Hoje, um domingo diferente.

Peço ao jornalista e amigo Marcelo Sudoh, lá de Tóquio, amigo, estudioso e grande conhecedor das baterias de escolas de samba, que trouxesse para o leitor um tema que debatemos na nossa lista de e-mails da PortelaWeb, o qual gere o site referência na escola do mesmo nome – do qual faço parte da equipe, embora um tanto quanto inativo.

O tema era a alteração da forma de tocar das caixas portelenses, que é magistralmente explicada no artigo. Apenas digo aos leitores que no ano em que desfilei na “Tabajara do Samba” (2004), sob outro mestre, muitos caixeiros trouxeram o instrumento nesta forma incorreta.

No vídeo acima, gravado por mim em janeiro deste ano, pode-se ver o trabalho do Mestre de Bateria portelense descrito no texto, de resgatar as tradições azuis e brancas.
Mas deixemos a explicação para o craque no assunto:

O rufar da caixa portelense

Uma troca de e-mails na lista de debates da PortelaWEB sobre caixas-de-guerra chamou a atenção do autor do Ouro de Tolo, que me pediu para escrever um artigo sobre o tema.

Lá, eu chamava a atenção para uma foto de O Globo Online (2007) onde um ritmista da bateria da Portela toca uma caixa-de-guerra apoiando-a com o braço e contra o peito, sem precisar usar o talabarte (cinto que permite pendurar o instrumento ao ombro). Essa forma de tocar exige o uso de uma baqueta curta na mão esquerda que praticamente não produz volume de som. Apenas marca a cadência e o tempo da batida.

O som produzido não é a batida tradicional da Portrela e o ritmista não deveria estar tocando daquela forma. Daí a troca de em-mails na lista da PortelaWEB.

No livro “Baterias, o coração da escola de samba” (Litteris Editora, 2010), o autor, Julio Cesar Farias, aproveitou parte dos estudos que fiz sobre a caixa-de-guerra e o tarol preenchendo quatro páginas da obra com o tema. Nesse estudo, tento mostrar como esses dois instrumentos – que não são africanos – chegaram às escolas de samba. Não vou repetir aqui o que está detalhadamente explicado no livro. Mas o que parece ter levado o autor deste blog a me pedir para escrever este artigo talvez tenha sido a descrição do que acontece quando o ritmista toca um tarol usando talabarte.

Os taróis são mais finos que as caixas-de-guerra e, ao pendurá-los com o talabarte longo no ombro, eles dançam com o impacto da batida prejudicando a precisão do toque e comendo o corpo da baqueta. Além disso, o tarol usado com o talabarte longo fica de pé com a pele que se bate virada para a frente (quando o correto seria meio inclinado para cima) e a pele de trás colada ao corpo, abafando seu som. É impossível tirar um som perfeito do instrumento nessa situação.

Para resolver esse problema, os ritmistas passaram a tocar o tarol abraçado ao peito ou com um talabarte bem curto que faz com que a pele de trás do instrumento fique apontada por baixo do braço, resolvendo o abafamento.

Na década de 70, essa forma de tocar acabou sendo usada também para as caixas-de-guerra, onde se passou a usar uma mistura de toque de caixa (rufado) com toque de tarol (espalmado e sem rufo). Foi assim que as caixas passaram a ser tocadas em cima substituindo os taróis.

Não é uma regra seguida fielmente por todos, mas caixas rufadas são tocadas embaixo com o uso do talabarte longo e caixas não rufadas – ou ainda com toque de tarol – são usadas em cima com talabarte curto ou enlaçadas pelo braço apoiando o instrumento no peito (como na foto do portelense citada acima).

No entanto, os taróis ainda estão presentes em escolas como o Salgueiro e a Vila Isabel – dentre outras – , mas são instrumentos adaptados ao uso das escolas de samba e não os originais usados pelas bandas marciais que tinham esteiras em vez de bordões.

Da mesma forma, as antigas caixas-de-guerra – usadas em bandas marciais e outras manifestações folclóricas brasileiras como banda de pífanos, folia de reis e maracatus (onde a chamam de caixa de pelica) – também passaram por modificações para se adaptarem ao desfile das escolas.

Um fato importante a se ressaltar é que o toque da caixa (e de tarol) sem rufo permite aumentar a velocidade da batida, puxando o andamento da bateria para frente. E as caixas tocadas dessa forma começaram a aparecer justamente na década de 70, quando um maior andamento das baterias foi exigido devido ao tempo de desfile que passou a ser contado e a tirar pontos.

As caixas rufadas não desaparecerem, continuam vivas na Portela, na Mangueira e no Império – só para citar as três mais tradicionais. No entanto sua rufada “também se modificou”, para que a escola não precisasse mudar totalmente essa característica em função da cronometragem.

Hoje, a caixa que se bate na Portela é o toque mais próximo do original e que serve as exigências do andamento do desfile. Essa mudança, que procurou preservar parte da identidade em meio as pressões do “show bussiness parade”, foi trabalho de Mestre Marçal, que exigia que as caixas fossem batidas embaixo e com a rufada característica das escola. Mestre Nilo Sergio vem trabalhando para isso para a alegria de Oxóssi!”

P.S. – Aida dá tempo de participar do sorteio da camisa, até amanhã no final da manhã o leitor pode fazer a sua  inscrição. Basta seguir as instruções no post da última sexta feira.

3 Replies to “O rufar da caixa portelense”

  1. Esse e-mail aqui vou querer ver de casa, pra poder ver o vídeo.

    Embora não saque mt de caixa, vou pitaquear.

    Esse ano, o do Estandarte, a Portela veio com sua batida de caixa “em baixo”, com rufada, aquela já tradicional, mas também veio com alguns caixeiros tocando em cima, estilo Tijuca e Estácio, pra, segundo gente da bateria, “dar mais pegada” à bateria. Parece que deu certo.

    Porém, alguém que não me lembro me disse que antigamente, beeem antigamente, a batida de caixa da Portela era reta, sem rufada.

    Alguém confirma isso?

  2. Realmente viemos com 15 (se não me engano) caixeiros, da tijuca mesmo, tocando em cima, o que ajudou a sustentar o ritmo…
    Quanto a historia da batida nao ter rufada antigamente, eu sinceramente nao sei dizer…

  3. ACHO, QUE A CAIXA OU O TAROL, BATIDO CONTRA O PEITO ABAFA O SOM, E A MEU VER A IDÉIA NÃO É ESSA, JUSTAMENTE O CONTRARIO, QUANTO MAIS RUFADA MELHOR.

    QUANTO A ACELERAR A ”BATIDA” PRA CABER NO TEMPO DO DESFILE, ACHO ERRADO TAMBEM, MAS AI A ESCOLA TEM QUE SE ADAPTAR AO SISTEMA, VAIAS PRA QUEM ”CRIOU” ISSO.

    VIVA PORTELA

    VIVA A TABAJARA DO SAMBA

    VIVA AS TRADIÇÕES

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