No último domingo, aproveitando uma raríssima folga dos meus deveres domésticos, fui ao cinema assistir à grande coqueluche do momento: o filme “Tropa de Elite 2”, baseado na segunda parte do primeiro livro da série e no segundo livro – cuja resenha estará aqui daqui a pouco.
Acho que fazia uns seis ou sete anos que não ia ao cinema para ver um filme de adulto. Mesmo sendo uma primeira sessão, duas da tarde de domingo, não vi as imensas filas que amigos meus haviam me relatado anteriormente. A sala estava cheia mas diria, com otimismo, que havia cerca de dois terços dos lugares ocupados.
Basicamente, o público era de casais de namorados e jovens. “Senhores” sozinhos e de esquerda como eu eram a franca minoria. Em que pese a recomendação para maiores de dezesseis anos, haviam adolescentes mais jovens.
O filme mostra o já lendário Capitão Nascimento, treze anos depois do primeiro filme, já com alguns cabelos brancos e separado da esposa – vivida pela atriz Maria Ribeiro. Esta se casa com Freitas, ativista de direitos humanos e no início do filme grande opositor de Nascimento – personagem claramente inspirado no hoje deputado estadual Marcelo Freixo, que aparece em uma das primeiras cenas em uma “ponta”.
Logo no primeiro “take” a obra informa que é uma peça de ficção, mas eu diria, em cima do dia a dia e dos livros lançados recentemente sobre o assunto, que 95% do que aparece na tela são fatos reais. Uma ou outra “licença cinéfila” e o final do filme, mas o restante é a pura realidade.
No início há uma rebelião em Bangu I – na vida real, ocorrida em 2002 – onde um mau policial carcerário entrega armas e as chaves dos outros pavilhões – onde estavam presos de outras facções – a preso do Comando Vermelho. Estes invadem e saem matando inimigos – a morte de Uê é retratada em uma das primeiras cenas.
O defensor dos direitos humanos vai ao presídio para negociar e um dos soldados sob o comando de Nascimento, Ramiro – remanescente do primeiro filme – com a situação controlada, desobedece ordens e executa o líder da rebelião – em uma das “licenças” do roteiro.
Por conta disso Nascimento é exonerado do comando do BOPE, mas “cai para cima”: se torna subsecretário de Segurança do Rio de Janeiro. Então ele começa a ver como é jogado o jogo da política e a formação de um inimigo muito maior que o tráfico: a milícia.
As cenas mostram como a Polícia era utilizada para fortalecer o poder das milícias e serem úteis no jogo político-eleitoral. Crimes ficavam sem solução pois o governador e os responsáveis pela segurança pública dependiam destes votos.
Quem fica muito mal na história é o deputado e jornalista Wagner Montes. Um dos personagens do livro é um apresentador televisivo e deputado estadual que, também, é chefe da milícia. Os takes onde aparecem o programa de televisão da ficção são idênticos visualmente ao do programa do jornalista e deputado na Rede Record, inclusive com o ator André Mattos repetindo os maneirismos do apresentador.
A impressão que eu fico é que o apresentador foi “unido” na trama ao ex-deputado estadual – hoje preso – Natalino Guimarães, chefe da milícia de Rio das Pedras. Ainda que assim seja, o apresentador sai com a imagem bastante chamuscada, pois o filme deixa claro que o programa era utilizado no sentido de facilitar as ações das milícias.
Estas, na prática, surgem da necessidade de policiais corruptos “eliminarem” o intermediário do tráfico na propina e passarem a controlar diretamente as fontes de renda nas comunidades – além de oprimir a população e terem um cabedal de votos de “cabresto” que atrai qualquer político.
É isto que o filme mostra. As ações de segurança pública são orientadas não de forma a atender a população, mas sim a potencializar a candidatura do governador à reeleição. As milícias são estimuladas por representarem um cabedal de votos certo.
O papel da imprensa também é questionado no filme. Jornalista que investigava as milícias é descoberta, sequestrada, estuprada, morta e queimada. Seu chefe hesita até o último instante em publicar o material, pois “somos aliados do governador”. A redação do filme deixa claro que se refere ao jornal “O Dia”, que teve uma jornalista torturada na Favela do Batan, comandada por estes maus policiais, em 2008. Ao contrário do filme, a equipe de reportagem escapou com vida.
No filme aparece uma cena que é descrita no livro “Elite da Tropa 2”: após ter sido estuprada, torturada, assassinada e queimada, o crânio da jornalista tem o que restou dos dentes retirado para impedir uma posterior identificação. Tal prática faz parte do “modus operandi” miliciano conforme descrito no livro.
Também fica clara a conivência dos responsáveis pela segurança pública e o governador, em uma cena de um churrasco em uma das comunidades dominadas. Ser criminoso não importa, importa é que se traga votos. E há um detalhe que chama atenção para a referência ao atual governador na história, o partido fictício na campanha, o “PDB”.
No fim do filme, expulso da Polícia Militar, o Capitão Nascimento “abre o bico” na Comissão Parlamentar de Inquérito que investiga as milícias, o que causa algumas prisões e um banho de sangue – “queima de arquivo”. Entretanto, o governador se reelege…
Sem dúvida alguma, é um soco no estômago. Se para mim, que vem lendo sobre o assunto há tempos, me surpreendeu, imagino para aqueles que não têm interesse sobre o tema. Deve ter sido um choque. Há uma frase do Capitão Nascimento que chama a atenção: “a Polícia Militar tem que acabar”. Quem leu “Sangue Azul”, concorda.
Por outro lado, se tivesse sido lançado antes das eleições…
O leitor não pode deixar de ver.
Bem atrasada assisti hoje. A vontade que se tem é expplodir a quela porcaria de parlamento. Mas é claro que não poderia passar antes das eleições até porque, concordemos, e nós corcordamos que 95% do que passa lá é verdade, quiçá eu diria 98%