Sei que talvez o timing para escrever sobre o tema talvez não seja o mais adequado, mas os afazeres de trabalho têm me tomado mais tempo do que o habitual e tem ficado mais complicado escrever nesta revista eletrônica com a periodicidade habitual.
Entretanto, as relações entre as escolas de samba e a televisão vêm sendo alvo de debates acalorados nas últimas semanas, com muitas colocações fortes de parte a parte. E este é um assunto que exige uma análise mais cuidadosa dos aspectos envolvidos. Vamos a eles.
A primeira questão a ser analisada é a da transmissão dos desfiles. Originalmente, segundo o divulgado pela imprensa, a TV Globo, detentora dos direitos, iria transmitir apenas a partir da terceira escola, optando por exibir Estácio de Sá, União da Ilha, Vila Isabel e Salgueiro apenas em compacto. Com a repercussão negativa na comunidade, a emissora voltou atrás e manteve a prática dos últimos anos, não transmitindo ao vivo apenas a primeira agremiação.
Dois pontos se impõem nesta análise. O primeiro é a questão do horário dos desfiles. No último ano, com sete escolas no Acesso e seis no Especial por noite, os desfiles terminaram ainda antes do amanhecer; o Acesso na sexta feira terminou às três e meia da manhã e o Especial nas duas noites acabou por volta das cinco.
Ou seja: me parece haver espaço para se iniciar os desfiles mais tarde de forma a atender a demanda da emissora quanto à sua programação sem precisar sacrificar a primeira escola a desfilar. Especialmente na sexta feira, com o trânsito de saída do Rio de Janeiro, o início do desfile mais tarde é algo quase imperativo dada a dificuldade de chegada ao Sambódromo.
Ainda retomaria uma tradição do samba carioca, que é a dos desfiles sob a luz do dia. A última vez que isso ocorreu foi com a Acadêmicos do Cubango (alto), em 2014, e assim mesmo porque a Alegria da Zona Sul teve problemas e houve atraso no desfile. Sabemos da “fotofobia” de certos dirigentes de carnaval, mas não parece ser um problema a última escola a desfilar pegar do meio para o final o dia claro. Especialmente no Grupo de Acesso, com sete agremiações e um tempo menor, poderia se iniciar o desfile em um horário mais tarde a fim de se ter a transmissão total ao vivo.
Este ano, os desfiles irão se iniciar mais tarde, mas ainda não de forma suficiente para atender aos interesses da Globo. É um ponto que precisa ser reanalisado, a meu ver, para 2017.
O outro fator é uma reflexão que fiz na última vez em que estive no programa Bar Apoteose. Sabe-se que a cada ano aumentam as opções disponíveis de vídeo e do que se pode assistir na telinha. Cada vez mais temos uma segmentação de mercado e esta é atendida pelos diversos canais existentes na televisão fechada, na internet e em outras mídias.
Então, uma pergunta se impõe: até que ponto o desfile das escolas de samba se justifica na TV aberta fora da cidade do Rio de Janeiro? Sabemos que na madrugada as opções disponíveis são menos atrativas em termos de audiência, mas no quadro atual até que ponto não seria mais interessante às escolas, fora da região metropolitana do Rio de Janeiro, ter uma transmissão mais segmentada em televisão fechada?
Um bom exemplo é quando se compara a transmissão do Acesso carioca, segmentada para a Globo Rio, com a feita para o Grupo Especial à rede. A primeira tem agradado bem mais a quem acompanha o carnaval e as escolas o ano todo do que a segunda, uma transmissão mais generalista. Uma transmissão segmentada em TV fechada permitiria algo mais direcionado àqueles que gostam de carnaval e das escolas de samba, tornando um produto mais atraente ao público.
Para a cidade do Rio de Janeiro, onde o interesse é maior, talvez a manutenção em televisão aberta seja sustentável. No último Bar Apoteose de que participei, o jornalista Leonardo Bruno, do Extra, sugeriu que se faça um modelo parecido com o do Rock in Rio: as primeiras escolas em TV fechada, com a Globo entrando posteriormente. Pessoalmente acho um modelo complicado de se adotar pensando pelo ângulo das agremiações, mas é algo que pode ser estudado.
Outro ponto que precisa ser analisado nesta questão é o contrato de transmissão. Não tenho os detalhes do mesmo, mas se ele permite esta postura de só transmitir a partir da segunda escola ou não transmitir o Desfile das Campeãs, a emissora está apenas exercendo o seu direito estabelecido em contrato. Caberia à Liesa na renegociação, no caso, estabelecer limites mais definidos de transmissão ou exigir que o Desfile das Campeãs tenha televisionamento.
No caso deste último, caso houvesse um marco regulatório econômico no setor de mídia a emissora teria de repassar os direitos à TV Brasil sem custo, caso não haja interessados. Como não há, e ao que parece o contrato também não exige a transmissão, a Rede Globo tem o direito de levar ou não as imagens de acordo com sua análise econômica de custo e retorno. Pode-se achar injusto, eu pessoalmente acho, mas é legal.
Por outro lado, deve-se elogiar o espaço crescente que a emissora está dando às escolas de samba em seus noticiários pré-carnavalescos. Matérias que chegam a dez minutos em seu telejornal matutino (o que é muito tempo em termos de televisão), séries especiais como a “Meu Jeitinho” enfocando a preparação de cada uma das agremiações do Grupo de Acesso e cobertura dos principais eventos como finais de samba e os ensaios técnicos, além de matérias especiais na Cidade do Samba. É um ponto no qual se avançou muito nos últimos anos.
A própria transmissão do desfile do Acesso pela emissora teve o efeito de melhorar o nível deste desfile como um todo e ampliou as possibilidades de patrocínio, diga-se.
Lembrem os leitores que a emissora tem inúmeros produtos para cuidar, e o produto carnaval é apenas mais um deles.
Vale lembrar, também, que o contrato com a emissora é uma parcela considerável das receitas das escolas, ainda mais em um período de retração econômica como este 2015/16. Os valores advindos deste contrato, hoje, são indispensáveis para que as agremiações possam fechar suas contas; umas mais, outras – que avançam em novas fontes de recursos-, um pouco menos. Ainda assim, a receita deste contrato é algo que hoje não se pode abrir mão por parte de nenhuma das escolas.
Outro ponto que vale a pena discutir é o que também foi levantado no último Bar Apoteose: reduzir o tempo de desfile de cada agremiação a fim de tornar o espetáculo mais “vendável” na televisão aberta. Pessoalmente sou contra devido aos impactos disto na estrutura das agremiações (menos desfilantes, menos movimento nas quadras, menos carros e menos pessoas trabalhando nos barracões, entre outros), mas pelo ângulo do telespectador que não é fanático pode ser que faça sentido – e assim ampliar o público interessado.
Não podemos nos esquecer do impasse dos direitos para internet: a emissora não disponibiliza íntegra ou compactos dos desfiles em seus portais e solicita ao YouTube que retire os que são postados – de 2015, por exemplo, não há nada disponível. A Rede Globo está no direito dela, mas o amante de carnaval que quiser rever os desfiles não pode. É outro ponto que necessita ser avaliado.
Finalizando, é claro que este artigo não esgota a análise, mas me parece claro que na renovação do contrato a ser efetuada ano que vem estas questões precisam ser levadas em conta. Especialmente pelas entidades que administram os desfiles.
Bom dia Migão,
Texto de forma alguma inadequado, pois ao se falar do carnaval com e para quem realmente o ama, você levanta pontos que as vezes na euforia a festa podemos não perceber.
A questão TV x Carnaval e seus interesses é um tema antigo e eu já li varias análises e “propostas” de como ser justo para ambos os lados.
Eu sou estudante de Marketing e trabalho na área comercial de uma cia aérea, e não consigo ver como uma empresa tenha um “gasto” na venda de um produto (no caso a transmissão dos desfiles) e não tenha o retorno.
Acredito na linha da Globo em rentabilizar o quanto possível o carnaval, mas creio também que ela não vai desvaloriza-la ou subaproveita-la de maneira inadequada.
Por outro lado, a alma sambista clama por toda a atenção e cuidado para com as escolas e apreciadores. Eu quero, da minha casa em São Paulo assistir na íntegra o desfile da Estácio, e ler no inicio de seu texto que foi cogitado não mostrar 3 escolas, me deu um calafrio.
Acho que o caminho é as escolas se disponibilizarem como “marcas e produtos”, mas não para perder o valor histórico e afetivo com sua comunidade, mas sim para negociarem contratos, valores e total respeito.
O dinheiro é necessário, segundo o Estado de São paulo de 17 de janeiro de 2016, a Globo disponibilizou para cada escola de São Paulo um milhão de reais. Será que poderia ser mais? Um milhão já é uma porcentagem considerável?
Por outro lado, ela comanda a festa. Lembro que em 2015 estava nos desfiles de sabado de São Paulo e a primeira escola, Vila Maria não entrou na avenida enquanto a Globo não terminasse o programa Zorra Total e começasse a transmitir. Ela acabou levando uma tremenda vaia e o publico acabou não reagindo ao desfile dela.
Valeu Migão!
Bons comentários, Ladislau
Não posso revelar publicamente, mas o que a emissora gasta com as escolas de samba aqui do Rio não fica muito a dever com o que ela paga pelo Campeonato Estadual do Rio, por exemplo. É um valor considerável.
Valeu Migão! E imagino esse valor, pois acho que vale. O carnaval carioca sempre foi e ainda é o maior do mundo.
Só te provocando: lhe tenho adicionado no Facebook, manda esse “valor” inbox…rsrsrs.
Brincadeira!
Nada disso rs
Bom dia!
Prezado Pedro Migão:
Era da Internet.
Buscas por demanda. Desejos realizados ao toque de um botão do mouse ou teclado.
Um lado meu pensa que o carnaval poderia se modernizar a este ponto, deixando tudo on line. E quando falo em tudo, refiro-me a simplificar as transmissões de escolas de Samba do Brasil inteiro para que todas elas estejam disponíveis na Internet para quem quiser acompanhar.
Imagine só!
Eu poderia estar na Sapucaí acompanhando os desfiles da Nego Quirido (Em Florianópolis) pelo meu telefone (E vice-versa!).
Penso Quixotescamente até que a indústria eletro-eletrônica nacional poderia ser levemente impulsionada para atender a este surto de agilidade e eficiência virtual.
Se bem sucedida, qualquer outra manifestação cultural poderia estudar uma possível transmissão (Maracatus, Cavalhadas e Quadrilhas Juninas!) virtual simplesmente para o público que desejasse assistir.
…mas por outro lado…
Lembro-me de que o sítio do meu já falecido avô não tinha luz elétrica até bem pouco tempo. Internet é quase uma palavra estrangeira, e a TV Aberta é uma janela do país para muita gente.
Sinceramente, haja Quixote para acreditar que uma demanda carnavalesca pudesse alavancar uma revolução (Ainda que pequena) no Brasil.
Joãosinho Trinta estaria orgulhoso de mim!
Assuntos como o deste post não são tardios.
As questões estão na nossa porta, e precisam ser debatidas com urgência.
Atenciosamente
Fellipe Barroso
Fellipe, seria interessante, mas como esperar isso se até hoje os ingressos são vendidos via fax? Complicado
QUEM GOSTA DE CARNAVAL , NÃO PODE ESTAR SATISFEITO COM ESSE MONOPÓLIO NOCIVO DA GLOBO!
Sugiro ao leitor que releia o artigo com atenção.
Parabéns pelo texto, levanta e propõe soluções sobre questões importantes do desfile das escolas de samba.
Também não acho a Globo a grande vilã dessa história, ela apenas exerce seu direito, se tem esse poder todo nas negociações, a responsabilidade é das escolas e da Liesa, que não conseguem enxergar o Carnaval como um produto altamente rentável, exploram muito mal suas marcas, é só ver a “divulgação” do cd desse ano, quase não toca nas rádios, escolas não vão em programas de tv, e no comercial mal se ouve o samba, só o Tinga falando!
Em relação a transmissão, gosto da ideia da transmissão na tv fechada, até mesmo pay-per-view, porém não sei se teria retorno para a emissora. Primeiro, infelizmente, acredito que o número de pessoas fora do Rio realmente amantes do carnaval hoje seja bem reduzido, o que talvez não geraria grandes números de audiência na tv fechada e de venda de pay-per-views. E segundo, que muitas pessoas ainda não tem acesso à Internet, ou, se tem, sem capacidade para uma transmissão de qualidade, sem ficar parando a todo momento…
Acredito que as escolas teriam de chegar a um consenso com a Globo em relação a isso, de forma a garantir a transmissão integral e ao vivo das escolas e atender aos interesses da emissora. Por isso que, embora não goste nem um pouco da ideia de redução do tempo de desfile, acho que, a curto prazo, isso é inevitável, bem como a redução do número de alegorias.
Minha sugestão: Série A mantém com 14 escolas, sete cada dia, 55 minutos de desfile, só que começando às 23hs. No Grupo Especial mantém as 12 escolas (mas como gostaria que fossem 14…), com um tempo de desfile de 78 minutos e iniciando às 22h30…
Lembrando que, como você disse, essa questão está longe de se esgotar, mas se as pessoas do mundo do Carnaval não repetirem seu exemplo e iniciar um debate sadio, nunca se chegará a uma solução.
Como escrevo no texto, eu vejo demanda nacional para uma transmissão em tv fechada. E sou contra redução de tempo de desfile, porque impacta em diversas outras coisas.
Dentro das possibilidades apresentadas, a transmissão fechada está se mostrando o caminho mais calmo e menos nocivo. Sem pay-per-view!
Joga no Multishow igual o Rock in Rio. Chega na Avenida às 18 h, e só sai de lá depois das 7 h!
Até pode ser no Multishow, mas lembro que quando passaram as campeãs de rj e sp no Viva, assim como o grupo de acesso de sp, houve uma gritaria enorme dos telespectadores do canal em questão (ô gente chata…) reclamando de passarem escolas de samba no lugar da programação normal, alegando justamente que isso era pra tv aberta. Provavelmente mesmo no Multishow, canal mais musical, algo assim se repetiria, o que pode vir a dificultar uma decisão da Globo transmitir os desfiles ali. Mas enfim, algo tem de ser feito, que pelo menos a Liesa e as escolas levem ideias como essa para a emissora.
Seria ilógico da minha parte se eu pensar em um canal “exclusivo” para o carnaval. Tipo canal 815 que em todo o ano fica desabilitado e só abre sinal para os desfiles.
Faz o 816 abrir na sexta e sabado para Sampa e o 815 nos mesmos dias para o Grupo A do Rio. Assiste quem quiser comprando os desfiles. Transmite as campeãs de São Paulo e Rio (sexta e sabado respectivamente).
De repente não impactava a TV aberta e nem os “fãs” do canais tipo Multishow ou Viva.
Se eu não me engano os canais do Premiere ficam ociosos durante o período
Sabe onde eu veria espaço? No Globosat+ ou no próprio Canal Brasil.
Migão, eu só não concordo com você quanto à sugestão de colocar o desfile na TV fechada para fora do RJ. A divulgação seria ainda menor e há muitos fãs das escolas em todos os lugares do Brasil. Concordo com a opinião do Leonardo Bruno de que as duas opções poderiam se completar, fazendo o papel que foi da Manchete até 98, quando transmitia o desfile na íntegra e a Globo entrava na hora que queria. Mas nem todo mundo tem TV por assinatura ainda, especialmente lugares para onde turistas se hospedagem em viagens durante o Carnaval.
Mas a Globo exige exclusividade desde 2000, quando tirou os direitos da Band para impedir que o Fernando Vanucci narrasse o desfile em outra emissora.
Já que é assim, a melhor idéia foi essa que você apresentou, de o desfile começar mais tarde.
Grande abraço e parabéns pelo site.
Pode ser por aí sim. Conversando na renovação do contrato se chega a um lugar comum e bom para todos os atores envolvidos no processo.
E tem mais um detalhe que ninguém aqui está levando em consideração: a transmissão dos desfiles é realizada em HD desde 2010 se não me engano, e até hoje eu não tive a oportunidade de assistir nenhuma vez nesse formato!
Moro no interior de MG, sou fanático pelos desfiles e não posso aproveitá-lo em sua plenitude.
Seria muito bom se algum canal de tv por assinatura transmitisse na íntegra e em HD.
Pedro Migao precisamos de uma nova manchete que mostre o desfile na íntegra com equipe especializada e a Globo fique com o show,artistas etc… Vejo a TV Brasil com canais em diversos pontos do país e presença maciça nas parabólicas e principais operadoras com potencial para ser uma nova Manchete no carnaval carioca.
Infelizmente, acho complicado uma segunda tv dividindo com a Globo os direitos de transmissão
Creio que a transmissão pela TV Pública seja a melhor solução para o caso do desfile das campeãs caso a Globo não queira transmitir…
O curioso é que hoje surgiu um rumor de que a TV Brasil pode transmitir as Campeãs este ano
Rumor ao que parece confirmado. Vamos aguardar
Galera moro em Salvador,Sou Amante dos Carnavais que são de Desfiles de Escolas de Samba e digo aqui é mt raro,vc achar alguém que gosta dos Desfiles.Por isso seria interessantes os desfiles serem transmitidos pela TV Brasil.Dessa forma assistiria quem quisesse e não teria problemas
A questão de direitos de transmissão é mais complexa. Não consigo ver o desfile com mais de um tv fazendo a transmissão, infelizmente
Mesmo assim só consigo assistir o Carnaval de SP pq tenho TV por assinatura e tem a o canal Globo SP,pq no canal local daqui só começa a transmissão dps da 2h da manhã
Por isso a ideia de uma transmissão mais segmentada na tv fechada
que horas globo vai transmitir desfile domingo de carnaval para fora do rio de janeiro
Se eu não me engano é a partir das 22:45, mas uma olhada na programação seria interessante
Considerações a parte, o que existe na verdade é uma necessidade de demonstração de poder, o a mesma que ela exerce quando se trata de futebol e de política. O que é lamentável, no final das contas, é o desrespeito ao telespectador.