Na verdade este “Haiti, depois do inferno” deveria ter estado aqui antes de “Diplomacia Suja”, porque foi lido antes, mas optei por trocar a ordem devido à oportunidade do momento de então.
O livro, de autoria do correspondente da Tv Globo nos Estados Unidos Rodrigo Alvarez, é um relato da cobertura jornalística do terremoto que assolou o país caribenho, o mais pobre da América Latina.
Mas não somente isso: Alvarez traça um panorama do povo, do trabalho da Missão de Paz encabeçada pelo Brasil e explicita a arrogância imperialista do exército americano, mais preocupado em mandar e em ações pirotécnicas do que propriamente ajudar.
O relato começa com a odisséia que foi chegar ao país via República Dominicana. A equipe – formada também pela repórter Lília Teles e os cinegrafistas – alugou um helicóptero para ir de um país a outro, sem saber como seria a estadia no Haiti.
Entretanto, o Exército Brasileiro deu todo apoio aos jornalistas brasileiros: teto para dormir, alimentação, água potável e, o mais importante para os repórteres: uma conexão rapidíssima de internet para o envio das matérias ao Rio de Janeiro. Ou a São Paulo, dependendo da sede da emissora – haviam concorrentes ocupando o mesmo espaço, mas solidariedade não faltou.
Rodrigo Alvarez descreve, em um texto jornalístico mas caloroso, suas andanças pela capital Porto Príncipe sempre acompanhando as patrulhas dos militares brasileiros. Descreve a miséria e a total falta de infraestrutura do país, ainda mais agora depois do terremoto.
Também descreve a ação pirotécnica dos americanos, que desembarcaram com grande estardalhaço em Porto Príncipe apenas para mandar e fazer marketing para a televisão. O autor registra algumas pequenas escaramuças entre os militares brasileiros – que já estavam lá – e os americanos em sua exibição prepotente de força.
Outro ponto que me chamou a atenção foi o “código de ética” do povo local. Trabalhador que roubasse trabalhador, mesmo que fosse por comida e mesmo todos famintos, era linchado até a morte. O repórter também descreve com certo espanto a cena onde oito meninos dividem uma garrafa de água de meio litro que ele havia dado a eles.
Por outro lado, ele descreve a visita que fez a um resort para turistas americanos no norte do país, chamado Labadee. Duas empresas de cruzeiros marítimos mantém hotéis no local, onde as praias são mantidas isoladas do resto do país. Algo como um condomínio de luxo, com arame farpado, no meio de uma favela.
Finalizando, ele descreve a odisséia para deixar o país e os dias seguintes, onde ele sofreu de “estresse pós-traumático”. Passou alguns dias de folga no Brasil e ao retornar para New York passou a se questionar sobre os sentido das coisas que ele vivia ali com a tragédia instalada a apenas três horas de vôo – algo como daqui do Rio ao Recife.
Livro curto, intenso, com linguagem acessível e que se lê rapidamente. O autor encontrou o tom certo para descrever a tragédia, objetivo sem ser frio, caloroso sem ser dramático. Salta aos olhos o esforço do Exército brasileiro no país devastado não somente para manter a ordem como para prover algum tipo de infraestrutura ao Haiti.
Também recomendo para aqueles que possuem curiosidade de saber os bastidores de uma cobertura jornalística como essa, com os altos perrengues passados para enviar as matérias para exibição posterior.
E com preço acessível: na Livraria da Travessa, custa R$ 20. Recomendo.
Acabei comprando semana passada livro que saiu recentemente sobre o trabalho dos militares brasileiros no país latino americano: “Dopaz”, da jornalista Tathiane Stochero. Resenha próxima aqui – com a necessária comparação.