(por CASSIUS SILVA, viciado em Olimpíadas e comentarista de resultado)
Confesso que, como “acompanhante” do time olímpico dos EUA, não esperava um desempenho ainda superior ao excelente resultado obtido em Londres.
Parece-me que a derrota para a China em 2008 – mais por um assombroso desempenho chinês, com 51 ouros naquela edição, do que por um fracasso americano – trouxe de volta a competitividade dos tempos da Guerra Fria para os EUA, de modo que eles buscaram melhorias nos seus três esportes de base: natação, atletismo e ginástica artística.
Fiz um pequeno quadro comparativo para analisar o desempenho do Team USA nas Olimpíadas de 2016 em relação às Olimpíadas de 2012 (alto do post, clique para ampliar).
Aliás, se há uma razão para eu gostar tanto do “Team USA”, esta é o exímio desempenho dos Estados Unidos nestes esportes que, para o MEU gosto, são os que melhor simbolizam as Olimpíadas – as lutas e esportes “de força”. Bem como os demais coreográficos (exceto a ginástica artística), pertencem mais aos antigos países da URSS e os asiáticos; porém não me atraem tanto.
Voltando à análise de 2016, seguem duas informações básicas para se ter ideia de quão excepcional foi o desempenho dos EUA nestas duas últimas Olimpíadas:
- o número de ouros (46) é o maior que o país conquistou excetuando-se duas das quatro edições realizadas nos EUA – sendo que em uma delas, 1984, houve o boicote da URSS;
- o total de medalhas de 2016 (121) repete o feito acima.
Observa-se, assim, que o resultado tinha começado a surgir em 2012 e consolidou-se em 2016; mas resta saber se será mantido em 2020, ainda mais com o crescimento da Grã-Bretanha (destaque para o atletismo e a ginástica), a provável evolução japonesa e a aposentadoria de Michael Phelps.
Analisando especificamente os resultados de 2016, apesar de todos os elogios à equipe, houve algumas decepções – que talvez fossem tratadas como “amareladas” no Brasil:
- Simone Biles caiu da trave;
- o time feminino de futebol também sucumbiu à Suécia nos pênaltis;
- Shakur Stevenson perdeu a luta final, ainda que esta tenha sido bastante parelha, no boxe;
- Allyson Felix foi surpreendida por Shaunae Miller se atirando na chegada dos 400m;
- os dois times de vôlei caíram nas semifinais para seleções inferiores;
- Serena Williams foi apenas a passeio e não buscou o bicampeonato de simples ou duplas.
Além disso, Walsh/Ross deram azar de enfrentar Agatha e Bárbara nas semifinais; mas pior sorte tiveram Dalhausser/Lucena, que tiveram de pegar a dupla brasileira campeã logo nas quartas de final e ficaram sem medalha.
A prata de Phelps nos 100m borboleta não foi uma derrota, pois era de certa forma esperada antes das Olimpíadas, mas chegou-se a cogitar mais um ouro do maior medalhista da história (e meu ídolo olímpico, que me desculpe Bolt).
Outro que não conseguiu repetir o histórico foi David Boudia, deixando os EUA sem ouro nos saltos. Por fim, o tiro esportivo também trouxe resultados minguados em relação às últimas edições.
No grupo dos favoritos que cumpriram o esperado, o próprio Phelps foi um dos destaques com seus cinco ouros, mas ainda na natação prefiro enaltecer a perfeita Katie Ledecky – graças a ela que foi conquistado o ouro nos 4x200m livre (recebeu quase 1seg atrás e deu a vitória por mais de 1seg de diferença). Outros que destaco neste grupo são:
- Kristin Armstrong obtendo o tricampeonato no ciclismo contrarrelógio;
- a própria Simone Biles faturando três ouros individuais;
- Kayla Harrison bicampeã no judô;
- Claressa Shields bicampeã no boxe;
- o tricampeonato no remo oito com feminino;
- Ashton Eaton faturando o bicampeonato com recorde olímpico;
- o tri no basquete masculino e o hexa no feminino;
- o bicampeonato no polo aquático feminino;
- o hexacampeonato no 4x400m feminino do atletismo;
- o tetra no 4x200m livre e o eneacampeonato no 4x100m medley da natação masculina.
Se por um lado houve algumas decepções, também houve algumas surpresas positivas. Na natação feminina, Maya Dirado conseguiu bater a “Dama de Ferro” Katinka Hosszú nos 200m costas e Simone Manuel fez uma prova histórica de 100m livre, dividindo o ouro com a canadense Penny Oleksiak (feito não conseguido desde 1984).
Anthony Ervin, na natação masculina, trouxe de volta um ouro nos 50m livre após 16 anos. Gwen Jorgensen, no triatlo, não foi bem uma surpresa devido à forma com a qual chegou aos Jogos, mas trouxe o primeiro ouro dos EUA no esporte (apesar de ter 30 anos, seus resultados só apareceram em 2014).
Apesar de não terem conquistado o ouro, também tiveram resultados acima do esperado:
- Josh Prenott nos 200m peito da natação, quase superando o cazaque;
- na ginástica artística, o time feminino mostrou-se tão bom que poderia vencer mesmo sem Simone Biles: Raisman foi prata no individual geral e no solo; Laurie Hernandez na trave e Madison Kocian nas barras assimétricas (perdendo por menos de 0.1 para Mustafina);
- na ginástica artística masculina, ainda fraca perante a feminina, foram obtidas três medalhas, sendo duas pratas (melhor resultado pós-Paul Hamm);
- a evolução na esgrima masculina e no hipismo, apesar de ainda faltar um ouro;
- o ressurgimento no ciclismo de BMX após uma Olimpíada zerada em Londres.
Por fim, importante constatar que quase 60% dos ouros foram obtidos pela equipe feminina e que houve um total de 22 modalidades premiadas em 2016 contra 18 de 2012 (tudo bem que uma destas era nova – o golfe), ou seja, buscou-se também aumentar a diversidade – foram apenas 9 esportes sem medalhas, dentre os quais apenas a canoagem deixa de fato a desejar.
Os outros foram futebol, rúgbi, hóquei sobre grama, handebol e pentatlo moderno – que distribuem poucas; tênis de mesa, nado sincronizado e badminton, que já têm supremacia de vários outros países.
Imagens: Ouro de Tolo
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Obrigado pela oportunidade, Migão. Acabei me esquecendo de incluir outras duas considerações:
– Os EUA conseguiram uma grande evolução nas provas de meio-fundo do atletismo. Matthew Centrowitz levou o ouro nos 1500m, Evan Jager foi prata nos 3000m com obstáculos, Paul Chelimo (nascido no Quênia) também levou a prata nos 5000m e Galen Rupp conquistou o bronze na maratona; dentre outras medalhas e bons resultados em finais em provas nas quais, tradicionalmente, os americanos não são especialistas.
– Sarah Robles conseguiu um bronze no levantamento de peso, esporte em que não medalhava desde 2000.
Muito bom o post Cassius. Galera do grupo mandando bem nas Olimpíadas e agora nos posts.Apesar de não conhecer tão a fundo o time dos EUA como você concordo com as suas observações.
Se o Brasil investisse forte nessa tríade atletismo, natação e ginástica artística fatalmente estaria ali no top 7 das medalhas.
Parabéns pelo post
beijos
Obrigado, Vanessa! Eu não conheço muito a fundo, apenas gosto de acompanha-los durante as Olimpíadas e pesquiso bastante os resultados históricos – mas sempre me esqueço e tenho de reler a cada ciclo olímpico, rsrs.
Realmente, atletismo e natação (principalmente) são dois carros-chefe em que o Brasil ainda tem de melhorar MUITO. Na ginástica artística já tivemos alguns bons resultados na masculina e há a promessa da Flávia na feminina. Ainda assim, precisa-se buscar algum resultado na rítmica e na de trampolim.
Sds
Salve Cassius !
Ótimos levantamentos sobre os EUA e suas chaves de sucesso.
O Brasil é muito forte em geral nos esportes coletivos, mas pode melhorar muito nos individuais, peneirando talentos capazes de levar mais de uma medalha pra casa. Precisamos ter atletas mais completos na natação, no atletismo e na ginástica, tríade realmente capaz de alavancar qualquer quadro de medalha.
Alguns atletas tem potencial para ir mais longe, mas aí é uma questão técnica na qual não sei opinar muito. (Níveis de treinamento, treinadores, preparação psicológica).
Abraços !
Parabéns pelo artigo Cassius! Um ótimo estudo feito. Vamos aguardar agora os próximos artigos sobre o desempenho do Brasil né..rs
A partir de segunda feira, em três artigos escritos pelo colunista Rafael Rafic
Cassius,
Depois da série da semana que vem sobre o desempenho brasileiro, devo fazer uma coluna sobre o quadro de medalhas e dar a minha visão sobre o desempenho americano, que na minha humilde opinião é superestimado no quadro graças ao amplo domínio na natação.
Mas o que eu não posso deixar de discordar é quanto a sua avaliação dos voleis. No feminino a Servia foi vice campeã da Copa do Mundo de 2015 (quando os EUA foram 3º) e apresentou o melhor volei de toda a competição. Hoje para mim é indiscutível que Servia e China estão, ao menos pragmaticamente, um degrau acima do resto. Foram campeãs e vice da Copa do Mundo e repetiram o feito no Rio.
Quanto a masculina, creio que você não esteja acompanhando volei há algum tempo para dizer que os EUA tem equipe melhor que a Itália. A Itália jogou muito nos Jogos Olímpicos e só fraquejou perante a pressão da final. Ganhou dos EUA com autoriadadena 1ª fase e ganhou um jogo parelho nas semifinais, mesmo com a paçocada americana no 4º set.
Alias, a equipe de volei masculina americana não estava bem desde a Liga Mundial. A participação americana na LIga Mundial já fora errática e eles também não chegaram bem aos Jogos Olímpicos. A própria derrota para o Canadá por 3 a 0, uma seleção bem mais fraca do que o Brasil, França e Itália como as quartas de final demonstraram, na 1ª fase demonstrou que o time americano não estava bem.
De repente os EUA fazem um jogo brilhante contra o Brasil na 1ª fase e explodiu nos Jogos, mas como o próprio Brasil demonstrou em 2012, uma equipe errática nos Jogos Olímpicos sempre pode se complicar na 1ª dificuldade e foi exatamente o que ocorreu com os EUA na semifinal.
As derrotas dos EUA no volei eram até esperadas. Acho que maior supresa foi no volei de praia, quando uma das duplas masculinas sequer foi para a repescagem na 1ª fase e a outra teve um confronto antecipado contra Alisson e Bruno nas quartas. No feminino, Ross não é May, ponto.
Olá, Rafic.
Bem, aguardo ansiosamente seus posts; você certamente entende muito mais que eu, mero comentarista de resultado, rsrs.
De fato, a natação impulsiona sobremaneira o desempenho olímpico dos EUA; porém, mesmo com a exclusão da Rússia no atletismo (eu acho que nem tiraria tantos ouros, mas certamente reduziria o total geral), os resultados de forma geral foram bastante satisfatórios – vide os comparativos com edições anteriores, o aumento de modalidades com medalhas e algumas surpresas explicadas acima.
De todo modo, mesmo sem a natação, os EUA liderariam o quadro de medalhas. Além disso, foram impressionantes 19 ouros a mais que a Grã-Bretanha e 51 medalhas a mais que a China. Assim, me desculpe, mas se isso não é um desempenho fabuloso, não sei quando tivemos ou teremos algo similar na história recente. Outro ponto a se considerar é que não pode ser uma “culpa” se a natação “infla” os resultados: justamente por isso destaquei que os EUA conseguiram a supremacia na tríade que lhes favorece e também dá diversas medalhas. Por fim, ao menos pelos resultados dos últimos Mundiais, não se esperava esta performance assombrosa na natação, vide os títulos de Ervin, Manuels e Maya…
Quanto ao vôlei, no feminino era aguardada uma final Brasil x EUA, mas a China seria uma grande adversária e iria surpreender, até por ter escondido bastante o jogo previamente. O masculino, realmente, estava muito parelho e a Itália vinha superior nos Jogos. E na praia, concordo que o resultado final não foi uma “decepção”, tanto que coloquei que o azar da dupla foi enfrentar Ágatha e Bárbara nas semi e em noite inspirada – aquela poderia ser a final. No masculino foi isto mesmo: Dalhausser/Lucena também deram azar de cruzarem com Bruno e Alisson mais cedo – tanto que, após aquela vitória, fiquei convicto de que os brasileiros eram favoritos para o ouro.
Cassius,
Sem duvidas os EUA tiveram um desempenho muito bom, contra fatos não há argumentos. Mas deixemos assim: com a natação, foi um desempenho fabuloso. Sem na natação, fora apenas um desempenho muito bom que ainda foi mais ressaltado com a hecatombe chinesa.
Agora, por que a China caiu tanto? É um bom mistério. Tenho duas suspeitas, mas as deixarei para a coluna.