VI – Xô Baixo Astral – Vamos Falar de Coisas Boas
Uma das críticas recorrentes aos atuais gestores é a falta de um patrocínio master na camisa. A crítica pode ser válida, mas o fato é que essa verba não é mais tão relevante quanto o foi em outros anos.
Em 2009, ano da assinatura com a Olympikus e da troca do patrocínio da Petrobras, as receitas de marketing representaram 13% da receita total (menos que a bilheteria) e R$ 15 milhões em números absolutos. O melhor ano havia sido 2006, quando entraram no caixa R$ 21 milhões, que corresponderam a 34% do faturamento, sendo o item mais importante naquele ano.
Pois bem: em 2011 o Flamengo ganhou R$ 44 milhões com receitas de marketing, com destaque para o aumento expressivo dos licenciamentos e royalties, que somaram R$ 9 milhões.
Segundo, a questão da dívida. Em 2006 o Flamengo devia quase CINCO vezes o seu faturamento anual. Se fosse uma empresa comercial sua quebra teria sido decretada.
O Flamengo terminou o ano devendo pouco menos de DUAS vezes sua receita. Continua sendo muito, continua sendo um indício de péssima saúde financeira, continua sendo uma vergonha, mas é MUITO MENOS do que já foi. Mais alguns anos nesse ritmo podem transformar o clube em uma instituição que opere dentro na normalidade. Eu nunca acreditei que esse dia pudesse chegar. Ele continua longe, é verdade, mas já há luz no fim do túnel.
Terceiro, os direitos federativos dos jogadores. A tradição rubro-negra dos últimos 20 anos sempre foi equilibrar as contas se desfazendo de jovens jogadores da base. Em 2008 essa foi a principal fonte de receita, o clube amealhou R$ 28 milhões na venda de seus atletas.
O curioso é que o clube, depois de muitos anos de “seca”, parece viver um momento de renascimento de sua base, que se sagrou campeã do principal torneio da categoria e forneceu vários atletas para o elenco principal (para meu gosto pessoal, a maioria ainda bem limitada). Isso me faz pensar que o clube, deveria, sim, se desfazer de alguns atletas, porque isso é inerente ao mercado.
Quarto, o contrato de televisionamento. Aliás, é esse contrato que, sozinho, explica quase todas essas boas notícias. O mérito maior da direção do clube foi ter sido firme na decisão de negociá-lo em separado e diretamente com a TV Globo.
O contrato trouxe algumas boas novas. De cara, assegurou uma receita fixa e alta até 2015. A julgar pelas informações do “contas a receber”, o clube terá cerca de R$ 90 milhões por ano. Se as demais receitas do futebol se mantiverem no mesmo patamar (marketing, bilheteria, etc.), o clube terá R$ 160 milhões nos seus cofres.
Não resta dúvida de que com um mínimo de esforço, dá para montar um belo elenco, contratar bons atletas, montar uma boa comissão técnica. O clube não está nadando em dinheiro, mas tem, finalmente, certo conforto que lhe permite algum planejamento de médio e longo prazo. E a tendência é de melhora, pois há potencial de crescimento das receitas de marketing e bilheteria.
E mais: o contrato impôs alguma disciplina financeira, pois dizem que as suas cláusulas vedam o mecanismo das antecipações. Foi isso, provavelmente, que determinou o “congelamento” da dívida.
Como nem tudo são flores, o clube afirma que em 2012 irá receber cerca de R$ 70 milhões da TV. Ué… se foi alguma espécie de adiantamento recebido em 2011, essa verba não aparece com clareza.
VII – Conclusão e Impressões Finais
Nada que envolva o Flamengo e mais ainda as contas do Flamengo merece o título de “conclusão”, porque nada no clube é muito conclusivo, definitivo, certeiro.
A principal delas – e a mais decepcionante – é que a direção do clube não está nem aí para a transparência ou sequer julga importante prestar esclarecimentos detalhados aos torcedores ou aos sócios. O balanço, além de ser cheio de armadilhas e coisas obscuras, fica escondido no site oficial: a ele só se chega depois de pesquisar com afinco. Nem quando tem números bons para mostrar a direção se esforça para destacar os seus pontos positivos.
Além disso, é possível afirmar que a má gestão continua sendo a tônica. O Flamengo se comporta como novo rico, a receita aumentou, mas os gastos explodiram – as despesas do futebol cresceram excessivos 57% de um ano para o outro, mais até do que a receita, que aumentara 47%.
Uma das críticas recorrentes à administração atual é a elevação das despesas do clube social e dos esportes amadores. Concordo que algum aumento deveria mesmo haver – o clube andava às traças, era preciso agir.
Mas nada justifica que o está acontecendo, principalmente porque a maior parte desse acréscimo vem das despesas de pessoal e não de investimentos, como seria o esperado.
Basta ver que as despesas de pessoal cresceram mais de 200% quando comparadas a 2007. Aliás, em 2007 elas representavam 55% da arrecadação do clube com suas mensalidades e patrocínios específicos. Em 2011 chegaram a 122% dessa arrecadação, deixando claro que a verba do futebol subsidia outras atividades – em valor bem mais baixo do que se acredita, mas algum subsídio há. E até é caso de comemorar, porque em 2010 foi ainda pior.
A mensagem final, contudo, é de esperança. Seja por mérito dos atuais gestores (algo cuja menção é temerária, porque a regra no ambiente rubro-negro nesses tempos de Patricia Amorim é a crítica sem tréguas), seja por fatores conjunturais, o Flamengo, em 2011, parece ter aplainado o terreno para dias melhores.
Cabe aos sócios escolhermos bem quem vai pilotar o zeppelin de chumbo pelos próximos 3 anos. De preferência, que arranquemos desses futuros gestores um compromisso sério de romper com as más práticas de governança e de fazer bom uso do razoável orçamento que lhes espera.
Minha crítica a essa 2ª parte fica por conta dos direitos de TV. Se foi esse o acordo que salvou o Fla, do jeito que foi feito (cada um por si e deus contra todos) só beneficiou Flamengo e Corinthians.
Como eu já havia criticado na “Made in USA” sobre Revenue Sharing (nos arquivos recentes deste blog), são justamente nesses contratos globais que há a maior chance de se fazer “justiça social” entre os diversos times de uma competição grande como o campeonato brasileiro.
E quanto o subsídio aos “esportes sociais”, eles tem que haver mesmo. Corretíssima a gestão atual do Flamengo. Apenas não se pode deixar matar a galinha dos ovos de ouro, ou seja, o futebol, e é esse o pecado da gestão Patrícia Amorim.
Como o Rafael, eu também sou contra a negociação individual dos contratos de TV. Sou Flamengo, e o Flamengo lucrou muito com isso de maneira imediata, mas sou contra. Acho ruim para o futebol.
Mas enfim: realmente, eu esperava um balanço com números bem piores. Não há nenhuma preocupação com a transparência, há várias coisas dificílimas de entender no balanço, mas fato é que nunca foi muito melhor que isso nestes pontos, nem nas diretorias anteriores. E os números são menos ruins do que eu esperaria.
A questão é que a melhora que houve se deve basicamente ao contrato de TV, responsável quase sozinho por todo o aumento de receita do clube (embora valha citar a diminuição dos gastos com social/esportes amadores). Bilheteria e patrocínios caíram e, pelo que estamos vendo até agora, não vão aumentar este ano. Apenas a receita de produtos licenciados aumentou, mas numa proporção que não compensou as outras quedas. A entrada de grana da Olympikus no fluxo de caixa também diminuiu, provavelmente porque já tinham adiantado antes. E a TV também deve diminuir sua entrada este ano, pois houve adiantamento em 2011 (já foi confirmado isso pelo Levy em entrevista – foi negociado em contrato).
Assim, a minha expectativa não é de que o balanço de 2012 seja melhor que o de 2011, pelo contrário. Houve a melhora ano passado graças à Globo, mas deveria ter sido melhor. Sem aumento de receitas, precisariam cortar mais gastos, mas não parece ser o que está acontecendo (só o novo contrato do Ronaldinho já gerou uma despesa extra de pelo menos R$9,6 milhões no ano com ele). Há condições de tirar o clube desta situação, mas a maneira de gerir o clube ainda precisa mudar para que isso aconteça.