No último sábado completamos os primeiros quinze dias de governo de nossa nova mandatária, Dilma Roussef. Ao contrário de outras transições, esta se caracterizou pela continuidade e pela ausência de ações espetaculares ou medidas de impacto.
Entretanto, nota-se uma diferença clara de estilos em relação ao ex-Presidente Luis Inácio Lula da Silva: sua atuação vem se notabilizando por uma atitude mais contida, discreta. Mais técnica.
Esta diferenciação vem de origem: enquanto Lula é um “animal político” no sentido estrito do termo, Dilma Rousseff tem formação técnica, mais voltada à gerência. Por outro lado, vem demonstrando um estilo mais centralizador que seu antecessor.
Seu grande teste estes primeiros dias foi a tragédia que se abateu sobre os municípios da Região Serrana do Rio de Janeiro. A Presidente não somente esteve na área como fez questão de caminhar nos locais afetados (foto), dando apoio moral e financeiro às vítimas e às municipalidades.
Não fugiu da responsabilidade do governo, apontando os problemas causados pela má ação do poder público e analisando as questões inerentes ao problema. Liberou verbas para o socorro imediato às vítimas e cobrou planos de longo prazo a fim de não somente reconstruir as cidades afetadas como prevenir a magnitude de tragédias deste tipo.
Avaliaria que ela passou neste primeiro grande teste.
Politicamente, deixou a cargo dos ministros Antonio Palocci e Luiz Sérgio a articulação com o PMDB, colocando um freio no apetite de cargos demonstrado por este último. Ainda retirou da esfera de influência do partido coligado os Correios e a Funasa, indicando auxiliares de confiança e deixando claro que nos cargos em estatais a política se subordinará ao técnico.
Teve de contornar situação envolvendo o presidente da Petrobras, José Sérgio Gabrielli, que apareceu em notícias na imprensa como “fora do agrado” da nova mandatária. Ela o reconfirmou no cargo, mas a minha avaliação – ressalvando que não tenho qualquer espécie de informação privilegiada – é de que haverá a troca assim que o novo marco regulatório do petróleo for definitivamente aprovado no Congresso e posto em funcionamento.
Como já escrevi antes, não houve uma única troca em nível de Diretoria ou Gerências Executivas nesta transição de governo, nem mesmo as tradicionais rearrumações de todo final de ano.
Também notabilizou-se por cobrar cortes de gastos públicos aos Ministros e reafirmar autoridade – o pito que ela passou no Ministro do Gabinete Militar por conta da questão dos desaparecidos políticos, tema bastante sensível a Dilma, que foi barbaramente torturada pela ditadura, é bom exemplo disto.
Sobre gastos públicos, faço um adendo: sem dúvida alguma há como se aumentar a eficiência das despesas – embora não passe pela demissão de funcionários – mas mais eficiente seria a redução da taxa básica de juros (Selic) a níveis reais civilizados, o que diminui o serviço da dívida pública e libera arrecadação de impostos para investimentos.
Sem dúvida alguma, sua forma de conduzir o governo é uma grande novidade não somente para o público quanto à imprensa.
O país se acostumou com um estilo de Presidente que seria quase um “super-herói”: alguém com características sobre-humanas, quase divinas. Basta lembrar que à exceção de Itamar Franco, todos os presidentes do período após a redemocratização tinham alguma característica vista pela população como “inatingível” em seu imaginário – ainda que não correspondessem exatamente à realidade.
Sarney era o literato; Collor, o “self made man”; Fernando Henrique Cardoso era o intelectual e Lula, o homem do povo que tinha tudo para dar errado e chegou à Presidência.
Apesar de seu passado de resistência à ditadura e de ter sido torturada, Dilma Rousseff é uma técnica de origem, com um estilo sóbrio e muito próximo da população comum, em especial de classe média. 
Não se engane o leitor, entretanto, ao achar que a Presidente não tem habilidade política: seus anos na Casa Civil do Presidente Lula e o que estamos observando não somente na montagem do governo como nestes primeiros dias tem demonstrado exatamente o contrário. A diferença é que seu modo de fazer política se notabiliza pela discrição, sem ações espetaculares e midiáticas.
Eu me arriscaria a dizer que esta característica da Presidente tem muito a ver com o período onde ela atuou na resistência ao Regime Militar. Discrição, paciência e tenacidade eram fundamentais para que o trabalho de oposição pudesse ser feito sem comprometer a segurança das pessoas. Ou seja, ela introjetou em sua personalidade estes princípios – era questão de vida ou morte na época – e deles se utiliza no exercício da Presidência.
Concluiria dizendo que é um novo estilo de governar, mais sóbrio, e que nestes primeiros dias não há reparos a serem feitos. Aguardemos o desenrolar do tempo, com a continuidade de programas natural e seus toques pessoais e programáticos em políticas públicas e de Estado.
(Foto: O Globo)