Nossa resenha de hoje é de um livro que já foi tratado aqui anteriormente, em uma das edições da coluna “Bissexta”, do advogado Walter Monteiro.
“Soccernomics”, do jornalista inglês Simon Kuper e do economista polonês Stefam Szymanski, procura explicar sob o ângulo econômico a paixão do futebol, à moda de livros como “Freaknomics”, “Superfreaknomics”, “Sob a Lupa do Economista”, “Falsa Economia” e outros. E estes chegam a conclusões surpreendentes quando utilizam no futebol os recursos teóricos da Economia e da Matemática.
O mote do livro, que perpassa todos os capítulos, é uma única frase: “a estupidez está para o futebol assim como o petróleo está para a indústria do petróleo”. Com este axioma simples os autores demonstram que na maioria das vezes os clubes são geridos com decisões que fogem aos padrões dos manuais de administração.
Um bom exemplo, descrito no Capítulo 4, é o método utilizado pelas equipes na hora de contratar um técnico. Normalmente não são levados em consideração fatores como a qualificação teórica, os cursos ou o conhecimento técnico, tático e – no caso europeu – financeiro. O que se leva em conta são a disponibilidade imediata, o poder de atração (ou de ser um bom “relações públicas”) e também terem sido ex-jogadores.
Outro capítulo muito interessante é sobre o mercado de transferências, com algumas dicas valiosas. As mais importantes seriam:
1) Estar tão disposto a vender bons jogadores quanto a comprá-los;
2) Jogadores mais velhos são sobre-valorizados;
3) Compre jogadores com problemas pessoais (com desconto) e depois ajude-os a lidarem com seus problemas;
Os autores argumentam que um bom desempenho no mercado de transferências pode mitigar outra das conclusões do livro: a de que o desempenho dos clubes nas competições é consequência direta do total de salários gasto – não, leitor: os autores não conhecem o Kleber Leite…
Também é muito interessante um ponto levantado pelos autores no mercado de transferências, embora seja mais válido para os clubes europeus: os dirigentes gastam fortunas muitas vezes obscenas para contratar os craques, mas não gastam poucos milhares de euros no auxílio à adaptação dos mesmos ao novo clube. Muitas vezes, isso faz a diferença entre o sucesso e o fracasso.
Os autores chegam a relatar um “estudo de caso” sobre o tema, que foi o da adaptação dos brasileiros ao PSV Eindhoven, da Holanda. Isso se tornou um diferencial na hora de agir no mercado de transferências, pois promissores jogadores daqui passaram a utilizar o clube para se ambientar à Europa e depois irem para clubes de maior expressão.
Debate-se também o tamanho microscópico dos clubes perto das maiores corporações mundias, e por outro lado o conceito de que “clube não quebra”.
Em outro trecho da obra, os autores aplicam modelos matemáticos ao desempenho das seleções nas competições mundiais, elencando premissas para a formação de boas seleções: 10 mil horas de prática de futebol enquanto jovem e renda per capita aproximada de US$ 15 mil são duas delas. Eles apontam a Turquia, os EUA e a Espanha como futuras forças do futebol – pelo menos quanto a esta última um prognóstico acertado, haja visto que o livro foi escrito antes da Copa do Mundo da África do Sul. E aponta o Brasil como perda de influência global, pois sua média de vitória já é tão alta – cerca de 70% dos pontos – que não tem muito para onde aumentar.
“Soccernomics” dedica parte de um capítulo a analisar a Copa do Mundo de 2014 e os Jogos Olímpicos de 2016, chamando a atenção para o seguinte fato: sediar estas competições não traz riqueza nem grandes benefícios econômicos. O argumento é de que, no caso brasileiro, ainda há a justificativa de que o país precisa modernizar os seus estádios a fim de atrair um público de maior poder aquisitivo, bem como a infraestrutura das cidades do país – em especial o Rio de Janeiro.
Entretanto, este fenômeno não passaria de transferência de renda de outros setores da economia para o setor de entretenimento ou esportivo.
Em outra parte, analisa-se o comportamento das torcidas e desmonta-se o mito do “torcedor monolítico e monogâmico”. Dividem-se os torcedores típicos em três tipos: os “fanáticos”, os “eventuais comprometidos” e os “eventuais negligentes” – estes últimos mais fãs de futebol que de equipes propriamente ditas.
Outra conclusão interessante é que bons desempenhos de seleções ou clubes em grandes competições diminuem o número de suicídios naquele país ou cidade não somente durante a competição como em períodos de tempo subsequentes.
Apesar de ser focado demais no futebol inglês, é indispensável para se entender o “negócio” futebol. Não esgoto aqui os temas, mas sem dúvida é um conhecimento que agrega valor e nos faz entender, muitas vezes, a irracionalidade e o empirismo da administração dos clubes.
E olha que eles escreveram sobre o futebol inglês, criticando acidamente o modelo de gestão dos clubes. Fico me perguntando se eles usassem como base da pesquisa clubes como o Flamengo, o Fluminense ou o Corínthians, por exemplo. Ou o futebol brasileiro como um todo.

One Reply to “Resenha Literária – "Soccernomics"”

  1. Migão, também li o livro e o considero fundamental, apesar de tão focado no futebol inglês. Mas o que se aplica ao futebol mais rico do planeta, se aplica ao quadrado no empobrecido futebol brasileiro. Sua resenha está perfeita e vou recomenda-la a amigos potencialmente interessados no livro.

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