Neste domingo de GP Brasil, a coluna “Sobretudo”, do publicitário Affonso Romero. Como o leitor verá durante o texto, ele está envolvido indiretamente na organização do evento.
O tema da coluna são os desafios que a Presidente eleita Dilma Roussef tem em seu caminho nos próximos quatro anos, comparados aos enfrentados pelo próprio autor neste final de semana em curso. A propósito, informo que a questão do câmbio será tema de texto ainda esta semana.
Desafios
Passa um pouco de meia-noite de sexta para sábado. Supostamente, a coluna “subirá” daqui a pouco. Eu não deveria estar aqui, na frente do computador. Em primeiro lugar, Mestre Migão não merece estes prazos malucos de entrega do texto. Em segundo lugar, eu não tenho o mínimo juízo de ainda estar acordado. Explico.
Estou envolvido na organização do grupo de voluntários bilíngües que vai ajudar aos turistas estrangeiros a chegar ao autódromo de Interlagos neste final de semana de GP Brasil de F1. Tenho que chegar à estação Autódromo da CPTM, distante uns 500 metros da reta oposta, às 7 da manhã. Trabalho das 7 às 7 sábado e domingo. Isso, depois de uma semana duríssima. Meu corpo merecia mais cuidado da minha parte.
A semana, se foi puxada, por outro lado também me deu muitas alegrias. Para começo de conversa, sábado passado nós fomos assistir ao concerto da Orquestra JazzSinfônica em homenagem ao Gershwin, tocando a versão em formato de concerto da ópera Porgy & Bess. Depois, elegemos a primeira Presidenta e, na quinta à noite, assistimos a ‘Os 39 Degraus’, a adaptação para o teatro do filme de Hitchcock, que vira uma impagável comédia nos palcos. Pretendo voltar em breve a estes temas culturais e tentar dividir estas experiências com o caro leitor.
Abre parágrafo-parêntese – A telecoluna de Nelsinho Motta no Jornal da Globo de hoje (sexta) é sobre o McCartney. Um dos músicos que eu mais admiro na música pop internacional. E a coluna do Motta está melhor a cada semana, o texto dele é tão genial quanto os artistas dos quais ele fala. Sempre às sextas. – Fecha parágrafo-parêntese.
Depois de tanta diversão, a obrigação. Esta operação de recepção aos turistas dará resultados muito gratificantes, espero. Mas também está dando bastante trabalho.  Inclusive porque devo somar umas 24 horas de jornada extra no final de semana. Hoje (sexta) eu já estive por lá. Como tinha que levar umas camisetas para a equipe, fui de carro. Pegamos calor e trânsito na ida. Na volta, mais calor, um mega engarrafamento e, por fim, um temporal no encontro das Marginais Pinheiros e Tietê.
Em meio ao trânsito carregado, recebi no celular umas sete ou oito ligações, cada uma com uma situação diferente para ser resolvida. A última delas virou pendência que eu preciso resolver até as primeiras horas da manhã: o presidente da empresa quer saber onde fica o portão 5. Eu consultei todos os guias e sites na internet, não há portão 5. Mas há portões 7 e 8, de modo que é de se supor que haja (ou tenha havido algum dia) um certo portão 5. Eu garanti que não será um portão que vai me derrubar, o presidente pode me perguntar diretamente assim que chegar: onde é, afinal, o portão 5? Pelo amor de Deus: algum de vocês saberia informar onde fica o portão 5? [N. do E. – acho que, no horário em que a coluna for ao ar, não será mais necessário…]
Antes de eu ser apresentado a este desafio prático e imediato, eu havia pensado em uma coluna menos pessoal, mas também sobre desafios. Não desafios meus, pessoais. De certa forma, desafios nossos, no papel de cidadãos, de parte da sociedade. Mas, de uma forma mais específica, os desafios de Dona Dilma I, a Irascível.
Pela manhã, indo para o trabalho de trem, tive a sorte de ver levantar do assento o passageiro à minha frente, de modo a vir sentado metade da viagem. Pensei em cochilar um pouco, mas lembrei da coluna. Anotei freneticamente num pedaço de papel as prioridades do próximo Governo, já a partir de agora, em sua gestação. Como a lista não ficou nada pequena, serei sintético. Fica valendo como um pontapé inicial para discutirmos aqui a pauta da República, como se a nossa opinião fosse realmente importar (blogueiros, em geral, se dão uma importância desmedida, não é verdade?). Bem, vamos à listinha do dever de casa da Tia Dilma. 
Mais importante e vindo em primeiro lugar: domar seu temperamento. Dilma tem fama de estouradinha. Isso pode funcionar no palanque. Só no palanque.
Câmbio. Esta, nem precisa explicar. Do jeito que o real está valorizado, só para eu passear novamente em Buenos Aires no próximo verão é que isso é bom. Já passou da hora de fazer um ajuste.
Melhorar o gerenciamento dos projetos sociais. Bom outdoor do Governo, os programas sociais precisam ser tocados com mão de ferro para continuarem a fazer bonito.
Manter um bom relacionamento, senão um relacionamento ao menos possível, com a imprensa. Controlar as alas radicais da base aliada e neutralizar os cães ferozes da oposição. Enfim, mostrar uma habilidade política até aqui insuspeita.
Contentar a base de maioria no Congresso, e isso exige cargos e benesses, principalmente para o PMDB, que é mais difícil de ter como aliado do que como oposição. Manter um político malandro como Michael Temer na posição de Vice-Presidente. Nem mais, nem menos.
Acelerar o PAC. Para valer. Manter a distância correta de Lula. Nem mais, nem menos. Manter o ambiente empresarial competitivo, incentivar o empreendedorismo e resolver os nós do trinômio educação, segurança e saúde.
Cuidar da própria saúde e deixar de lado qualquer tipo de amargor pessoal.
Conciliar o boom de desenvolvimento regional, principalmente nas cidades médias e emergentes, com as necessidades das grandes metrópoles como Rio e São Paulo.
Promover um expurgo na máquina pública, melhorar a governança, o que possivelmente inclui um corte na própria carne do partido. Isso implica em reformular as formas de militância e renovar as bases. Ajudar a reforçar  a idéia de Lulismo.
Não renegar a história do PT, mas manter um afastamento cauteloso de movimentos sociais radicais, sindicalismo e movimento estudantil. E aproximar-se do emergente empresariado progressista. Dar sinais á nova classe média que o mesmo pessoal que inspirou a ascensão social de 30 milhões de brasileiros é capaz de mantê-los durante mais 4 anos no novo patamar. Esta classe média tende a se tornar cada vez mais conservadora.
Lidar com as reformas de base: fiscal, política, jurídica etc.
Enfim, a guerra está apenas começando. E será muito difícil. Ou não, como diria Caetano.”