Após duas noites de desfiles no Anhembi, o carnaval paulistano de 2015 me lembrou um tanto o que ocorreu no Especial carioca de 2008, no qual a escola dominante precisou apenas apresentar-se de forma consistente para levar o caneco. A diferença é que, 2015 em São Paulo, teve o Vai-Vai com desfile muito forte, com o aclamado samba rendendo muito e provocando a maior reação da arquibancada. Entretanto, a irregularidade em fantasias e, principalmente, em alegorias provavelmente custou o 12º título da Escola do Povo.

A Mocidade veio com sua tradicional força, um samba que subiu um tanto nos meus conceitos com o decorrer do tempo e proporcionou uma passagem bem agradável da Morada do Samba pelo Anhembi. A comissão de frente mostrava o “nascimento da estrela” de Marília Pêra, e trazia um baú de tripé que lembrava o da União da Ilha de 2014. O enredo, que preferiu seguir pela carreira artística da atriz, foi correto, assim como a harmonia e a evolução da escola. A bateria, pessoalmente, ficou um pouco mais acelerada do que meu gosto desejava, mas nada que comprometa, até porque, desenhos e bossas foram executadas muito bem – apesar de que nenhuma paradinha mais ousada e longa foi tentada, como em anos passados.

A Mocidade deve sofrer um pouco em alegorias, já que teve elementos quebrados durante o desfile, mas num geral, os carros estavam muito bem feitos, principalmente o último, no qual estava a homenageada. Não foi um desfile que envolveu o público, como 2014, ou um rolo compressor, como 2012, mas a Mocidade deve singrar com facilidade rumo ao tetra.

vaivai2015O Vai-Vai, penúltima escola de sábado, também optou por contar a história da Elis Regina passando pela obra (musical, no caso). Apesar de ter sido bem correto, ainda mais na terra arrasada que esse quesito teve em São Paulo, senti a falta de uma linearidade no enredo, algo que a Mocidade teve.

O samba rendeu maravilhosamente, mesmo com uma leve queda no meio do desfile, algo rapidamente corrigido. Gilsinho, que foi magistral no CD, não foi tanto assim na avenida. Apesar de ser muito seguro, acho que ainda falta uma performance símbolo para a carreira dele.

O abre-alas tinha três partes, era lindíssimo, e… quase complicou toda a evolução da escola, pelo gigantismo. O carro seria ainda mais questionado com a queda imensa de qualidade das alegorias do Vai-Vai ao decorrer do desfile. Já as fantasias foram bem irregulares durante toda a passagem da escola.

Com as falhas nos quesitos plásticos, o Vai-Vai, que deveria proporcionar uma batalha épica com a Mocidade, deve ficar num bolo muito interessante de escolas que, na minha visão, brigam pelo vice-campeonato e quatro vagas no desfile das campeãs. Isso tudo após uma longa sequência de desfiles daqueles típicos de terceiro ou quarto lugar.

A Tucuruvi veio muito leve e solta na sexta-feira, com o agradabilíssimo samba rendendo muitos frutos. Só acho que a escola se ressentiu da precoce posição de desfile (segunda na ordem) e pegou um público que só foi mergulhar de cabeça no ótimo samba na parte final.

Ainda na sexta, a Dragões me conquistou positivamente, com o melhor conjunto alegórico do ano e um samba muito bem cantado pelo ótimo Daniel Collête, mesmo não ser uma grandiosa obra. Por outro lado, a harmonia podia ter sido melhor, apesar de não ser propriamente ruim. Mas a grande falha, na minha avaliação, foi o enredo, que foi desenvolvido como tema. O fio condutor não se apresentou e as alas pareciam jogadas de qualquer forma.

Na minha avaliação, isso jogaria a escola para uma quarta, quinta posição, só que como enredo é avaliado de forma bem permissiva em São Paulo, não dá para descartar a Dragões como potencial fator na briga pelo título.

O Gaviões da Fiel, imediatamente antes da Mocidade, foi uma grata surpresa. O samba, apenas mediano, rendeu maravilhosamente, contando com um chão fortíssimo. A bateria sustentou muito bem o samba e a escola entrou com pinta até de campeã, fazendo a torcida da Fiel nas arquibancadas agitar suas bandeiras insanamente.

A comissão de frente mostrando um rei, a dama e o valete do baralho (o enredo) e outros atores que faziam um castelo de cartas gigantes, em determinado momento da apresentação, foi a que mais me agradou no ano. O conjunto alegórico começou muito bem, mas caiu no fim, assim como o desfile em si. Com fantasias ótimas e um enredo que, se não era perfeito, era melhor que vários, a Gaviões fica no pelotão de elite na minha visão – e espero que fique para os jurados também.

Fechando o grupo de desfiles que me pareceram típicos de briga pela sexta das campeãs: a Nenê. Outro samba que rendeu lindamente, proporcionando um desfile clássico de escola de samba. O enredo sobre Moçambique foi muito bem amarrado, a bateria sustentou muito bem o samba, sem se preocupar com invenções, e o conjunto alegórico foi estonteante, ainda mais se levarmos em conta a parte financeira da escola.

Por outro lado, as fantasias apesar de bem concebidas, estavam pobres, na maioria – apesar de que mestre-sala e porta-bandeira estavam muito bem vestidos. A harmonia foi boa, mas não a melhor do ano e abaixo do que a escola já apresentou outras vezes.

Essas, portanto, seriam as cinco escolas que brigariam por quatro vagas nas campeãs, com leve vantagem do Vai-Vai para o vice, se eu fosse jurado. Mas como não sou, acho que a Dragões deve levar o 2º lugar, e a Rosas que teve um desfile irregular deve entrar nesse bolo pelo histórico do júri, mesmo tendo feito um desfile que, em minha visão, seria de zona da marola. A escola teve um visual inesperadamente irregular, e um enredo que não existiu, apesar de um chão forte, algo também inusitado, pelo histórico recente.

Para o rebaixamento, parecia tudo definido para que Vila Maria e Tom Maior fossem para a vala, mas a Tatuapé, que veio muito segura e provando que se estabelecia no grupo, estourou o relógio em um minuto. A evolução foi um tanto lenta, e a escola preferiu por não correr no fim, o que não deu certo. Com isso, a Tatuapé perde 1,1 ponto e fica em risco. Pessoalmente, não rebaixaria a escola, mas é esperar para ver.

Transmissão

A exibição dos desfiles pela Globo, na televisão, teve melhoras em relação a 2014. Chico Pinheiro e Monalisa Perrone, apesar de parecerem mais empolgados que o costume, funcionaram melhor, ficaram mais quietos e deixaram os sambas serem mais ouvidos.

A entrada de Alemão do Cavaco – um dos compositores do samba da Mangueira – na equipe de comentários foi um ganho. Apesar de, provavelmente, não poder fugir de elogios constantes, o compositor apresentou elementos das baterias e sambas mais profundos ao público, mostrou conhecimento profundo histórico e foi sempre pertinente. Um alento à mesmice de Paula Lima e Celso Viáfora.

Também ouvi o desfile pela rádio Bandnews, na transmissão do sistema Bandeirantes. Com uma transmissão mais informativa sobre problemas das escolas e opiniões mais conclusivas, foi um complemento agradável, incluindo discussões densas, como uma sobre a qualidade atual dos sambas-enredo e das disputas, no desfile da Mocidade. Por outro lado, discordei diametralmente de diversas avaliações sobre as escolas, mas aí é outra história…

Julgamento

Por fim, espero que haja um julgamento de fato em samba-enredo e enredo. Mais uma vez desfiles com enredos fraquíssimos passaram, e de escolas recorrentes. Sambas medíocres também existiram em profusão, pelo terceiro ano seguido. Tudo isso aumenta o número de desfiles modorrentos, apesar de terem sido menos frequentes do que 2013 e 2014. Não será a solução final do problema, logicamente, mas é melhor que a inércia.