Gosto de Carnaval. Desde moleque sempre aguardei o tríduo com grande expectativa e me esbaldei na maioria das vezes. É, provavelmente, influência de uma família que sempre gostou da fuzarca de Momo. Me recordo quando, numa raríssima exceção, embarquei na canoa furada de uma viagem para um sítio na Serra da Mantiqueira durante a folia. Passei, seguramente, alguns dos piores momentos da minha vida entre as matas, rios, pássaros canoros e banhos gelados de cachoeira. Jurei nunca mais me comportar como um sandeu.
É possível que o carnaval ocorra debaixo de chuva. Sem problemas. Já brinquei debaixo d´água e sob sol escaldante. Prefiro mil vezes a chuva. Já desfilei em escola de samba às dez horas da matina, com um calor de torrar os miolos do capeta, e por muito pouco não bati o pino. Debaixo de chuva qualquer conhaque vagabundo colabora; sob um calor senegalesco, no embalo do alalaô, não tem cerveja que resolva.
Mas não quero falar sobre meu passado de folião. Para mostrar que sou tolerante com os que detestam os dias de folia, preparei, consultando jornais, sítios na rede e amigos, uma lista de programas off Carnaval (gostaram da expressão afrescalhada? Copiei de uma revistinha d´O Globo). Vejam como pode também ser divertido ficar alheio ao evento. Eis aí a lista com dez programas para quem não é chegado no ziriguidum:
1- Em São Paulo estão programadas, como nos últimos anos, missas com os padres cantores Marcelo Rossi, aquele que canta imitando elefantes e girafas, e Antônio Maria, cujo ápice da carreira sacerdotal foi ter celebrado a histórica união entre Ronaldo Fenômeno e Daniella Cicareli no Castelo de Chantilly, na França, sob patrocínio da revista Caras. Programaço.
2- Mostra de filmes inéditos no Centro Cultural Banco do Brasil. Imperdível para os cinéfilos que detestam carnaval. Enquanto eu estiver me preparando para desfilar no Império Serrano, por exemplo, o sujeito pode assistir a filmes do diretor tunisiano, adepto do cinema contemplativo, Abdellatif Kechiche, curtir uma mostra de filmes de jovens documentaristas da Indonésia e assistir a uma maratona sobre o olhar feminino no cinema do leste europeu.
3- Teatro. Nada melhor que uma ida ao teatro para os que detestam a folia. Não é o meu caso. Sempre tive vergonha alheia, que o tempo transformou em verdadeiro horror, de ver alguém no palco representando um texto. É mais fácil me encontrarem visitando o túmulo do Marechal Floriano Peixoto no São João Batista ( jazigo 125 – A, podem conferir) do que numa peça teatral. Aliás, o São João Batista é também uma dica interessante para os inimigos de Momo. Para quem preferir o Caju, indico o túmulo do Barão do Rio Branco, em mármore monumental e mais alto do que o vão central da ponte Rio-Niterói. O cemitério de Paquetá tem mangueiras centenárias, clima bucólico e não se escuta qualquer baticum.
4- Camarotes das cervejarias na Marquês de Sapucaí; sempre repletos de celebridades e personalidades do mundo político. É, sem a menor dúvida, o melhor programa para quem de fato detesta carnaval. O camarote da Nova Schin, por exemplo, costuma contar com os serviços do Buffet Fasano Bambi Bi, da cheff Camila Fasano. Esse tipo de informação, sobre os menus servidos em camarotes e quejandos, costuma ser o mote da coluna do Joaquim Ferreira dos Santos, n´O Globo. Só não me perguntem que diabos quer dizer Bambi Bi.
5- Em Búzios ocorrerá um festival de música eletrônica, programa ideal para panssexuais suicidas e artistas de vanguarda antenados com a cena eletrônica européia. No Ceará, nos dias de folia, o quente é o festival Ceará in Rock. O objetivo do furdunço, segundo os organizadores, é promover a integração musical e ambiental, com a presença de atrações estrangeiras e da cena nordestina, como o Comando Etílico (RN) e o SCUD, grupo de vanguarda do rock piauiense.
6- A catedral mundial da Igreja Universal do Reino de Deus, na Avenida Dom Helder Câmara, promoverá a “maratona do descarrego”. Durante quatro dias pastores realizarão exorcismos e descarregos em tempo integral. A igreja promete encerrar o evento com a realização do ritual da fogueira santa de Israel, onde os bilhetes com pedidos dos devotos arderão na pira do Leão de Judá. Promete ser mais animado que o desfile da Grande Rio falando sobre a superação do ser humano diante de adversidades.
7- Mostra “Carl Theodor Dreyer e Lars Von Trien: os cineastas da vida interior”, na Caixa Cultural Rio. Programaço! Contem-me depois como foi assistir a maratona de filmes instrospectivos, com direito a um debate sobre o cinema dinamarquês ontem e hoje.
8- Caminhadas ecológicas. Eis um programa tremendamente interessante para os que detestam o tríduo. Há uma série de caminhadas ecológicas, que podem ser feitas com o auxílio de grupos especializados, previstas para o reinado de Momo. A empresa “Caminhos do Coração”, por exemplo, organizará trilhas na Floresta da Tijuca, no Morro da Urca, na Pedra da Gávea e na Serra dos Orgãos, com direito a banhos de cachoeira e paradas para meditação. Deve ser tremendamente divertido, sobretudo se chover.
9- Festa na boate Privilège, em Búzios, com a dupla americana de house music Deep Dish. Em pleno sábado de carnaval, o programa ideal para os descolados e o público que curte (é isso que está escrito na propaganda do evento) a fusão entre música de vanguarda, moda vintage, filosofia e pop art. É o programa mais indicado para rapazes frescos e jovens lésbicas intelectualizadas.
10- Fim de semana prolongado no Hotel Fazenda Santa Cruz, nas imediações de Barra do Piraí. Leite tirado na hora, diversões temáticas para crianças, sessões de power yoga e tai-shi-shuan para a terceira idade e, importantíssimo, shows de MPB e jazz. Sessões de relaxamento com terapeutas especializados, massagens com pedras pegando fogo, oficinas de origami e palestras sobre culinária orgânica são opcionais e não estão incluídas no pacote.
Depois dessas dicas que provam, repito, minha compreensão em relação aos não carnavalescos, abrirei a primeira gelada do dia, às margens do Rio Maracanã, colocarei uma farofa nos pés de Exu, que não sou besta, e declararei em breve aberto o meu Carnaval.
Evoé!
Convidaram-me, indeclinavelmente, para curtir o sossego de Penápolis/SP, terra de Sabrina Sato, a cidade com o maior número de sorveterias por habitante e por metro quadrado no mundo!. Não podia recusar então restou-me o direito a uma condição: só vou depois do Bola. Nos vemos lá!
Prezado Luiz sempre te acompanho. Observo c/atenção s/textos. Mas, hj vc. se superou m/camarada. Na verdade estamos precisando de humor inteligente para viver c/esta realidade em transformação que estamos, ainda, vivendo. Obrigado. Estenio El-Bainy
Rolei de rir, velho. O Globo não se emenda, não é? Quem assina esse lixo de matéria com essas dicas, hein?!
Luiz, convido a ti e a teus leitores para conhecerem e participarem com suas produções literárias do Urbanasvariedades, o modo long play do Urbanascidades, blog cultural de produção coletiva. Visite urbanasvariedades.blogspot.com. e solte o verbo.
Um abraço,
Paulo Bettanin.
Mestre, tambem tô “off” pro off-carnaval, há anos que na Serra de Guaramiranga, próximo à fortaleza tem um festival de JAZZ e BLUES no carnaval. Nada contra só não me convidem tambem.
Abraços
Tem também o maravilhoso e atraente “Encontrão”, que reúne católicos fervorosos em mega-cultos durante o carnaval. Esse ano, na belíssima Ituporanga-SC.
Hilário.
Oi Luiz, tudo bom? Estou dirigindo um documentário sobre futebol e achamos genial sua crônica ‘A receita pra levantar o caneco’ e pensamos numa adaptação dela para o filme. Teria algum contato pra falar c vc? eu estou no 11 21746814 ou 11 96009926 beijos
Olá! Não me pergunte como encontrei o blog, mas simplesmente adorei. Também sou dessas que não entende quem gosta de viajar no Carnaval. O mundo vem para cá para viver nosso carnaval e os moradores daqui fogem…
Eu também venho de uma família de sambistas, de pais que se conheceram em barracão de escola de samba, ela era cozinheira do barracão e ele montava carros alegóricos. Depois ela fazia perucas para as escolas de samba com o auxílio do meu pai.
Então não teve alternativa, nasci sambista, hoje sou baiana e sou tão sambista que meu projeto final da faculdade de engenharia é sobre carnaval.