(por Pedro Ivo Almeida, jornalista esportivo de profissão e carnavalesco de coração)

A madrugada da última terça-feira (20 de outubro) definiu o último samba-enredo para o Grupo Especial do Rio de Janeiro e fechou a versão 2016 do CD da grande festa carioca – a maior do mundo. Zé Katimba e seus parceiros venceram – mais uma vez – a disputa em Ramos e terão a honra de assinar o samba que a Imperatriz Leopoldinense levará para a Avenida.

Em uma rápida passada por redes sociais e alguns papos com amigos admiradores da festa, é quase unânime que o último samba a ser escolhido será o primeiro na lista de preferência dos sambistas para o próximo Carnaval. E olha que a disputa é boa.

Ainda que não tenhamos os famosos sambas que arrasam quarteirões, como Vila-2013, Portela-2012 e outros, a safra apresenta bom nível, confirmando uma tendência da segunda década deste século. Mas creio que teremos centenas (ou milhares) de análises sobre isso até fevereiro. O ponto que pretendemos discutir aqui é outro: a “safra” daqueles que não irão para a Avenida. Sim, os derrotados nas disputas. Aqueles que só formarão um CD na cabeça e playlists dos mais fanáticos – me incluo nessa.

Confesso não lembrar do “CD dos derrotados” de todos os anos, mas me arrisco a dizer que pouquíssimos, talvez nenhum, tiveram a qualidade da versão, digamos, “reserva” do disco do Grupo Especial do Carnaval 2016 do Rio de Janeiro.

Claro que a safra não terá a qualidade do time principal, mas é inegável o nível interessante dos sambas derrotados, o que mostra um bom nível dos compositores em termos gerais neste ano de 2015 – para o Carnaval 2016.

E como não podemos ficar em cima do muro e juntar todos no mesmo bolo apenas para agradar, já destaco algumas faixas neste CD imaginário: Salgueiro, Mangueira, Unidos da Tijuca, Portela, Estácio de Sá e a própria Imperatriz.

Por mais que a vitória de Zé Katimba seja incontestável (no bolão dos colunistas do Ouro de Tolo, todos apostaram neste samba), como não reconhecer a qualidade da composição de Elymar Santos e parceiros? E também a de Me Leva e cia. Deve ser duro para o compositor saber que “acertou a mão” e terá sua obra esquecida pelo grande público.

E no Salgueiro, que teve a disputada mais comentada e badalada do ano? Xande de Pilares, Dudu Botelho e parceiros levariam 10 de qualquer jurado. Vale ainda a menção ao derrotado Antônio Gonzaga, o jovem de apenas 20 anos que sinaliza uma excelente renovação na Academia. A vitória para ele é questão de tempo.

Saindo da Silva Teles, vamos para a Visconde de Niterói. Nunca um discurso de presidente na hora do anúncio do samba vencedor foi tão sincero – ou pareceu ser: “queria poder escolher todos aqui, mas só posso levar um”, disse Chiquinho da Mangueira. Claro! Quem não queria um samba como o de Lequinho na Sapucaí representando sua Escola. E torna-se desnecessário falar da composição de Tantinho, já aclamada por todos e, talvez, a grande vitoriosa do ano.

Ainda por perto, na zona norte, mais especificamente na região portuária, Totonho, Josemar Manfredini e parceiros representam muito bem a Unidos da Tijuca em nosso CD que nunca sairá. A passagem “sou Tijucano dá pra ver no meu sorriso”, explodiria uma das comunidades mais aguerridas da atualidade. Isso sem falar na maravilhosa subida para o refrão principal (Chega de prosa, cada um pegue seu par. Ninguém vai ficar parado até o dia clarear). E tinha mais por lá. Dava para escolher de olho fechado.

No berço do samba, na minha humilde opinião, os integrantes de nossa lista superam até mesmo a versão oficial que irá à Avenida. Os sambas de Dominguinhos do Estácio, previamente cortado, e Daniel Gonzaga dariam trabalho aos jurados. Ia ter gente pensando muito para não dar uma nota 10 – artigo raro em escolas recém-chegadas do Acesso.

Ainda na região, nas terra de Noel, talvez o único caso de abismo entre a obra vencedora e as outras. Mas Jorge Tropical e seus parceiros, bem como Jaiminho Harmonia, conseguiriam emplacar um CD mais modesto. Nada como os gênios e novamente campeões André Diniz, Martinho da Vila e Arlindo Cruz.

Pegando a linha do trem, vamos à Madureira, terra de gente muito boa na arte de compor. Lá já é tradição ter samba derrotado que valeria 10 na Avenida. Finalista na disputa do último dia 16 e um dos maiores campeões dos últimos anos, Luiz Carlos Máximo poderia estar na Sapucaí. Até mesmo o questionado Noca não faria feio. Um ajuste aqui ou outro ali, uma parte que não agrada a todos acolá… mas com destaque em nosso CD.

Em Padre Miguel, mas um caso (na minha opinião, claro) de derrotado superior ao vencedor. Doído não ver a obra do talentoso Diego Nicolau não ser escolhida. O menino merecia ter seu bonito samba cantado pela Mocidade em 2016. Não tem problema, terá espaço em nosso disco. E com destaque.

Beija-Flor, Grande Rio, São Clemente e União da Ilha talvez não brilhassem ou garantissem muitos compradores ao nosso CD, mas não iria dever em nada. Aliás, estamos cansados de aturar faixas que costumamos pular em alguns anos. Júnior Trindade e Jr. Beija-Flor, Lucas Donato, Helinho 107 e Reginaldo Bessa, juntamente com Cadinho, respectivamente nas quatro escolas, seriam bem recebidos por todos.

Queria eu que o “Ouro de Tolo” tivesse verba disponível para viabilizar um CD desses. Um dia, quem sabe… Mas muito me alegra, e já me basta, ganhar novos argumentos para rebater os malas que insistem em dizer que o samba-enredo está morrendo, que a qualidade de hoje já não é tão boa como antes. Amigo: pare, leia este texto com atenção e pense 100 vezes antes de repetir esta bobagem. Estamos (muito) longe de morrer.

E como sempre diz o nosso colega, colunista deste blog e excelente compositor Aloísio Villar, que gênero nos apresenta mais de 20 obras excelentes a cada ano? E olha que nem falei do Grupo de Acesso, hein… não desta vez. Quem sabe numa próxima. Enquanto isso, vamos curtindo nosso excelente CD imaginário.

Um abraço especial a todos os compositores que não desistem na primeira derrota. Estaremos aqui sempre para prestigiá-los. Uma hora a vitória chega. E aí é só comemorar como os já consagrados Gusttavo Clarão e Dudu Nobre neste vídeo do Bar Apoteose aqui embaixo.

Valeeeeeeeeeeeu! Abs!

https://www.youtube.com/watch?v=1EuF7MTTrpU

3 Replies to “Um CD Especial: fora da Avenida, dentro da memória​”

  1. Excelente, a obra que mais lamento é a do Totonho, acho inferior ao samba do Clarão e Dudu, entretanto, é a que mais me causa lamentação pela identificação com a escola. Pena demais.

    Ótimo texto.
    Abraços!

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