Novamente com o dia invertido com a coluna “Sobretudo”, temos hoje a coluna “Bissexta”, do advogado Walter Monteiro.
O tema de hoje é algo que envolve as reclamações de muitos homens divorciados: o que se chama de “indústria da pensão alimentícia.” O texto é um verdadeiro “guia prático da pensão”.
“Pensões Alimentícias – Falta Pão, Todo Mundo Grita, Ninguém Tem Razão”
O querido Editor-Chefe outro dia sugeriu que eu comentasse algo sobre a “indústria” da pensão alimentícia. Eu achei o tema meio démodé, até que vi um leitor pedir exatamente a mesma coisa na seção de cartas de uma revista badalada. Por último, fofoquei a conversa de uma mesa ao lado em um restaurante onde almocei e pesquei um sujeito se queixando da tal indústria. Dei o braço a torcer: o tema é palpitante.
Eu começo discordando do tema “indústria”. Efetivamente, não há, no Brasil, nenhuma “indústria” de processos, nem de danos morais, nem trabalhistas, muito menos de pensões. Esse termo é reservado para um esquema de ajuizamento de processos que pressuponha organização, centralização e objetivos bem definidos. Aqui no Brasil, salvo uma única exceção que vi em toda a minha vida de advogado, ainda não vi nada parecido com isso.
Quanto às pensões alimentícias, há muita incompreensão com as obrigações impostas pelo fim do casamento. Para começo de conversa, em casais com menos de 50 anos de idade a regra é que tanto o marido quanto a esposa trabalhem. Assim, é cada vez mais rara a fixação de pensão em favor da esposa (e claro, muito mais rara em favor do marido).
As pensões, via de regra, são instituídas para os filhos menores, embora sejam pagas a quem detém a guarda das crianças, quase sempre a mulher. Como é ela quem fica com a incumbência de receber os valores, o ex-marido fica com a falsa impressão de que a está sustentando.
A pensão não deve ser fixada como uma quantia exata dos gastos da criança em sentido estrito, até porque, convenhamos, isso é muito difícil de determinar para quem não tem o hábito de registrar milimetricamente cada gasto em uma planilha. A pensão deve ser um equilíbrio entre a necessidade efetiva da criança e a capacidade de pagamento do pai.
Assim, se o pai é uma pessoa bem situada na vida, desses que trocam de carro com frequência, viajam ao exterior todo ano e comem em restaurantes finos, não faz nenhum sentido que a pensão seja a soma da mensalidade escolar com as compras básicas do supermercado. Não tem nada mais cretino do que esses pais que insistem em pagar o mínimo à título de pensão e aproveitam para presentear os filhos com tudo do bom e do mais caro nos finais de semana que lhes compete, dando o péssimo exemplo de que estar com ele é mais vantajoso do que estar com a mãe, obrigada a negar até pirulito para economizar.
Deve até existir, mas eu, pessoalmente, nunca vi ou soube de pensão alimentícia muito alta imposta pela Justiça. Quando o “alimentante” (quer dizer, o pai) tem um emprego estável, a pensão é um percentual descontado diretamente na folha de pagamento. E fica em torno de 10% a 20% dos rendimentos (no máximo 30%), a menos que haja uma filharada numerosa. Quando não tem renda certa, se faz uma conta baseada nas variáveis que citei (necessidade e capacidade) e se fixa um valor reajustável anualmente.
E porque tem tanta gente pagando mais do que devia? Se você conhece um caso assim, pode investigar: a pensão foi fixada por acordo entre os ex-cônjuges. E a chance de fazer um mau acordo é bem grande. Por três razões principais, que vou listar:
· A PRESSA: as pessoas levam meses ou anos para se casarem, mas quando decidem se separar querem resolver tudo com a máxima urgência, com uma reflexão mínima. E embora jurem no altar, o casamento não é para sempre, mas a separação é quase, pois pode produzir efeitos até que os filhos atinjam 24 anos de idade (caso sejam universitários). Portanto, se os pais se separam quando o filho mais novo tem 4 anos, a decisão que tomarem ali vai ter impacto por 20 anos. Por que decidir em semanas ou mesmo dias algo que vai repercutir em décadas?
· A SOBERBA: o pânico maior do ex-marido é ver a ex-mulher torrar o dinheiro da pensão em viagens, namorados futuros e compras caras. Por isso o sujeito se esforça para colocar o mínimo de dinheiro na mão da ex e assume um monte de compromissos a serem pagos diretamente: a escola, o clube, o inglês, a natação, a babá, as aulas particulares, etc. Só que o tempo passa e às vezes a vida anda para trás. Não é fácil convencer a ex e o filho que a escola bilíngue deve ser trocada por outra mais em conta. Afinal, eles sempre viveram apertados por conta da pensão mixuruca e nunca acreditam que o pai já não está mais com essa bola toda.
· A GANÂNCIA: muito comum em empresários que tem algo a esconder, dinheiro de caixa 2, dólar no colchão, conta no exterior e afins. Como normalmente o acúmulo se deu durante o casamento e assim a ex tem direito a alguma fatia, ela exige a parte dela no acordo de separação para ficar calada. Ao invés do cabra dar logo a parte da mulher no butim e transformá-la em cúmplice do crime, ele fica horrorizado só de pensar em dividir a fortuna ou morre de medo da ex contar tudo para a Receita ou para a polícia. Então ele concorda em pagar uma pensão astronômica, só para deixar intacto o produto do ilícito. O qual, muitas vezes, nem vale o esforço, não dá nem para comprar um carro de luxo ou um apartamentinho no Méier.
Por isso, eu sempre insisto: quem paga muito de pensão provavelmente fez um acordo que pareceu o melhor dos mundos na hora em que foi assinado, mas cujo lado nocivo só veio à tona pela irresistível ação do tempo, esse cruel senhor da razão.
E fica aqui o meu conselho, obviamente em causa quase própria (há 5 anos decidi parar de atuar em casos de direito de família). Tem gente que acha normal pagar R$ 20 mil ou até mais em uma festa de casamento, que dura umas 5 horas e rende um DVD que só é visto muito raramente. Por que economizar na hora de escolher o advogado que vai te ajudar a decidir os rumos da sua vida por muitos e muitos anos?”