eu teria o aval do Migão para escrever sobre absolutamente tudo que me viesse à cabeça. E ele sabia muito bem que eu poderia vir a ser polêmico, politicamente incorreto e até desagradável. E há um acordo tácito, sempre perfeitamente respeitado, de que ele não alterará o que eu escrevo, nem ponderará se eu deveria ou não fazer determinada abordagem.
Talvez eu seja um censor, ou autocensor, muito mais rigoroso por conta disso. Eu respeito este espaço, e não quero sujar a área com uma polêmica gratuita a partir de uma posição meramente provocativa. Não que isso tenha sido pedido a mim, mas em respeito ao alto nível com que os temas são tratados neste blog.
O Migão apresenta meu post e, algumas vezes, diz explicitamente que há algumas colocações minhas das quais ele discorda. É assim: o cara é o dono da bola, discorda, mas posta mesmo assim. Louvável. Tanto manter a coluna intacta, quanto dizer ao distinto público que há uma outra opinião àquilo.
Blog, normalmente, é uma coisa tão autoreferente, tão vaidosa de si mesma. E o Migão se preocupa em dar visões complementares, até mesmo opostas, e para isso convida os amigos a colaborar aqui em colunas com tamanha liberdade.
E ele jamais escreveu sobre isso. Ele, modestamente, exercita uma forma o mais democrática possível de jornalismo, sem sequer ser jornalista, mas tendo o melhor do espírito puro do bom jornalismo correndo nas veias.
Eu sou prolixo, e ocupo a lista Fladeverdade, com assiduidade doentia, com textos muito maiores do que o que admite o bom senso em listas de discussão. Até que alguém me sugeriu escrever um blog. E olha que isso veio em forma de elogio. Eu respondi que não seria capaz de ter a disciplina e a entrega necessária para escrever quase diariamente, manter a coisa funcionando, responder às pessoas. E resumi, dizendo: eu não faria tão bem, com a competência que o Migão faz o Ouro de Tolo. Foi então que o Migão, de bate-pronto, me ofereceu este espaço.
“ – Vai lá, escreve quando puder, de preferência escreve uma vez por semana, o sábado é teu.”
Este cara sobe um blog, faz um trabalho muito bom, conquista uma audiência, e me deixa escrever o que eu bem entender num dia que é o filé. O mínimo que eu podia fazer é tentar escrever bem, tratar você, leitor, com o respeito que todo leitor merece, e te dizer que você está num solo sagrado onde se respeita a liberdade de expressão.
Também poderia e deveria cumprir os prazos do “editor”, não deixar furos, mas aí não seria eu.
Obrigado, amigo Migão. Parabéns pelo primeiro ano do Ouro. Que muitos aniversários venham. Que esta idéia dê frutos, quem sabe inspira alguém da imprensa tradicional a respeitar o direito ao controverso, à liberdade e à diversidade.”

2 Replies to “Sobretudo Especial – Ouro de Tolo, 1 Ano”

  1. Realmente, vocês mandam muito bem. Eu não tenho esse desprendimento para conceder meu tempo ao próximo. Por isso aprecio mesmo o que vocês fazem…

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