O Carnaval de 2010 seria mais um com a divisão das escolas de samba dos dois grupos em duas Ligas diferentes: a Liga Independente das Escolas de Samba, que organiza os desfiles, e a Superliga, uma dissidência da Liga. Pela primeira vez, o sambista paulistano conheceria as obras que passariam pelo Anhembi por um DVD. Tanto Liga quanto Superliga apostaram na produção de DVDs com clipes feitos em estúdio com intérpretes, diretores de bateria, ritmistas, passistas, casais, baianas, etc. O da Superliga, por outro lado, tinha apenas uma passada do samba.

O número de escolas da Liga e da Superliga permaneceu o mesmo no Grupo Especial: a Liga “perdeu” a Nenê, rebaixada em 2009, mas “ganhou” a Águia de Ouro, que subiu. O mesmo aconteceu com a Superliga, com o rebaixamento da Peruche e o acesso da Imperador do Ipiranga. Por falar em acessos e descensos, as duas entidades resolveram fazer um pequeno ajuste na questão da ordem dos desfiles: as duas agremiações vindas do segundo grupo continuariam abrindo as duas noites de desfile, mas a campeã (no caso de 2010, a Águia de Ouro) não seria mais a primeira da sexta e sim do sábado, deixando nas mãos da vice (no caso, a Imperador) a responsabilidade de abrir a festa na sexta-feira.

Na questão do sistema de concessão de notas e da apuração, mais uma mudança. Os quesitos passariam a ser julgados por cinco jurados e não mais por quatro, mas o número de notas válidas cairia com a volta dos descartes. Tanto a maior, quanto a menor nota não seriam validadas. A grande polêmica do ano, no entanto, ficou por conta da Rosas de Ouro. A escola escolheu como enredo a história do chocolate e, para isso, contou com a ajuda financeira da Cacau Show, nomeando assim o enredo como “O cacau é show”, frase que foi usada pelos compositores no refrão principal do samba vencedor. Mas, alegando uma pressão da TV Globo, detentora dos direitos de transmissão, a escola alterou o título do seu enredo e também o verso do samba, que virou “o cacau chegou”.

Quem também surpreendeu foi a Leandro de Itaquera. Não bastasse a polêmica junção dos três sambas finalistas da disputa da escola, que tinha como enredo as suas cores, o vermelho e o branco, contratou a cantora Sandra de Sá para cantar o samba ao lado do intérprete Betto Muniz.

Depois de disputarem ponto a ponto o título nos dois anos anteriores, Mocidade Alegre e Vai-Vai eram, naturalmente, as grandes favoritas e adotaram como temas a história do espelho e os 80 anos de Copa do Mundo, respectivamente. A Vai-Vai aproveitou o gancho do seu ano de fundação “bater” com a primeira Copa e resolveu fazer uma auto-homenagem. Quem também buscou um tema que tem a ver com futebol e com a própria escola foi a Gaviões da Fiel, que prometia um grande desfile sobre o centenário do Corinthians. Já a Império de Casa Verde, queria voltar a brigar pelo título com um enredo em homenagem a cidade de Itu. Águia de Ouro, Tucuruvi e Tom Maior também apostaram em cidades: a escola da Pompéia em Ribeirão Preto, a da Cantareira em São Luís do Maranhão e a Vermelho-e-Amarelo em Brasília.

Já a X-9, resolveu prestar uma homenagem aos imigrantes portugueses, enquanto a Mancha Verde contaria a história da educação. A Pérola Negra resolveu viajar pelo Brasil através da figura de Rolando Boldrin. A Unidos de Vila Maria buscou no ferro a inspiração para seu enredo, ao passo que a Imperador do Ipiranga optou por abrir a folia contando a história da medicina.

A Imperador do Ipiranga abriu a festa com o enredo “Da Antiguidade a Tecnologia: Medicina, a Nobre Arte de Salvar Vidas”. Voltando ao grupo de elite após três anos, a agremiação da Vila Carioca pegou um Anhembi que, definitivamente, não estava cheio, mas mostrou muita garra e muita força e fez um desfile muito digno. As alegorias deixaram clara a fragilidade econômica da escola, mas o trabalho do Carnavalesco Anselmo Brito foi muito competente e mascarou um pouco este problema.

Além do mais, Anselmo caprichou nas fantasias e a divisão cromática muito colorida deu ótimo efeito a fantasias simples, mas muito bem executadas. Além do mais, a escola desfilou com muita alegria e a comunidade simples da Vila Carioca deu um show ao cantar forte o bom samba da Imperador. A Comissão de Frente se destacou ao retratar “A vida e a morte”, mas o abre-alas veio muito pobre. A opção por fazer um carro gigantesco em altura e comprimento não condizia com o potencial financeiro reduzido da escola. O carro não tinha um acabamento dos melhores e ficou difícil até de ver onde estava o Egito, nome do carro, naquela alegoria.

Mas as fantasias eram de muito bom gosto, mesclando tonalidades claras com outras mais escuras, e o segundo carro, dedicado à Grécia, embora sem luxo e com uma concepção escura demais para o meu gosto, estava bonito. O enredo foi desenvolvido com correção, deixando clara a ideia de não ligar para uma cronologia bem estabelecida. O terceiro setor foi dedicado à grandes nomes da medicina e ganhou mais um carro que apresentou falhas de acabamento. O quarto, sobre a medicina alternativa, já veio mais colorido e mais bem adereçado, antes de um ótimo encerramento com o belo quinto carro sobre a medicina do futuro, lembrando clonagens e células tronco. A Imperador também surpreendeu ao trazer um mini-helicóptero simbolizando um resgate e, em suma passou bem. Era sim possível ter boas esperanças de permanecer no grupo.

Se a Imperador do Ipiranga fez um desfile melhor que o esperado, o mesmo não pode ser dito da Leandro de Itaquera, que decepcionou e muito na apresentação do enredo “Sob Um Manto de Amor e Paz, Sou Leandro de Itaquera desfilando o Vermelho e Branco no meu Carnaval”. A ideia de retratar as cores da escola em um desfile era boa, mas foi mal executada. O enredo não rendeu, a plástica foi um desastre e o samba, que já causava alguma desconfiança, teve péssimo desempenho. O intérprete Betto Muniz não viveu seu dia mais inspirado e o que já era ruim, virou piada com os gritos de “Iiiiiiitaqueeeeeeeera é alto astraaaaal” de Sandra de Sá, que foram muito além do recomendável.

A comissão de frente foi bastante interessante, lembrou o vermelho como cor da nobreza e, muito bem caracterizada, fez uma boa coreografia. Já o abre-alas, não passou bem. Chamado “Celebrações em Vermelho e Branco”, ele foi concebido para impressionar o público. O carnavalesco Anderson Paulino, que trabalhou em dupla com Agnaldo Parintins, mais uma vez se mostrou um grande fã de cenas de sexo e colocou vários casais representando atos sexuais dentro da alegoria. A justificativa? Todos nós viemos de um espermatozóide. E o espermatozóide é branco.

Fato é que o carro, predominantemente branco, tinha falhas claríssimas de acabamento e, para piorar, uma das mãos de uma das esculturas quebrou ainda no começo da Avenida. O segundo setor foi, ao meu ver,o mais competente do desfile. O vermelho e o branco através das religiões ganhou boas fantasias, muito pertinentes ao enredo e, de quebra, fugindo da predominância mais que natural das duas cores-tema. O carro também estava bonito, com os orixás misturados a representações católicas. No terceiro setor, o desfile voltou a se perder um pouco. Misturou Chapeuzinho Vermelho com o Taj Mahal e a China, quebrando qualquer lógica sequencial. O carro, apesar de não ser dos mais luxuosos, estava bonito, mas empacou ainda no começo do Anhembi, por conta de um eixo quebrado, gerando complicações à evolução.

O quarto setor destacou riquezas naturais vindas do vermelho e o branco, como o látex da borracha que vem das seringueiras. Os carnavalescos optaram por sintetizar o setor com o Teatro Amazonas e pensaram um bonito carro. Só que ele passou pela Avenida visivelmente longe de estar pronto e o resultado não foi bom. A escola veio muito pobre até nas fantasias e se complicou de vez quando o último carro, que exaltava as paixões em vermelho e branco – como a paixão pela escola – demorou a passar pelo portão de entrada e chegou a se chocar contra a torre de cronometragem. Um imenso buraco se formou, o Presidente da escola, Seu Leandro, passou mal e, por todos os problemas, o rebaixamento da simpática agremiação da Zona Leste era quase certo.

Terceira escola da noite, a Acadêmicos do Tucuruvi surpreendeu e muito na apresentação do enredo “São Luís do Maranhão – Um Universo de Encantos e Magias”. A escola da Cantareira contava pela primeira vez com o talento do carnavalesco Wagner Santos e apresentou um desfile que, se não era um desfile campeão, era digno de brigar pelas primeiras posições. O enredo que contou com o apoio de muitas empresas maranhenses foi desenvolvido com correção. O samba, que já era muito bom, cresceu muito na Avenida. A bateria de Mestre Adamastor sustentou o samba em uma ótima cadência e a bossa com reggae era um verdadeiro espetáculo.

O desfile começou resgatando as raízes européias e africanas da capital maranhense. Uma luxuosa comissão de frente falava da exploração francesa, enquanto o gigantesco abre-alas mostrava as influências africanas. Palmeiras decoravam um cenário com igrejas e florestas em um trabalho primoroso de acabamento. As fantasias estiveram entre as melhores do ano. Coloridas, tinham um padrão de luxo muito superior ao que a escola costumava apresentar. O capricho de Wagner no desenvolvimento de cada ala fez crescer o conjunto visual da escola.

Por outro lado, os demais carros alegóricos não conseguiram repetir o padrão de grandiosidade do abre-alas. Para piorar, os dois carros seguintes, além de relativamente pequenos, guardavam muitas semelhanças com o abre-alas. O segundo, além das palmeiras, tinha tonalidades muito parecidas, enquanto o terceiro, que falou sobre a arquitetura, tinha casas que pareciam cópias das que apareceram no primeiro carro.

O desfile voltou a crescer no quarto setor, que falou sobre lendas e assombrações contadas no Maranhão e recebeu um carro bonito e muito criativo. Para encerrar, os poetas da arte e da música da “Atenas Brasileira” foram homenageados. O último carro, embora tenha apresentado mais uma vez as palmeiras do abre-alas e do terceiro carro, foi dedicado ao reggae e tinha muitos destaques com aquelas toucas típicas dos apreciadores do ritmo. Estava muito bonito, apesar de simples. À parte alguns problemas de evolução, a Tucuruvi desfilou muito bem e devia brigar por uma vaga no desfile das campeãs.

manchaverde2010Na sequência, veio a Mancha Verde, que também apresentou um gigantesco salto de qualidade em relação aos anos anteriores. O desfile “Aos Mestres Com Carinho! Mancha Verde Ensina Como Criar Identidade” rendeu à escola o primeiro desfile que poderia de fato a credenciar a brigar pelas primeiras posições. Para começar, a verde-e-branco tinha um ótimo samba e um carro de som de respeito, com a dupla Vaguinho e Celsinho em ótima fase. Além do mais, a Bateria Puro Balanço de Mestre Moleza e Mestre Caju teve um desempenho fantástico e a torcida da escola deu seu show.

Os dois primeiros setores eram de cunho absolutamente histórico com a educação grega e oriental. A Grécia foi destacada por dar valor à educação e à filosofia e seus grandes nomes vieram em um grandioso, luxuoso e muito bem iluminado abre-alas. Cebola, o carnavalesco, mais uma vez errou a mão n excesso de esculturas, que deixaram o carro impactante, mas não tão bonito. Ainda assim, foi um bom começo. Já os asiáticos, foram lembrados por sua rigidez e por também entenderem a educação como pilar fundamental para uma nova sociedade. O carro não tinha muito luxo e era um pouco óbvio, mas estava bem acabado e passou bem.

As fantasias, que estavam em um padrão de qualidade bastante satisfatório, cresceram a partir do terceiro setor, que falou sobre os ensinamentos dos portugueses aos brasileiros e vice-versa. A divisão cromática incomodou um pouco pelo excesso de verde, mas colaborou para um bom efeito do conjunto de fantasias. O carro também veio muito bonito e bem adereçado. No quarto setor, uma homenagem aos mestres da educação se misturou ao futuro do ensino, com a troca de conhecimentos através da internet. As fantasias perderam um pouco da beleza por conta das representações complicadas, mas ainda assim estavam de bom nível.

O quarto carro também foi um acerto, já que Cebola conseguiu carnavalizar um carro de concepção complicada com muita competência. O setor mais emocionante foi o setor final, que exaltou grandes mestres da arte e do samba. Na última alegoria, o Manchão, símbolo da escola, veio à frente de grandes personagens do samba paulistano, alguns até que já haviam falecido. A Mancha não parecia em condições de disputar o título, mas, no conjunto, fez o melhor desfile da noite até ali.

Depois do resultado ruim em 2009, a Vila Maria foi a quinta escola da noite para apresentar o enredo “A Indústria que Manipula o Ferro, é a Mãe de Todas as Outras!”. O carnavalesco Fábio Borges fez o possível para carnavalizar um enredo bastante complicado e fez um bom trabalho. A escola veio razoavelmente bonita e chamou a atenção em alguns momentos pelo luxo. Por outro lado, o samba, que já não era dos melhores, foi levado em um andamento muito lento e se arrastou desde o início do desfile, prejudicando a escola.

A comissão de frente foi o ponto alto da apresentação da escola. São Jorge e sua batalha contra o mal foram lembrados por conta da espada de ferro e de Ogum, que é o orixá do ferro. O abre-alas retratou a descoberta do ferro e trouxe dragões grandiosos e bem acabados. Era um carro muito bonito, mas de difícil compreensão. O segundo setor foi dedicado aos gregos e aos primeiros trabalhos envolvendo o ferro. Fantasias com cores que remetiam ao fogo chamaram a atenção e o segundo carro, com guerreiros e vulcões também passou bem.

O terceiro setor falou sobre guerras, já que toda guerra antiga que se prezasse tinha uma espada de ferro. A Vila Maria viajou por algumas delas e trouxe, nesse setor, o mais belo carro do desfile, com muitos destaques representando quem lutou nessas guerras e um acabamento primoroso. Nos dois setores finais, no entanto, a plástica caiu bastante de qualidade. Os carros alegóricos que trouxeram a presença do ferro no dia-a-dia e as indústrias que manipulam o ferro apresentaram algumas falhas de acabamento e destoaram dos três primeiros em grandeza, embora o quarto ainda tenha se destacado pelas réplicas da Torre Eiffel e da Estátua da Liberdade. A Vila Maria, repito, veio bonita, mas passou muito fria e dificilmente voltaria no desfile das campeãs. Foi uma apresentação para ficar ali no meio da tabela.

rosasdeouro2010bNa sequência, o Carnaval de 2010 enfim ganhou sua primeira grande favorita. A Rosas de Ouro, que transformou “O cacau é show” em “Cacau: um grão precioso que virou chocolate, e sem dúvida se transformou no melhor presente!”. A primeira impressão deixada pela escola foi das melhores. A Roseira veio ainda mais luxuosa que em 2009 e entrou pisando forte. O samba, apesar de não ser nem dos melhores, nem dos mais animados, conquistou o Anhembi, muito por conta da apresentação simplesmente irretocável da Bateria de Mestre Tornado. A cadência foi sustentada com perfeição do início ao fim e ele ainda imprimiu ótimas bossas e paradinhas durante o desfile. Um verdadeiro show!

O enredo começou contando a história do cacau, com a descoberta dos espenhóis que estavam explorando o México. A Rosas mais uma vez se destacou pela comissão de frente, que representou “O Encontro de dois povos”. Com uma ótima coreografia e uma fantasia impecável, a Rosas começou bem. Mas espetacular mesmo foi o abrte-alas. Poucas vezes se viu em São Paulo um carro tão perfeito. Em rosa, azul e marrom, ele destacava os olmecas, uma das primeiras civilizações a consumir o cacau. O carro tinha uma infinidade de esculturas e tinha um acabamento perfeito. O capricho, o cuidado com cada centímetro da alegoria deixaram o Anhembi de queixo caído. De quebra, o carro ainda espalhou o aroma do chocolate pela Avenida.

O segundo setor continuou falando dos espanhóis, que tinham, de fato, uma relação muito especial com o chocolate. A bebida oriunda do cacau era consumida pela nobreza e “La Xocolateria”, a festa anual onde os espanhóis se esbaldavam com o cacau, foi o destaque do segundo carro. E esse carro destoou e muito do resto do desfile. Pobre e pequeno, não estava no nível do resto do desfile. Logo atrás dele, veio um setor cujas fantasias, que estavam deslumbrantes até então, não me agradou. Ao viajar pelos países europeus que mais tem relações fortes com o chocolate, o carnavalesco Jorge Freitas desenvolveu fantasias com pouca criatividade, muitas delas iguais – trocando apenas a bandeira do país. Por outro lado, o terceiro carro retomou o caminho do luxo e do capricho. Casinhas típicas europeias cercavam desfilantes com trajes típicos europeus em um trabalho impecável.
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O quarto setor abandonou a história e abordou o chocolate no dia a dia. Ele é o companheiro de todos, que ajuda a matar a fome, dá energia, prazer e é, como dizia o enredo, o melhor presente. A escola mostrou com competência que uma barra de chocolate é uma maneira simples e significativa de se presentear quem se ama. A quarta alegoria não foi a mais criativa, mas também estava bonita. Já o último setor, lembrou tradições como correr atrás de ovinhos coloridos, receber ovos de chocolate e esperar o coelinho da páscoa. O último carro, aliás, trouxe um gigantesco coelinho da páscoa e encerrou de maneira fantástica um grande desfile. Embora com alguns erros, a Roseira era uma grande favorita ao título.

vaivai2010bPara encerrar a primeira noite, já no amanhecer, a Vai-Vai pisou forte como de costume para apresentar o enredo “80 anos de arte e euforia. ‘É bom no samba, é bom no couro’ Salve o Duplo Jubileu de Carvalho”. O Anhembi não estava lotado para a primeira noite de desfiles, mas quem foi, ficou até o fim para receber a Vai-Vai. A escola fez um desfile de um chão pesadíssimo e apresentou um conjunto visual de respeito para falar de samba e futebol.

O desfile começava exaltando a África. O Continente, que nos 80 anos anteriores foi palco do apartheid e da segregação racial, seria a casa da Copa do Mundo que começaria em menos de cinco meses. Foi a deixa para uma comissão de frente muito bonita e para um primeiro setor todo em uma tonalidade mais escura, relembrando tribos africanas em ótimas fantasias. O carro abre-alas conseguiu se aproximar muito do apresentado pela Rosas de Ouro, com muitas representações africanas e destaques retratando grandes ícones da cultura negra. A alegoria, no entanto, empacou no início da Avenida e teve problemas até entrar nos eixos e seguir até o fim, o que prejudicou a evolução da Escola do Povo.
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No segundo setor, a escola entrou na história das Copas. As fantasias eram muito claras e foram muito bem executadas. O segundo carro, “Quando a Guerra parou a Copa”, lembrou o hiato de 12 anos entre a terceira e a quarta Copa por conta da II Guerra Mundial. O carro procurou sintetizar o conflito e fez isso com muita competência. O carro estava muito bonito, com aviões como destaques e um cenário de destruição.

O terceiro setor começou lembrando o Maracanazo de 1950, o Milagre de Berna de 1954, o polêmico título inglês em 1966 e as conquistas brasileiras em 1958, 1962 e 1970. As fantasias procuraram valorizar as cores dos países campeões e Chico Spinosa conseguiu evitar uma sensação de repetição em fantasias sobre um mesmo país. O terceiro carro foi outro destaque do desfile, ao lembrar a conquista argentina na Copa de 1978. A presença dos militares que estavam no poder aqui no país vizinho foi lembrada e um peru que vinha posicionado à frente do carro era montado por argentinos que dançavam o tango. Uma referência à suspeita goleada sobre o Peru que levou a Argentina para a final e eliminou o Brasil.

O quarto setor falou sobre as Copas mais recentes e também sobre uma mudança no futebol. Era a era do futebol globalizado, com os países mais frágeis economicamente perdendo seus craques para o exterior. Globalização que levou a Copa para a Ásia em 2002. Uma Copa que nos deu o penta e foi lembrada no quarto carro com um enorme cartaz de Ronaldo Fenômeno e a presença de Cafu em pessoa. O quinto setor ganhou belas fantasias para falar do futebol moderno, de estádios impactantes e dos 80 anos da Vai-Vai, que foram celebrados no belo último carro. A despeito do problema com o abre-alas, a Vai-Vai encerrou seu desfile como uma das favoritas e, para o meu gosto, com um desfile superior ao da Rosas.

Abrindo a segunda noite de desfiles, a Águia de Ouro apresentou o enredo “Ribeirão Preto – Região à Frente do Seu Tempo: Da Abolição ao Agronegócio, Terra de Liberdade e Riqueza!”. Voltando ao Grupo Especial, a escola da Pompéia fez um bom desfile, mas tropeçou em alguns pontos que poderiam ser cruciais. Por outro lado, o bom samba animou o Anhembi no início da noite. Serginho do Porto brilhou e a Batucada da Pompéia de Mestre Juca mais uma vez imprimiu um ritmo excelente ao samba.

O desfile começou agradecendo aos orixás pela riqueza da fauna e flora de Ribeirão Preto. Araras na comissão de frente foram o início do passeio pela diversidade natural do município. Outros animais também estiveram presentes, inclusive evoluindo pelo meio da bateria. A Águia de Ouro pareceu bem estruturada e botou na Avenida um Carnaval de nível Grupo Especial. O abre-alas, mais modesto que o das principais escolas, chamou a atenção por conta de uma bela águia dourada.

A Águia fez um Carnaval para garantir a permanência na elite. O segundo setor falou sobre o progresso em Ribeirão Preto que, como em quase qualquer cidade do interior paulista, passou pelas estradas de ferro. E foi justamente aí que o enredo se perdeu. Aproveitando-se da infância vivida por Santos Dumont na cidade, a escola dedicou o fim do segundo setor e boa parte do terceiro ao aviador. Aí desfilaram o 14 Bis e a Paris do início do Século XX, destoando completamente do proposto. Por outro lado, o segundo e o terceiro carros estavam bem bonitos.

No quarto setor, um problema. O carro da cultura de Ribeirão Preto bateu no quinto, que falava sobre o agronegócio, e teve um eixo quebrado ainda na concentração. Chegou a cogitar-se que os carros entrassem na ordem inversa, mas, a despeito dos problemas de evolução, tudo se resolveu a tempo. O carro estava bonito e sintetizou um setor que passou pela música e pelo Teatro de Ribeirão. Teve também cultura popular com a lembrança do Come-Fogo, o clássico entre Comercial e Botafogo. O último setor apresentou a cidade como “Capital do Agronegócio” e, modesto, estava apenas bonito, sem muito luxo. As fantasias também seguiram um bom padrão de qualidade e, em condições normais, a Águia não deveria encontrar dificuldades para se manter na elite. Os problemas com o quarto carro, no entanto, poderiam causar transtornos desagradáveis.

De Ribeirão Preto para a Capital Federal com a Tom Maior e o enredo “Brasília, Do sonho à Realidade… Uma homenagem de São Paulo aos 50 anos da Capital Coração do Brasil”. Em meio ao escândalo do Mensalão do DEM que derrubou o então Governador José Roberto Arruda, a Tom Maior, que tentou sem sucesso uma ajuda do Governo brasiliense, foi cobrada por não citar em nenhum momento a corrupção. O Presidente Markinho dizia que em uma homenagem, não cabia esse tipo de coisa.

De um jeito ou de outro, a Tom Maior fez mais um desfile animado. O samba era de boa qualidade e foi bem cantado por René Sobral, mas o destaque foi mesmo a exibição impecável da Bateria Tom 30 de Mestre Carlão. Com ótimas bossas e uma cadência excepcional, os ritmistas viveram noite inspirada e foram destaque de um desfile que decepcionou no visual. Nesse quesito, o destaque ficou por conta da ótima comissão de frente, que lembrou que Brasília foi construída por gente de todo o Brasil. A coreografia, em dado momento, culminava em uma foto do Presidente Juscelino Kubitschek, que inaugurou a cidade lá em 1960.

O carro abre-alas, prometia o carnavalesco Roberto Szaniecki, ia se transformar ao longo da Avenida, mas ninguém viu nada disso. Com problemas de acabamento (marca nos trabalhos do carnavalesco), a alegoria estava relativamente pobre e passou sem chamar a atenção. Szaniecki bolou boas fantasias, mas a vermelho-e-amarelo visivelmente tinha problemas financeiros. O conjunto visual foi superior apenas ao da Leandro de Itaquera (embora também não ficasse devendo ao da Imperador do Ipiranga). Destaque positivo para a divisão cromática de muito bom gosto e muito diversificada.

O segundo carro parecia muito bem pensado, mas também me deu a sensação de ter ido para a Avenida longe do que era pra ser. A representação do Palácio do Planalto foi bem feita, mas o carro passou pobre. O terceiro setor mergulhou no artesanato brasiliense e falou muito sobre o barro. As fantasias melhoraram e o carro que, curiosamente, era dos que menos deveriam impressionar, foi o mais bonito do desfile. Nada extraordinário, porém de muito bom gosto. Essa alegoria, porém, causou um buraco na evolução por ter empacado no início da Avenida. O quarto setor mostrou as grandes figuras que surgiram em Brasília, lembrando muito os astros do rock e jogadores como Kaká e Lúcio. A quarta alegoria foi mais uma de concepção melhor que o acabamento, mas passou bem. O carro mais impactante foi o último, todo em prata, que sintetizou a diversidade religiosa na Capital Federal – setor este que ganhou as mais belas fantasias do desfile. Não foi um desfile desastroso, mas, em um ano de alto nível, o risco de rebaixamento existia.

mocidadealegre2010A Mocidade Alegre entrou na Avenida para defender o seu título com um enredo que era emocionante desde o título: “Da criação do Universo ao sonho eterno do Criador…eu sou o espelho e me espelho em quem me criou”. Essa última frase era genial. É que o espelho era a própria Mocidade Alegre “e quem a criou” foi Juarez da Cruz, que havia falecido após a apuração de 2009. Uma grande sacada. O desfile começou bem, com uma ótima comissão de frente usando do neon e de um efeito pirotécnico para lembrar o surgimento do Universo e do homem. O carro abre-alas, em roxo e branco, tinha a mesma ideia e estava muito bem acabado e luxuoso. Ainda assim, perdeu feio no comparativo com Rosas e Vai-Vai.

O segundo setor continuou levando a coisa para o lado místico e o enredo ficou um pouco confuso. Ao falar dos quatro elementos, a escola trouxe um segundo carro falando sobre a astrologia que reflete o futuro. Era uma concepção um pouco complicada, mas o carro estava muito bonito. O terceiro setor ganhou as mais luxuosas fantasias do desfile. A divisão cromática passou a valorizar mais o dourado e as alas vieram com uma riqueza de detalhes impressionante. O setor lembrou crenças como a de que quebrar espelho dá azar e tinha uma alegoria maravilhosa lembrando Oxum e seu espelho. Um carro rico, luxuoso e de muito bom gosto.
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O desfile da Morada do Samba mostrou a competência habitual da escola, mas não parecia uma apresentação campeã. O samba não empolgou, a bateria teve uma exibição bastante convencional e o conjunto visual, embora muito bonito, parecia um pouco inferior ao de Rosas de Ouro e Vai-Vai. Isso ficou muito claro no quarto setor, que trouxe o espelho na literatura infantil e em outras formas de arte e tinha um carro alegórico de ótimo acabamento, mas de gosto duvidoso.

O grande momento do desfile foi, sem dúvida, o último setor, que justificava a frase final do título. O último carro, que também tinha muito roxo, trazia a Velha Guarda da escola à frente de um boneco de Juarez da Cruz, que vinha na parte traseira do carro. Era o espelho da fonte da eterna Mocidade! A fonte vinha à frente, com destaques e personagens da escola e refletia a imagem do espelho que era Juarez. Uma linda homenagem que encerrou de maneira brilhante um ótimo desfile. Pode não ter sido um desfile campeão, mas foi uma grande apresentação.

A quarta escola da noite foi a X-9 Paulistana, que conseguiu uma apresentação muito agradável no enredo “Do Além Mar, a Herança Lusitana nos Une. Ora pois… A X-9 é Portuguesa com Certeza!”. Contando novamente com Augusto de Oliveira, campeão com a X em 1997 e que trabalhou em um conjunto com o estreante Rodrigo Cadete, a escola da Parada Inglesa apresentou uma grande evolução nos quesitos visuais e fez seu melhor desfile em muitos anos.

Para começar, o samba era bastante animado e ganhou o Anhembi, especialmente por conta de seus dois refrãos. O principal dizia “ora pois, quem vem aí / é a X-9 com certeza / valente, guerreira, Luso Brasileira / Canta a Herança Portuguesa” e, o do meio, “vem pra cá, cantar, sambar / vem no balancê da nossa musicalidade / no futebol, a mesma paixão / Num só coração”. Vestido de Carmem Miranda, o intérprete Daniel Collête deu mais um show na condução da obra e, embora tenha se mostrado mais contido em relação a cacos e a gritos de empolgação, animou os componentes.

O desfile começou lembrando as Grandes Navegações. Usando muito verde e azul, os carnavalescos, após uma comissão de frente muito competente, impressionaram com um abre-alas luxuoso e grandioso, com boa iluminação e de simples entendimento. O segundo setor da escola tratou da literatura portuguesa e da herança deixada por poetas como Camões para todo o Mundo. A X-9 apostou em boas fantasias e em uma divisão cromática bastante diversificada. Já o segundo carro, se destacou por ser todo marrom e lembrar uma caravela. É que muitos dos poemas de Camões falavam sobre as navegações. As laterais do carro foram decoradas com representações de folhas antigas onde eram inseridos poemas de Camões com a fonte típica daquelas canetas de pena. Uma ótima sacada.

O terceiro setor falou sobre a vinda da Família Real ao Brasil. É que não foi só D. João e sua trupe que vieram pra cá. Muitos portugueses anônimos também vieram e suas heranças se espalharam pelo Brasil. Nesse setor, o destaque ficou por conta da ala que trouxe componentes com roupas típicas de danças portuguesas fazendo uma ótima coreografia. O terceiro carro, embora mais modesto, também passou muito bem. Os laços de união entre brasileiros e portugueses foram retratados no quarto setor, quando a escola mostrou paixões em comum dos dois países, como o futebol e também outras manifestações artísticas. O gancho final para o desfile foi a coincidência entre a Revolução dos Cravos e a fundação da X-9 Paulistana, ambos ocorridos em 1975. Os carnavalescos optaram por viajar pelo movimento político português através de lindas fantasias e por exaltar a escola em uma alegoria que não foi feliz. Ainda assim, foi um ótimo desfile e que dava à X-9 esperanças de voltar ao desfile das campeãs.

gavioes2010Na sequência, pisou na Avenida a Gaviões da Fiel com o enredo “Corinthians… minha vida, minha história, meu amor!”. O carnavalesco Zilkson Reis mais uma vez se destacou pelo capricho e pela grandiosidade dos carros alegóricos e o bom samba rendeu bem. Tudo bem que um enredo sobre o Corinthians tem mesmo que privilegiar as cores do clube, mas me incomodou bastante o excesso de preto e branco nos dois primeiros setores. Praticamente todas as alas vieram com essas tonalidades, algumas de maneira desnecessária.

Em todo caso, foi um grande desfile que começou muito bem. Um lindíssimo abre-alas retratou o cenário onde o clube foi fundado. Ali no Bom Retiro, à luz do lampião. Bonecos dos seis fundadores se misturavam a casinhas pobres do bairro do Bom Retiro em um carro que tinha como destaques os principais jogadores do elenco de 2010 do clube: Felipe, Dentinho, Edu Gaspar e até o técnico Mano Menezes cantaram e sambaram animadamente.

O segundo setor começou a viajar pelos primeiros títulos do clube. O carnavalesco Zilkson Reis procurou levar para a Avenida histórias menos conhecidas do grande público e bolou fantasias de fácil leitura. O destaque ficou por conta da fantasia da Bateria, que veio lembrando o título Paulista de 1922, o do Centenário da Independência. A Gaviões trouxe um segundo carro bastante luxuoso, apesar da concepção um pouco infeliz. Notas musicais e livros vinham à frente lembrando as poesias e músicas que falaram sobre o Timão e, na parte traseira do carro, velas e São Jorge falavam sobre a devoção dos alvinegros.

O terceiro setor continuou viajando pela história do clube e resolveu ser o setor da homenagem ao torcedor corinthiano. É que uma das maiores provas da fidelidade do Fiel torcedor foi o jejum de quase 23 anos sem um título. Por isso, entre a Invasão Corinthiana, o gol libertador de Basílio na final do Paulistão de 1977 e outros pontos importantes, apareceu o torcedor vestido de gavião em uma ala. Logo atrás, o carro que exaltava o orgulho de ser corinthiano. O quarto setor também foi de homenagens, agora a um dos mais belos momentos da história do clube: a Democracia Corinthiana. Uma linda alegoria com frases de efeito que davam o tom do clamor popular por democracia relembraram essa linda página na história do Corinthians.

O último setor voltou a falar do orgulho de ser corinthiano. As fantasias voltaram a pecar pelo excesso de preto e branco e o último carro, embora luxuoso e bem acabado, não estava muito bonito e se destacou apenas pela presença do então grande ídolo corinthiano, Ronaldo Fenômeno. Ainda assim, foi um desfile, embora um pouco inferior ao das duas últimas escolas de sexta, que fazia, depois de muito tempo, a Gaviões poder voltar a sonhar com o título.

A sexta escola a entrar na Avenida foi a Império de Casa Verde com o enredo “Itu, Fidelíssima Terra de Gigantes”. Contando com o carnavalesco Marco Aurélio Ruffim, o Tigre Guerreiro fez uma boa apresentação, embora bastante inferior à de anos anteriores. Pessoalmente, me desagradou bastante a opção por iniciar a viagem pelos 400 anos de Itu com a Era Glacial. De fato, nevou em Itu durante a Era Glacial, mas onde foi que não nevou? Em todo caso, a escola trouxe uma bem ensaiada comissão de frente falando sobre a separação dos continentes milhões de anos atrás e um abre-alas impactante, com um enorme tigre glacial, digamos assim. O meio do carro, porém, foi pouco criativo, apenas com muitas representações de moléculas. O destaque ficou por conta da neve artificial que se espalhou pela pista.

O segundo setor deu um salto de alguns milhões de anos e falou sobre os primeiros habitantes, os índios, e a diversidade natural da cidade. Um belíssimo carro com índios portadores de flechas em meio a uma floresta se destacou após fantasias de bom nível, mas que pareciam repetições das que haviam passado na Ribeirão Preto da Águia de Ouro. O terceiro setor exaltou o pioneirismo político de Itu e justificou o “fidelíssima” do título. É que a cidade se destacou como uma das maiores apoiadoras dos movimentos de Independência e República no Século XIX. As fantasias vieram luxuosas, buscando retratar o cenário da época, mas a divisão cromática do setor foi muito escura, destoando das demais. O carro alegórico também tinha concepção boa, mas não foi tão bem executado.

O quarto setor misturou as artes e a religião. Grandes óperas e teatros foram relembrados em meio a procissões e à igreja barroca que levou 10 anos para ser construída e que está na principal praça de Itu. Foi um carro bonito, mas bastante modesto para os padrões da escola. O último setor ficou um pouco confuso ao retratar paixões populares como o Ituano Futebol Clube em meio ao pioneirismo do município na indústria e no conceito de “cidade verde”. O último carro estava luxuoso, mas a mistura entre verde e indústria prejudicou um pouco o efeito visual da alegoria. Foi um bom desfile, mas que deveria brigar no máximo por desfile das campeãs. Destaque para a atuação do intérprete Carlos Júnior, que voltou com tudo à escola e cantou muito bem o samba.

Para encerrar, a Pérola Negra surpreendeu e encantou o Anhembi com o enredo “Vamos Tirar o Brasil da Gaveta”. A escola, que não era das mais aguardadas por conta de um incêndio que destruiu seu barracão, trouxe um lindo desfile para a Avenida. Apesar de desfilar sob a luz do luar durante quase todo o tempo, os versos “o céu clareou, a Vila chegou / Pérola Negra me abraçou / ah, sou brasileiro com orgulho e muito amor / abro a gaveta pra mostrar o meu valor” animaram um Anhembi ainda lotado.

A homenagem a Rolando Boldrin era um convite para o Brasil exaltar o Brasil. O carnavalesco André Machado fez um de seus mais brilhantes trabalhos e apostou em fantasias muito coloridas para exaltar não só a fauna e a flora brasileiras, como também seus personagens anônimos que moldam a cultura nacional. Durante todo o desfile, passaram pela Avenida fantasias coloridas, de fácil leitura e muito pertinentes ao enredo. O nível de acabamento surpreendeu para uma escola relativamente pequena que havia sofrido tanto.

O enredo era um pouco confuso, pois misturava uma homenagem direta a algo mais amplo, mas rendeu lindas alegorias. A exceção do abre-alas, que lembrava o início do Brasil antes da chegada dos portugueses – e estava exuberante, apesar do pouco luxo – e do segundo, que lembravam a vinda de Boldrin para a cidade, todos os carros valorizam o verde e o amarelo. Sem poder gastar rios de dinheiro, a Pérola apostou em uma estética simples, mas muito bem feita. Não era um desfile campeão, mas era um lindo desfile. O segundo setor homenageou o Nordeste de Rolando Boldrin. O já citado segundo carro lembrava o barco onde o Sr. Brasil veio para São Paulo e estava lindo, com muito azul e branco.

O terceiro setor já entrou na vida de Rolando em São Paulo. As duplas sertanejas que o inspiraram passaram pela Avenida em alas que exaltaram a música brasileira de raiz. Um carro muito colorido trouxe amigos do artista como a atriz Laura Cardoso e surpreendeu pelo ótimo acabamento e pela riqueza de detalhes. O quarto setor falou sobre o orgulho de ser brasileiro e ganhou o carro mais luxuoso e grandioso, com ótimas esculturas – embora as alegorias mais simples tenham me agradado mais. Por fim, a escola exaltou o Sr. Brasil trazendo o homenageado como destaque do último carro. Animado, ele se misturou a painéis com fotos de sua carreira em um mar verde e amarelo, encerrando de maneira brilhante o Carnaval de 2010. A Pérola podia sim sonhar com o desfile das campeãs. O título, deveria ser disputado ponto a ponto entre Rosas e Vai-Vai, com Mocidade e Gaviões correndo por fora.

A apuração começou mais uma vez sem penalizações, já que nenhuma escola infringiu o regulamento. No primeiro quesito, mestre-sala e porta-bandeira, nada menos que 11 das 14 escolas conseguiram os 30 pontos considerando os descartes. Apenas Tom Maior (29,5), Imperador do Ipiranga (29,5) e Leandro de Itaquera (29,25) foram penalizadas. Por outro lado, a Mocidade Alegre assumiu a liderança isolada por ter sido a única a receber cinco notas 10. Rosas, Mancha, Gaviões, Vila Maria, Império, Tucuruvi, X-9 e Pérola vinham atrás com um 9,75 descartado.

No segundo quesito, Alegoria, a situação já mudou um pouco. Das 11 escolas que haviam tirado nota máxima no primeiro quesito, apenas Turucuvi, Rosas, Vai-Vai, Mocidade, Gaviões, X-9 e Pérola Negra chegaram aos 60 pontos, com a Mocidade sendo mais uma vez a única a gabaritar o quesito, seguida pelos critérios de desempate por Rosas, Gaviões, Tucuruvi, X-9, Vai-Vai e Pérola. A Mancha Verde perdeu um ponto no quesito e praticamente abandonou a briga, assim como a Império e a Águia, que desperdiçou 0,75. A Vila Maria perdeu apenas 0,25. O terceiro quesito, Samba-Enredo, teve mais uma chuva de 10. Apenas quatro escolas perderam ponto: Imperador (0,75) e o trio Leandro, Águia e X-9, que perdeu 0,25 cada. Assim, sobraram seis escolas com 90 pontos.

No quarto quesito, Fantasia, a Vai-Vai tirou dois 9,75 e perdeu seu primeiro 0,25. Pelo desempate, Mocidade, Rosas, Tucuruvi, Gaviões e Pérola ocupavam as cinco primeiras posições com 120 pontos. Em Enredo, mais uma mudança importante. Agora foi a vez da Gaviões derrapar. A Fiel Torcida tirou apenas um 10 e perdeu, no total, 0,75, deixando Mocidade, Rosas, Tucuruvi e Pérola com 160. A Vai-Vai e a Vila Maria apareciam logo atrás com 159,75. No quesito Bateria, o mesmo aconteceu com a Pérola, que deixou as três concorrentes sozinhas na liderança, seguidas ainda por Vai-Vai e Vila Maria.

O quesito Harmonia mostrou todas as cinco primeiras colocadas somando cinco notas 10 e a mudança veio mesmo em evolução. A Tucuruvi, que tinha somado todos os 210 pontos possíveis até ali tirou dois 9,75, um 9,5 e dois 9, perdendo, no total 1,75 e caindo do terceiro para o nono lugar. Mocidade e Rosas descartaram um 9,75 cada uma, deixando a Morada na frente com os mesmos 240 pontos. A Vai-Vai perdeu 0,25, mas subiu para terceiro com 239,5 contra 239,25 da Vila Maria.

O quesito Comissão de Frente definiria o título entre Mocidade e Rosas. As duas tiraram 10 no primeiro jurado, mas a Rosas se complicou com um 9,75 no segundo. No terceiro, foi a vez da Morada receber um 9,75. No penúltimo, 10 para as duas. Ambas precisavam de um 10 para garantir os 270 pontos, mas uma nota igual entre as duas seria favorável à Morada. A Rosas tirou seu 10 e ficou esperando. Viu a Vai-Vai tirar 9,75, a Águia de Ouro e a Tom Maior 9… Até que veio a nota da Mocidade: 9,75. Pelo terceiro ano seguido, a taça mudou de mãos na última nota e a Rosas de Ouro, única a somar 270 pontos, comemorou seu sétimo título 16 anos depois de sua última conquista. A Mocidade bateu na trave e somou 269,75 contra 269,25 da Vai-Vai. A Mancha Verde ainda abocanhou um quarto lugar com 269 contra 268,75 da Gaviões.

A Vila Maria, que perdeu meio ponto no último quesito, acabou em sexto, fora do desfile das campeãs, seguida por Império de Casa Verde, Tucuruvi, Pérola Negra e X-9. Com 265 pontos, a Águia de Ouro terminou em 11º e escapou com folga do rebaixamento, com 5,5 pontos a mais que a Tom Maior, que também se salvou. Caíram a Imperador do Ipiranga e a Leandro de Itaquera. No Acesso, a Nenê sobrou, mas teve dificuldades para ser campeã e até para voltar ao Especial: somou 268,25 contra 268 da Peruche, que também voltou ao grupo de elite e superou no desempate a Dragões da Real, que bateu na trave pelo segundo ano seguido.

Curiosidades

– Ano de muitas mudanças na transmissão da Globo: o locutor esportivo Cleber Machado trocou a Sapucaí pelo Anhembi e comandou a transmissão ao lado de Mariana Godoy, afastada das transmissões desde 2000. Os narradores foram posicionados logo no início da pista, em um estúdio no chão (abandonando assim a bolha aérea lá no meio da pista), ao lado de outra novidade: a Esquina do Samba, comandada por Chico Pinheiro ao lado do time de comentaristas: Leci Brandão, Guto Graça Mello, Fernanda Chama, Geraldo Carneiro e, em participações mais que especiais, Paulo Vanzolini e Elifas Andreatto. Outros estiveram presentes ao longo das transmissões.

– O Grupo de Acesso voltou a ser transmitido, agora pela Band, que também exibiu o Desfile das Campeãs na sexta-feira seguinte ao Carnaval.

– Além de Sandra de Sá, participaram dos DVDs oficiais (ambos na Superliga) o cantor Belo, na Império de Casa Verde, e Rolando Boldrin, na Pérola Negra.

– A Uirapuru da Mooca chamou a atenção, no Grupo de Acesso, por um enredo sobre a americanização do Brasil. O samba, pra lá de irreverente, era bilíngue com seu “it’s very good” e “se está tudo blue”. A escola terminou em sétimo lugar e se salvou do descenso.

– Pelo menos até este momento, foi a última vez em que a Imperador do Ipiranga desfilou no Grupo Especial.

– O samba da Leandro de Itaquera, junção de três sambas diferentes, tem nada menos que 18 compositores, recorde absoluto na história do Carnaval de São Paulo. A obra é assinada por Jorginho, Carioca da Leandro, Sanches TK, Maracá, Ney Pinheiro, Luisão, Medonha Z/L, Xixa, Terra, André, Jairo, Limozini, Didi Poeta, Nel Costa, Juba, Xandinho, Diego Miguel, Zé Carlos e Marquinho JB.

– Despedida do intérprete Quinho do Carnaval de São Paulo. A partir de 2011, ele estaria só no Salgueiro ou, agora em 2015, na Estácio de Sá.

– Foi também o último desfile do intérprete Daniel Collête na X-9 Paulistana. De 2011 em diante, ele estaria sempre na Dragões da Real.

– Ronaldo Fenômeno quase complicou os primeiros minutos de desfile da Gaviões. É que depois de levado ao alto do carro, a minutos do cronômetro disparar, ele pediu para ir ao banheiro, causando um alvoroço danado dos fãs – tudo que a escola não queria.

– Último Carnaval de Seu Nenê. Além de ver a escola que fundou subir ao Especial, ele ainda desfilou ao lado de Thobias da Vai-Vai na Mancha Verde, que prestou uma homenagem aos mestres do samba. Seu Nenê viria a falecer ainda em 2010.

– O futebol esteve presente, com maior ou menor importância, nos desfiles de seis escolas: Leandro de Itaquera, Vai-Vai, Gaviões, Império, X-9 e Águia de Ouro.

– A Tucuruvi perdeu pontos apenas no quesito evolução. Foi o suficiente para que perdesse o título e caísse para o oitavo lugar.

– Depois de alguns anos de calmaria, a apuração voltou a ser tumultuada. Integrantes da Gaviões, que já não estavam muito satisfeitos, perderam de vez a paciência com as notas no quesito Enredo. Entre diretores e torcedores, voaram em direção à mesa de apuração copos, chinelos e cadeiras. Ao fim da leitura das notas, os componentes invadiram a Marginal Tietê e assustaram quem por ali passava de carro.

– Confusão também aconteceu na festa da Rosas de Ouro. A quadra, que só foi aberta após a apuração por causa de um tumulto durante a leitura das notas em 2009, viveu um momento de tensão quando a PM, para tentar conter uma briga do lado de fora, espalhou gás lacrimogêneo para tudo quanto é lado. Foi o último título da Rosas até o momento.

– Por falar em Rosas de Ouro, a escola esteve envolvida em polêmica antes do carnaval. A Rede Globo exigiu que o verso “o Cacau é show” fosse trocado para “o cacau chegou”, alegando merchandising da empresa Cacau Show – que patrocinava o enredo. No Desfile das Campeãs o samba foi cantado na sua forma original – até porque “o cacau chegou” não faz o menor sentido. Mais detalhes aqui.

Vídeos

O bom desfile da Imperador
https://www.youtube.com/watch?v=ZuP9OXnDa4k

A grande performance da Tucuruvi
https://www.youtube.com/watch?v=OtlbidFq-vU

Mancha Verde ensina como criar identidade
https://www.youtube.com/watch?v=A3-hgbK1mHg

A campeã Rosas de Ouro
https://www.youtube.com/watch?v=G4Aod-Ey4Rw

O grande desfile da Vai-Vai
https://www.youtube.com/watch?v=tbMunB1Mt-0

O espelho da Mocidade
https://www.youtube.com/watch?v=VjBKaZn-trw

X-9 e Portugal
https://www.youtube.com/watch?v=kDuVwcezVxY

Gaviões exaltando o Corinthians
https://www.youtube.com/watch?v=zgwnrIZpWuE

A surpreendente Pérola Negra
https://www.youtube.com/watch?v=63Wg35Qvs3g

12 Replies to “Bodas de Prata – 2010: com nova virada na última nota, Rosas quebra jejum de 16 anos ao sabor do chocolate”

  1. 2010 foi o primeiro carnaval onde pude acompanhar desde as disputas até a apuração, e vamos ver se consigo fisgar algo da memória (me perdoem pelo tamanho):

    – O CD da Liga, comercializado em uma até então parceria inédita com o Diário de São Paulo, também dava ao comprador uma revista com dados da escola, descrição de cada enredo, samba, etc. Já o da SuperLiga não teve o mesmo destino: foi comercializado nas lojas mesmo (Em uma nota sobre isso, lembro de como escutava os 2 cds até ter todos os sambas na ponta da língua e isso causou ambos ficarem riscados de tanto uso).

    – Falando no CD da SuperLiga, também é de destacar o samba exaltação composto para a agremiação em uma das faixas além dos das escolas também.

    – A Rosas fez um desfile muito bonito, que ficou ainda melhor com o céu clareando e ganhando uma tonalidade rosada

    – Vila Maria veio bastante fria, eu lutava contra a vontade de dormir a cada instante

    – Quem também não fez um bom desfile foi a Império, que na minha opinião não conseguiu deveu bastante em relação ao ano anterior, além da flagrante mudança de melodia do samba (que foi uma junção) entre a primeira parte e o refrão do meio. O Carlão parecia que berrava o “Fidelíssima cresceu”.

    – Esse desfile da Gaviões deve ter sido o mais com cara da escola desde 2004.

    – Esperava mais da Vai-Vai. O 3º lugar foi de bom tamanho a escola.

    – Já lá no Grupo 1 da UESP, a minha escola do coração (a Tatuapé) se consagrou campeã após o rebaixamento em 2009, contando com a voz do grande Royce do Cavaco (ao menos no CD).

    – Foi algo lamentável a reação dos torcedores/dirigentes da Gaviões às notas de Enredo. Isso iria chegar a um patamar mais baixo ainda em 2012.

    1. Não sei se chegou a ser comercializado junto com o jornal ou se havia só a publicidade, mas no CD de 2006 já havia a parceria Liga/SP e Diário de São Paulo.

      1. Acho que foi comercializado junto com o jornal tb… Uma Tia minha foi a SP em janeiro e me trouxe o CD de 2006, único CD original que tenho de SP, pq aki em MG nunca acho…

  2. Leonardo, me tira uma dúvida: a Pérola Negra sofreu com incêndio ou enchente??

    Me lembro que passou uma reportagem das escolas de sábado no Fantástico. Daí falou da Império, com a Valesca Popozuda… e depois falou de “aguaceiro” na Pérola.

    Ou me enganei??

    1. Enchente foi em 2011, mas não lembro se em 2010 foi enchente ou incêndio, mas acho que foi enchente tb…

  3. A partir de agora tentarei ser mais sucinto rs:
    Não concordo que ao final dos desfiles Rosas e Vai-Vai eram apontadas como favoritas, me lembro que nas comunidades de Orkut a dúvida era quem poderia tirar o título da Mocidade, que fez uma grande apresentação e só perdeu o título injustamente no néon da CF que se apagou (aconteceram coisas piores na Rosas que não foram punidos)… A Rosas teve outros problemas além do samba, alguns integrantes da CF chegaram atrasados ao desfile, mas não sei o quanto isso prejudicou a Escola em termos de apresentação aos jurados… E o carro do coelhinho passou com problemas de acabamento…
    A Vai-Vai veio mto bem, mas se prejudicou pelos problemas de evolução no início…
    Gostei da Gaviões, merecia o 4º lugar!
    E quanto ao rebaixamento, achei a Tom Maior pior que a Imperador… A Tom iniciava ali suas duas escapadas injustas, já que em 2011 tb merecia cair… O samba da Leandro era terrível, junção mto mal feita, e Sandra de Sá ainda “ajudou”…

    1. Ah, e como me manifestei errado na semana passada, pois era pra ser dito sobre 2010, agora vai:
      Apenas duas escolas gabaritaram o quesito Alegorias, justamente as duas escolas que não tinham barracão, que faziam suas alegorias debaixo de viadutos: Mocidade Alegre e Pérola Negra!
      Pérola, aliás, deu show! Pra quem fala que ela não tem chão, deveria dar uma olhada nesse desfile, que de fato, encerrou o Carnaval com chave de ouro!

  4. Sobre a Tucuruvi e seus problemas de evolução, a situação foi bem mais tensa do que vc diz… rs
    O Amaral, diretor de Harmonia da Escola chegou bêbado à concentração, e aí vc já imagina, né? Foi conduzindo a Escola lentamente, segurou mto a cabeça da Escola e tiraram ele, ao perceberem isso… O Seu Jammil começou a tocar a Harmonia da Escola e a cobrar o pessoal pra sair rápido…
    Tenso, né??? As notas não foram por acaso e tirou o título, que pra mim seria injusto, da Tucuruvi…
    Sobre esse desfile gostei mto, apesar do excesso de palmeiras nas alegorias…

    1. O Amaral, inclusive, morreria em outubro daquele ano, e até seria citado pelo Freddy Viana na gravação do samba de 2011, logo no início da faixa!

  5. Neste ano eu fui como apoio de uma destaque da Leandro de Itaquera, mas minutos antes do desfile perguntaram se eu queria ir no carro do Teatro Amazonas. Aceitei e fui “fantasiado” de ribeirinho: apenas de chapéu e calça marrom claro, sem camisa e descalço.

    Eu era um que ficava abrindo e fechando as portas laterais do Teatro. Pois bem, no fim do desfile fui pegar minha sacolinha com a camiseta que amarramos embaixo do carro e para minha surpresa, tinha sumido!!!

    Sorte que o tenis escondi no carro mesmo e o celular e a carteira na cueca…rsrs. Cheguei em casa as 5:00 da manhã vestido de ribeirinho e minha mãe quase infartou!!!

    Mas foi uma experiência maravilhosa!!!!

  6. “O enredo não rendeu, a plástica foi um desastre e o samba, que já causava alguma desconfiança, teve péssimo desempenho. O intérprete Betto Muniz não viveu seu dia mais inspirado e o que já era ruim, virou piada com os gritos de “Iiiiiiitaqueeeeeeeera é alto astraaaaal” de Sandra de Sá, que foram muito além do recomendável”.

    Eu tô rindo demais com essa passagem. Tanto por lembrar do desastre que foi aquele desfile como da forma que o Leonardo relatou. Sensacional!! Hahahahahahahaha…

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