[N.do E.] Filipe Ribeiro tem 24 anos, é bancário e mora no Recife.
Primeiro de tudo permitam-me uma apresentação. Meu nome é Filipe, tenho 24 anos, moro no Recife e sou apaixonado por esporte e por carnaval, embora nunca tenha me envolvido muito com nenhum dos dois. Esporte nunca pratiquei, mas programo minhas férias do trabalho de acordo com o calendário das grandes competições só pra poder passar o dia assistindo TV; do Carnaval só participei quando criança – porque é impossível viver no Recife por 24 anos sem ter estado no meio do Carnaval daqui pelo menos uma vez na vida – e hoje prefiro ficar em casa assistindo aos desfiles das escolas de samba.
Por gostar tanto desses dois assuntos, acabo por buscar semelhanças entre eles e pensar em como um poderia contribuir para o outro. Uma dessas contribuições do esporte no Carnaval, na minha opinião, está na forma de julgar, avaliar os desfiles. Logo de cara eu já sei que não há tanta vontade política assim pra mudar o que já vem sendo feito há décadas e isso me desanima um pouco, mas não me impede de sonhar com um julgamento mais justo, pelo menos na minha visão de espectador.
O julgamento do Carnaval, do jeito como é feito atualmente tanto no Rio quanto em São Paulo, traz problemas graves. No Rio, a escala de notas (de 9 a 10) é extremamente curta e acaba nivelando desfiles diferentes, porque é preciso uma falha muito grande pra causar alguma despontuação, já que qualquer décimo representa 10% da nota. Como consequência, pequenas falhas são ignoradas, porque um jurado não deveria tirar 10% da nota se a falha foi vista em, digamos, 1% do desfile. Só que eles tiram. E isso nos leva ao segundo problema: a excessiva subjetividade dos julgamentos, que leva a notas absurdas, notoriamente enviesadas pela opinião pessoal do julgador, algo que o Manual recebido por eles tenta impedir, mas de maneira muito suave e pouco assertiva, resumindo em meia página, quando muito, os critérios que devem ser avaliados.
Em São Paulo o problema da subjetividade das notas parece ainda mais evidente. Embora o manual (que não foi divulgado ao público) pareça indicar com detalhes os pontos que devem levados em consideração na hora de dar a nota, não parece dizer em que medida cada coisa prejudica o desfile, o que faz com que um jurado de Fantasia aponte seis problemas pequenos e dê 9,9 e outro de Evolução aponte um único problema pequeno e dê 9,7 (exemplos de 2015). Junte-se, portanto, uma escala de notas curta demais e um manual que não cumpre sua função de instruir o julgador e o resultado é o que temos visto com cada vez mais frequência: gente insatisfeita, cabeças pedidas, campeãs contestadas.
No mundo do esporte, várias modalidades possuem sistemas de julgamentos, e não consigo pensar em nenhuma que gere polêmicas sequer parecidas com as do carnaval. Na ginástica artística, por exemplo, existem Códigos de Pontos que detalham em níveis absurdos para leigos todos os movimentos possíveis nas apresentações, determinando exatamente quanto vale cada coisa e quais os descontos que podem ser dados para cada falha, o que gera notas fracionadas até a casa dos milésimos. Nos saltos ornamentais, os sete juízes dão notas de 0 a 10, as duas mais altas e as duas mais baixas são descartadas e as três do meio são multiplicadas pelo grau de dificuldade do salto, determinado pela Federação Internacional. Na patinação artística no gelo, cada elemento da série e cada tipo de falha possuem uma pontuação específica (positiva para os elementos e negativa para as falhas) e o total de pontos do atleta é o somatório de todos os itens apresentados na série.
Eu já imaginei como cada um desses sistemas poderia ser aplicado ao carnaval, mas acho que as características próprias dos desfiles de escola de samba (inovação, criatividade, falta de parâmetros sobre o que seria “perfeito” etc.) tornam difícil a aplicação de qualquer um desses sistemas. Entretanto, há um que eu acho que cairia como uma luva: o do salto de esqui. Esse esporte combina uma pontuação técnica (determinada pela distância do salto, pela velocidade do vento e pelo ponto de partida) com um julgamento feito por cinco árbitros. Esse julgamento, com notas que chegam a no máximo 20 pontos, é feito separando cada fase do salto: voo, aterrissagem e desaceleração. Cada parte tem um máximo de desconto possível e daí sai a nota do saltador.
Adaptando ao Carnaval, isso seria o equivalente a dividir cada quesito em partes específicas (e não coisas genéricas como “concepção” e “realização”), determinando quanto cada item vale no julgamento. Por exemplo, no quesito Alegoria: “concepção e acabamento das esculturas” (as esculturas das alegorias foram bem construídas e finalizadas e fazem sentido dentro da proposta da alegoria?), “iluminação” (os efeitos de luz da alegoria funcionaram como previsto?), “volumetria” (o projeto da alegoria gerou espaços vazados ou distribuição irregular dos elementos que a compõem?), “acabamento geral” (os queijos, as saias, os geradores estão bem acabados?), “efeito” (os elementos da alegoria geraram o efeito desejado pelo carnavalesco?), “clareza visual” (a impressão geral do carro está de acordo com o que o carnavalesco quis apresentar, levando em conta o texto explicativo entregue pela escola aos jurados?), “apresentação” (o que passou na avenida foi igual ao modelo impresso entregue pela escola?) etc.
Isso é mais ou menos o que parece ser feito em São Paulo (digo “parece” com base apenas nas justificativas, já que, repito, o manual do julgador não foi divulgado ao público), só que com uma padronização definida pela Liga em relação a quão importante é cada elemento do quesito. Seguindo o exemplo acima, poderia ser determinado um desconto máximo de 0,5 ponto para “concepção e acabamento das esculturas”, 0,5 ponto para “iluminação”, 0,5 ponto para “volumetria”, 1,0 ponto para “acabamento geral”, 1,25 ponto para “efeito”, 1,25 ponto para “clareza visual” e 1,0 para “apresentação”. Isso derrubaria a nota mínima para 4,5, mas claro que uma escola só teria essa nota se fizesse muita, mas muita besteira. Acho que nem Rocinha e Tradição, em 2014, chegariam a esse ponto (e olha que ambas levaram nota mínima no quesito – 9,0).
É claro que, como eu já falei no início, falta vontade política para mudar o status quo (embora, paradoxalmente, cada vez mais escolas reclamem das suas notas) e falta disposição da maioria dos jurados em prestar realmente atenção ao desfile, analisando-o tecnicamente. Usando novamente exemplos das justificativas de 2015 em São Paulo, uma jurada de Fantasia deu 9,4 para a Nenê (última escola a desfilar no dia, é bom frisar) e justificou de forma pertinente, indicando quais alas tinham divergência entre os componentes e entre o apresentado na avenida e a referência entregue pela escola, enquanto o último jurado deu 10 (as fantasias foram consertadas no meio do desfile?). Um julgamento mais detalhado e fracionado faria pelo menos com que os jurados trabalhassem mais e evidenciaria ainda mais desvios e julgamentos injustos. Por outro lado, reconheço que não há sistema de concessão de notas que melhore sozinho a lisura e a competência dos jurados.
Fred, excelente abordagem e concordo plenamente. Publiquei em 2014 no FB no grupo “Sambas de Enredo” justamente meu pensamento sobre duas coisas: julgamento e ordem dos desfiles. E vc veio a afinar perfeitamente o que sempre achei colocando de uma forma bem didática tb. Deixa eu postar aqui:
PROPOSTA PARA NOVA AVALIAÇÃO DOS QUESITOS DAS ESCOLAS: 21/05/2014
Amigos do samba,
Trago também outra sugestão que também pode facilmente ser aplicada às escolas de samba (e adaptado das idéias do esporte) e que dariam muito certo e evitariam problemas que todos os anos ocorrem com jurados, notas e etc.
Convenhamos que, atualmente, no Grupo Especial, só poder dar notas de 9,0 a 10,00 é ridículo, por que não os normalíssimos 0 a 10 então? Não dá no mesmo? E continuamos com favorecimento de escolas de nome. Convenhamos que temos panelinhas do Especial, da Série A e etc.
Então sugiro uma pontuação diferente e mais justa, como acontece na Ginástica Olímpica por exemplo, que curiosamente tinha critérios e pontuações muito parecidos com o Carnaval do RJ (entre 9,0 e 10,0) e também mudaram mediante a críticas e tal de favoritismo, nome dos esportistas, etc, e hoje o novo sistema funciona perfeitamente, apesar de inicialmente ter dado o que falar.
A proposta resumidamente para cada quesito é a seguinte:
(A) Cada quesito recebe nota mínima se a escola cumprir todas as obrigações exigidas do quesito. Ex. De 0,00 a 5.0.
+
(B) Cada quesito recebe nota mínima se a escola cumprir com a proposta do roteiro por ela apresentada (colocar em prática o que está escrito). Ex. De 0,00 a 5.0
+
(C) Execução da proposta na avenida. Ex. De 0,00 a 5,00
+
(D) Quanto mais “novidade / atrações / criatividade” a escola trouxer, a escola receberá mais pontos no quesito; por outro lado correrá mais risco de perder pontos por imperfeições nessa criatividade. Aqui se soma pontos para quanto mais “novidade” existir.
Ex. De 0,00 a 1.0 para cada nova proposta apresentada no roteiro e de maneira clara e objetiva, podendo somar 1,0 para cada uma dessas novidades se realizada com perfeição. Seria como o “grau de dificuldade” apresentado.
Isto é: Nota máxima possível para a escola seria 5,0 + 5,0 + 5,0 + 1,0 (x novidades/atrações), sendo “despontuada” em cada item que não for cumprido adequadamente.
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Vejam a proposta, por exemplo, para Alegorias e Adereços (número mínimo obrigatório são 05 carros, não teria máximo de carros como nova idéia, a escola traz quantos mais quiser se arriscar na avenida):
— Escola de Samba X vem com 09 alegorias (vem com 04 carros a mais do que o mínimo, gigantismo e representa maior risco também para o desfile):
Vamos aos cálculos, é simples:
(A) Número de alegorias mínimo no desfile (n = 5) + ausência de quebras ou acidentes ou tropeços com a torre de TV nesses carros = NOTA 5,0
+
(B) Todos as alegorias apresentadas na ordem e de acordo com o roteiro apresentado, dentro do enredo = NOTA 5,0.
+
(C) Escola apresenta 09 alegorias: Defeitos com ferragens no carro 1, idéia não bem apresentada no carro 2, alegorias 3 e 4 perfeitas, Desfilantes sem fantasias completas nos carros 5 e 6, alegorias 7 e 8 com ausência de desfilante, Queda de qualidade no carro 9. NOTA 3,0 (o máximo que conseguiria seria 5,0 nesse item “Execução”)
+
(D) Novidades dessa escola foram 04 carros além do número mínimo mas com muitas imperfeições. Isto é, nesse item a nota máxima que conseguiriam seria 4,0 se fosse tudo devidamente perfeito nos carros adicionais, mas com erros, vários pontos foram tirados. NOTA 2,0.
TOTAL DA AVALIAÇÃO DO JURADO 1 PARA QUESITO AA DA ESCOLA X: Nota15,0 (5 + 5 + 3 + 2, sendo que se tivesse sido perfeita de ponta a ponta com as novidades valeria 19,0).
Se uma escola Y trouxesse 03 carros adicionais, conseguiria receber no máximo 18,0 / Se uma escola Z trouxesse nenhum carro adicional mas novidades em cada um dos seus 05 carros mínimos, conseguiria receber 15,0 a 20,0 se fosse perfeita e clara com as novidades, e assim por diante. Coloquei aqui número de carros adicionais como exemplo de novidades, mas poderia ser tripé, poderia ser pêndulos, poderia ser tecnologia, poderia ser carro somente com seres humanos, … Outra possibilidade de escolas que preferissem seguir mais a segurança, seria a escola W trazer os 05 carros exigidos mas perfeitos, sem novidades precisas, levaria 15,0 e sairia com nota igual daquela escola X (15,0) que trouxe 9,0 carros mas com inúmeras imperfeições (X se arriscou mais mas veio cheia de imperfeições).
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E isso seria aplicado para cada um dos quesitos com seus critérios e pontuações, com estudo profundo das regras pelos jurados e cursos adequados, podendo ser revistos a cada 03 anos de acordo com queixas das escolas e tendências também.
E esses critérios de pontuações seriam DIVULGADOS PARA TODAS AS ESCOLAS ANTECIPADAMENTE, no formato de Edital até Maio de cada ano, para que as escolas pudessem entender os critérios de avaliação adequadamente, e ao final de um desfile teríamos mais precisamente a idéia do desempenho de cada uma. E também daria um melhor retorno para cada escola no que exatamente precisariam melhorar ou adequar para conseguir maiores pontuações em “novidades”sem tantas imperfeições.
Sei que existe aquela tradição do 10,00, do 9,9, tão tradicionais mas que no final não resolvem o problema que acontece pelo menos desde 1984 = Injustiças e pouca explicação adequada com jurados que não sabem o que devem avaliar. Isso aconteceu como uma revolução no esporte, e hoje não se tem mais problema algum com essas injustiças gritantes favorecidas pelo quesito “Nome da escola”.
Exemplo em 2014, a Tijuca provavelmente teria ganho alguns pontos em novidades mas perderia vários em imperfeições e execução, sendo um sistema mais justo (sou Tijucano mas assumo as imperfeições)
Toda competição hoje em dia tem regras divulgadas antecipadamente com critérios obrigatórios em detalhes. Por que não podemos aperfeiçoar nosso sistema no Sambódromo?
E o outro post:
Amigos do Samba,
Só queria sugerir uma idéia que acontece nos esportes em Olimpíadas, por exemplo … Se temos 12 escolas em suas classificações ao final da apuração em um Carnaval, o ideal seria as escolas já saberem quando iriam desfilar no ano seguinte ao final da apuração, sem precisar de sorteio e todos os gastos que isso gera com cerimônias, reunião dos presidentes/carnavalesco, data e etc.
SERIA UMA REGRA OBRIGATÓRIA EM QUE AS ESCOLAS TERIAM SUA ORDEM DEFINIDA PARA O DESFILE NO PRÓXIMO ANO DE ACORDO COM SUA CLASSIFICAÇÃO NO ANO ANTERIOR. Seria mais justo e até os planejamentos seriam mais adequados e antecipados para o Carnaval seguinte.
Exemplo:
1a colocada no ano de 2014 = Última a desfilar no Domingo em 2015
2a colocada no ano de 2014 = Última a desfilar na Segunda em 2015
3a colocada no ano de 2014 = 5a. a desfilar no Domingo em 2015
4a colocada no ano de 2014 = 5a. a desfilar na Segunda em 2015
5a colocada no ano de 2014 = 4a. a desfilar no Domingo em 2015
6a colocada no ano de 2014 = 4a. a desfilar na Segunda em 2015
7a colocada no ano de 2014 = 3a. a desfilar no Domingo em 2015
8a colocada no ano de 2014 = 3a a desfilar na Segunda em 2015
9a colocada no ano de 2014 = 2a a desfilar no Domingo em 2015
10a colocada no ano de 2014 = 2a a desfilar na Segunda em 2015
11a colocada no ano de 2014 = 1a a desfilar no Domingo em 2015
12a colocada no ano de 2014 rebaixada e a campeã da Série A = 1a a desfilar na Segunda em 2015.
Dessa forma a escola que subia não sairia tão prejudicada com a frieza de abrir o Grupo Especial e iria abrir Segunda; + a 11a colocada por ter feito um Carnaval “ruim” no ano anterior teria que mostrar realmente “talento ou volta por cima” inaugurando o grupo do ano seguinte; + a campeã e a vice teriam que mostrar suas potências para continuar no topo do carnaval sendo as últimas a desfilar em cada dia (especialmente a campeã sendo a última de Domingo).
Isso ocorre nas finais de vários esportes em Olimpíadas e dá super certo. Cria maior dinâmica pois todas as escolas em todos os anos tem novos desafios dependendo da sua classificação no ano anterior.
Vejam um exemplo real com 2014 para 2015:
Carnaval 2014 (resultados):
1o Tijuca
2o. Salgueiro
3o. Portela
4o. Ilha
5o Imperatriz
6o. Grande Rio
7o. Beija
8o. Mangueira
9o. Mocidade
10o. Vila Isabel
11o. São Clemente
12o. Império da Tijuca
Então a ordem do desfile 2015 seria:
DOM
1a. São Clemente
2a. Mocidade
3a. Beija
4a. Imperatriz
5a. Portela
6a.Tijuca
SEG
1a. Viradouro
2a. Vila
3a. Mangueira
4a. Grande Rio
5a. Ilha
6a. Salgueiro
——————— O que acham?
Outra possibilidade seria inverter esses dias tb se for o caso. Mas esse raciocínio daria bem certo e evitaria todos esses atrasos de programação e gastos desnecessários. O mesmo se aplicaria para grupo Série A e outros.
DIVULGUEM!