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Nesta sexta, a coluna “Sabinadas”, do jornalista esportivo Fred Sabino, explicita alguns dos problemas de segurança do Rali Dakar, que se realiza esta semana.

Dacar precisa trabalhar fora da pista

O Rali Dacar deste ano, disputado no Peru, Argentina e Chile, está chegando ao fim – mais uma vez com mortes. Agora foi um motociclista, o francês Thomas Bourgin, não durante um trecho cronometrado, mas em um acidente de trânsito com um veículo da polícia chilena.

Parece que já nos acostumamos com as fatalidades do Dacar, e infelizmente isso é a mais pura verdade. Para conseguir dissecar esse triste tema e entendê-lo sob uma ótica fria, vale a pena esmiuçar os números de óbitos e as características deles. Portanto, vamos lá.

São 61 mortos até hoje em 34 edições, já contando a deste ano. E o que mais chama a atenção é o número dos que perderam a vida e não competiam: 34, sete a menos do que pilotos. Foram desde habitantes do deserto e espectadores atropelados a moradores envolvidos em colisões fora da área cronometrada. Até mesmo componentes de helicópteros da organização já pereceram durante a competição, que teve sua primeira edição em 1979.

Isso mostra que, a despeito de os carros serem mais seguros, de as velocidades das motos terem sido substancialmente reduzidas e de o monitoramento dos veículos via GPS ter aparecido nos últimos anos, o índice de fatalidades segue muito alto devido à ineficácia em se monitorar todo o percurso da prova – não só nos trechos em que os pilotos aceleram o máximo.

Como o trajeto é muito grande e passa por vários países, não é fácil evitar essas colisões e atropelamentos fora do percurso. Mas é aí que entra o grande alvo de críticas da organização do Dacar desde os tempos de África – hoje, a prova acontece na América do Sul por causa da violência no continente africano.

A organização do Dacar é acusada de não se importar com os habitantes das áreas pelas quais a prova passa.

Primeiro, por uma suposta falta de um programa social mais organizado, que provenha o povo com donativos. E, segundo, e fundamental, pela ausência de uma política de educação sobre os perigos que a prova representa.

Explico: como não há locais específicos para o público assistir às etapas, os torcedores locais acabam se amontoando em volta do traçado para conferir de perto os carros passando. E nos trechos não cronometrados, os carros da prova se misturam com veículos, digamos, civis, do dia a dia.

A Fórmula 1 enfrentava problema parecido até a década de 70. No GP do México, por exemplo, havia gente amontoada na beira da pista, como um guard-rail humano. Já em 1977, no GP do Japão, torcedores morreram por estarem num local inapropriado. E tal problema se resolveu não somente com melhores proteções nos autódromos mas com uma educação e restrições à presença de torcedores em locais perigosos.

Isto posto, me parece imperativo que a organização do rali se mexa de verdade para reduzir de uma vez por todas esse índice de mortes, principalmente fora da pista. Uma campanha educativa nos meses que precedem a prova seria importante. Panfletos e inserções em programas de TV seriam um bom começo.

O que não pode, definitivamente, que a idiota premissa de que o perigo da morte é um charme para o Rali Dacar continue sendo uma verdade. Existem, é claro, os perigos inerentes a uma competição desse tipo, e, desde que o francês Thierry Sabine inventou a prova – curiosamente morto nela, os pilotos sabem disso perfeitamente.

Mas as perdas de vidas nunca podem ser algo previsível, como vem sendo.

Dentro e fora da pista.

P.S.: ontem, dia 17 de janeiro, é aniversário do atleta mais influente da história; Muhammad Ali faz 71 anos em meio à luta contra o Mal de Parkinson mas seus combates dentro dos ringues (contra outros monstros como Joe Frazier e George Foreman) e, principalmente fora deles, pelos direitos dos negros, merecem sempre ser exaltados. Parabéns, Ali!