Fantasias desde 2019 tem sido um quesito altamente problemático, com julgamentos variando entre o errático, o ilógico e o desviante do Manual do Julgador. Porém, há alguma luz no fim do túnel, apesar de ainda termos problemas mais sérios em 2 cadernos. Este ano um julgador que sempre fora atento mas “atrapalhado”, com a experiência adquirida nos últimos julgamentos, trouxe um caderno de alto nível, nos dando a esperança de dias melhores nos próximos julgamentos de Fantasias.

Módulo 1

Julgadora: Regina Oliva

  • Império – 9,5 (concepção 4,8 e realização 4,7)
  • Grande Rio – 9,9 (realização 4,9)
  • Mocidade – 9,9 (realização 4,9)
  • U. da Tijuca – 9,9 (realização 4,9)
  • Salgueiro – 10
  • Mangueira – 10
  • Tuiuti – 9,9 (realização 4,8)
  • Portela – 9,8 (realização 4,8)
  • Vila Isabel – 10
  • Imperatriz – 9,9 (realização 4,9)
  • Beija-Flor – 10
  • Viradouro – 10

Tivemos mais um ano difícil da julgadora mais problemática da atual composição do júri. Para começar, apenas 2 décimos de concepção foram retirados da 1ª escola e mais nada. Ou seja, rumo a mais uma “fiscalização de erros”, aliás a única deste quesito neste ano. Mas nem isso foi feito de forma adequada mais uma vez por esta julgadora.

Assim que as justificativas foram divulgadas, Regina Oliva já dominou as conversas com a sua justificativa “original” para um dos diversos descontos dados ao Império Serrano. Segundo a julgadora, “não houve uniformidade na maneira de conduzir a alegoria de mão. Uns integrantes levaram a alegoria segurando pelas duas mãos, outros pela mão esquerda, outros pela mão direita. Visual da ala ficou prejudicado…” Isso teria ocorrido nas alas 1, 8, 18 e 19.

Essa justificativa para mim é inédita e sem sentido. Qual o problema de segurar o adereço de mão com a esquerda ou com a direita? Não há qualquer quebra de uniformidade no fato dos componentes segurarem o estandarte com mãos variadas a não ser em casos muito específicos, o que não era o caso de nenhuma das 4 alas citadas. Temos aqui mais um caso altamente polêmico para o longuíssimo histórico da Regina.

De resto ela apontou um sem fim de problemas para o Império, de forma que o 9,5 até se justifica. A nota em si é o menor dos problemas deste caderno.

O grande problema deste 9,5 do Império acaba sendo quanto à dosimetria comparada às outras escolas. Ela não deu nenhum 9,6 ou 9,7. Ou seja, para esta julgadora o Império apresentou um conjunto de fantasias 3 décimos inferior a todas as outras escolas e 4 décimos inferior as outras 10 das 12 escolas, já que ela também apenas deu uma nota 9,8.

Ainda em relação a dosimetria, é impossível deixar passar o 9,9 dado para a Mocidade. Esta nota é injustificável, mesmo considerando apenas o caderno desta julgadora. É quase consenso que Mocidade e Império apresentaram o pior conjunto de fantasias do Especial neste ano. Para corroborar esta afirmação, todos os outros 3 julgadores deram suas piores notas para ambas as escolas (mesmo que empatado no caso de um deles). A Mocidade apresentou inúmeros problemas tanto de concepção como de realização apontados pelos outros julgadores, mas esta julgadora apenas viu algumas saias arqueadas nas baianas. Por isso deu esse 9,9 totalmente fora da curva.

Mais uma vez, também faltou o mínimo de bom senso em relação a problemas isolados, como já havia faltado ano passado. Como já escrevi, neste quesito é comum, até por justiça, que os julgadores relevem algum microproblema se ele vier isolado no conjunto da escola. O velho bom-senso, qualidade primordial de qualquer bom julgador, pede para que se evite penalizar em um conjunto de 20 e tantas fantasias reproduzidas milhares de vezes algumas pequenas “rebimbocas da parafuseta” que em pouco ou nada comprometeram o conjunto da escola.

Não obstante, sobraram justificativas desta julgadora em que o problema estava não apenas em uma ala somente, mas em apenas um ou dois componentes de uma ala. Por exemplo, na Grande Rio ela descontou o fato de apenas três baianas estarem com saias mais curtas e que um mísero componente do grupo de mestre-salas mirins estava descalço.

Na Unidos da Tijuca ela apontou que apenas dois integrantes da ala 11 estavam com adereços faltantes na saia e que um mísero integrante estava arrastando o sapato como se fosse chinelo.

Já no Tuiuti, um mísero integrante da ala 3 estava com pintura azul enquanto o resto da ala estava sem maquiagem, outra mísera integrante da ala 7 estava com sapato de cor diferente e na ala 25, três componentes estavam com adereços de pernas se arrastando. E por causa de meros cinco componentes em uma escola com duas mil fantasias lá se foi um décimo. Completa falta de bom-senso.

Depois dessa eu nem falarei do décimo retirado da Imperatriz pelo comprimento curto das saias das baianas…

Ou seja, mais um julgamento muito mal feito por esta julgadora. Só para relembrar, repasso aqui a lista das justificativas mais inacreditáveis dadas por esta julgadora na história da Justificando:

  • Beija-Flor em punida 2016 por falta de referência ao Direito em uma fantasia com uma balança quase do tamanho do corpo no costeiro e pela “falta de referência a ABL” no poeta imortal quando a ABL nem sonhava ainda em existir.  
  • Salgueiro 2016 estava muito vermelho e branco.
  • São Clemente 2017 por “falta de referência a atriz” quando a fantasia em si era a roupa de uma atriz do sec. XVII.
  • Mocidade 2019 por não saber que o Banco Mundial de Sementes fica na Noruega, uma informação que estava na descrição da Fantasia no Livro Abre-Alas.
  • Tijuca 2020 porque os escravos “estariam melhor representados sem alguma parte do traje” desconhecendo completamente a vestimenta de panos da costa típica de escravos de ganho dos sec. XVIII e XIX.
  • Tijuca 2022, o famoso “palhaço-arara”. A julgadora se confundiu entre as alas 17 da Tijuca e da Grande Rio e caneta que o palhaço da Tijuca na ala 17 parecia uma arara. Só que a ala 17 da Tijuca realmente era uma arara, o palhaço era a ala 17 da Grande Rio, a escola seguinte a desfilar.
  • Mangueira 2022 estava muito verde e rosa.

Depois de todo o relatado apenas posso finalizar os comentários deste caderno afirmando mais uma vez que já passou da hora de haver uma troca neste posto no corpo de julgadores. Ela individualmente coloca em xeque todo o esforço do coletivo dos julgadores em fazer um trabalho correto.

Módulo 2

Julgador: Wagner Louza

  • Império – 9,7 (realização 4,7)
  • Grande Rio – 10
  • Mocidade – 9,5 (concepção 4,7 e realização 4,8)
  • U. da Tijuca – 10
  • Salgueiro – 9.8 (concepção 4,9 e realização 4,9)
  • Mangueira – 10
  • Tuiuti – 9,8 (realização 4,8))
  • Portela – 9,8 (concepção 4,8)
  • Vila Isabel – 10
  • Imperatriz – 10
  • Beija-Flor – 9,9 (realização 4,9)
  • Viradouro -10

Precisamos reconhecer quando um julgador “muda de patamar” e creio que isso tenha ocorrido com Wagner neste ano.

Em seu terceiro ano ele fez seu melhor julgamento. Soube julgar concepção e realização, claramente estudou o Livro Abre-Alas, deu notas coerentes e bem justificadas. Mas principalmente, fez um ótimo trabalho de dosimetria, justamente o que havia sido seu ponto fraco nos dois primeiros anos. Inclusive, ele teve a coragem de dar duas notas duras para os dois piores conjuntos de fantasias do ano, um 9,5 para a Mocidade e um 9,6 para o Império, ambas muito bem justificadas.

Ainda não posso dizer que foi um caderno perfeito porque acredito que ele tenha cometido um pecado ao escrever sobre a tradicional ala das damas da Portela.

Wagner fez um ótimo trabalho de procurar identificar nas fantasias traços que marcam as indumentárias das épocas propostas pelas escolas, como ficou evidente na justificativa do Salgueiro mais a frente. Porém esse ótimo ponto de avaliação, aliado ao que me pareceu ser um desconhecimento da tradicional ala das damas da Portela e sua indumentária clássica de chapéu e sombrinha fez com que ele despontuasse o fato de que a fantasia representava um figurino do séc. XIX e não “La Belle Epoque” da inauguração da Av. Central. 

Aqui acho que um maior conhecimento da tradição da ala das damas e uma natural tolerância com a carnavalização das indumentárias, ainda mais de ala tão histórica, faria com que o julgador aceitasse a fantasia proposta.

A favor do julgador, é importante reforçar que tal explicação sobre a ala das damas não está no Livro Abre-Alas, mas, como sempre reitero, é importante o julgador conhecer por dentro a festa, seus rituais, seus significados, simbologia e tradições. São certas coisas que o mero estudo para o julgamento não explica, mas é um conhecimento necessário para um bom julgamento. Fica a dica.

Outro ponto interessante deste caderno e que foi muito bem avaliado pelo julgador foi a completa falta de criatividade do Império que se utilizou da mesma solução plástica em várias alas, muitas delas sequenciadas. Isso é um claro problema e realmente precisa ser despontado. Como diria Cid Carvalho virou “o indígena azul, o laranja, o verde, o vermelho.”.

Porém a questão suscitada por uma justificativa dessas é se ela deveria se encaixar em concepção, por falta de criatividade na criação das indumentárias, ou em realização, pela impressão causada pelas formas, utilização, exploração e distribuição de cores e materiais. 

Já comentei no ano passado que as duas possibilidades existem e acho que isso precisaria ser padronizado pela LIESA. No caso, Wagner colocou em realização, mas há exemplos anteriores de outros julgadores dessa justificativa ser encaixada em concepção.

Finalizando, eu queria aqui reproduzir a justificativa dele em concepção para o Salgueiro que resume o trabalho de pesquisa e avaliação de adaptação histórica das indumentárias: “Alas 03, 04, 05, 06, 07 e 08, foi dito no Livro Abre-Alas (p.356) que os figurinos do setor 2 seriam inspirados nas cortes europeias com uma referência ao “período medieval”. No entanto as fantasias apresentavam referências do final do sec. XVII. A única fantasia com referência ao período medieval estava na ala 09 ‘Ira'”.

Espero que o Wagner mantenha esse alto nível de julgamento nos próximos anos porque este quesito sofreu demais com julgamentos malfeitos desde 2019 e essa melhora é muito bem vinda.

Módulo 3

Julgador: Sergio Henrique da Silva

  • Império – 9,8 (concepção 4,9 e realização 4,9)
  • Grande Rio – 9,9 (realização 4,9)
  • Mocidade – 9,6 (concepção 4,8 e realização 4,8)
  • U. da Tijuca – 10
  • Salgueiro – 10
  • Mangueira – 10
  • Tuiuti – 9,9 (realização 4,9)
  • Portela – 10
  • Vila Isabel – 10
  • Imperatriz – 10
  • Beija-Flor – 10
  • Viradouro – 10

Terceiro ano do julgador e terceiro caderno altamente problemático. Inicialmente, as oito notas 10, dois terços das escolas, já saltam aos olhos. Não houve um apuro enorme de conjuntos de fantasias a ponto de justificar tantas notas 10. Ainda assim, nesse mar de notas 10, ainda sobrou um 9,9 para a Grande Rio difícil de defender considerando algumas das notas 10 constantes neste caderno.

Não bastasse ter apenas 4 justificativas escritas, algumas delas simplesmente são de difícil ou impossível compreensão do problema. Por exemplo, no Império ele escreveu “Alas 4 e 12, opção foi a falta de adequação ao tema”. Por mais que tentemos compreender que a justificativa correta é que a fantasia não se adequou ao tema proposto, faltou explicar os motivos para a falta de adequação, de forma que Sérgio acaba caindo, como tem sido característico dele, na cilada da justificativa genérica. Ele ainda arremata dizendo que “as alas 5, 6 e 8 não ocorreu significado ao homenageado, dificultando o entendimento”. Outra justificativa genérica, por que o entendimento ficou dificultado? O julgador não explica. Vou até mais longe, diria que o julgador não entendeu o recorte do enredo, que não era homenagear apenas o Arlindo, mas mostrar lugares importantes na carreira dele.

Já na Grande Rio, a justificativa discorre que “Embora estava plasticamente muito bom, a apresentação das personagens ficou cenicamente poluída. Poderia ter ficado mais clara se as personagens tivessem destaque e não agrupamento, perdendo o encanto da apresentação”. 

Quais personagens ficaram cenicamente poluídas? E o que causou essa poluição? Em que alas ou setores da escola isso ocorreu? O julgador simplesmente não explica, o que, além de tornar a justificativa incompreensível, mais uma vez resvala na justificativa genérica, que tem como resultado passar a impressão que o julgador “tirou ponto porque quis, sem motivo razoável”. Essa justificativa especificamente foi altamente complicada porque fica até difícil avaliá-la do ponto de vista da dosimetria, já que não há qualquer parâmetro para delimitar a extensão do erro para fazer tal avaliação. 

Obs: a própria redação dessa justificativa é bastante truncada, com pontos finais quando deveriam ser vírgulas, erros de concordância, entre outros. Porém eu mantive o padrão que estou seguindo em toda a série desse ano e acertando quando possível esses problemas nas citações literais das justificativas. Ainda sim, em alguns momentos eu não consegui uma solução satisfatória para os textos deste caderno.

Continuando as justificativas incompreensíveis ou genéricas, chegamos na Mocidade. Aqui em concepção ele escreveu “Ala 1 a opção de levar os adereços de mão e cabeça. Dificultando a leitura”. Eu ainda tentei uma forma de melhorar a escrita na citação, mas não consegui. Por que os adereços de mão e cabeça dificultaram a leitura dessa ala? Também não há qualquer explicação. Além disso, essa ala era composta de 5 figurinos diferentes, todos eles tiveram sua leitura dificultada? Por que? A justificativa simplesmente não explica.

Ainda na concepção da Mocidade, ele arremata escrevendo “Alas 6 e 7: faltou adequação ao tema.” Por que? Mais uma justificativa genérica, sem maiores explicações.

Pior, mesmo tendo apenas 4 justificativas escritas e uma delas sem possibilidades de avaliação quanto à dosimetria, ainda sim o julgador na minha visão teve problemas na dosimetria. Olhem os dois motivos apontados para a justificativa de concepção do Império e depois olhem os dois motivos apontados para a concepção da Mocidade. São similares tanto em quantidade como em gravidade, certo? Então por que ele tirou apenas 1 décimo do Império e 2 décimos da Mocidade? Para mim, erro claro de dosimetria.

Ou seja, uma infinidade de problemas em um caderno que continha justificativas para apenas 4 escolas. Infelizmente, não posso dizer que foi um bom trabalho do julgador, muito pelo contrário. É o terceiro desfile de Sérgio como julgador e pela terceira vez ele apresenta um trabalho altamente problemático, sem qualquer melhora aparente. Por mais paciência que tenhamos com julgadores novos, acredito que já teria dado tempo deste julgador apresentar alguma subida de nível, como ocorreu com seu colega do módulo acima, que entrou para o júri no mesmo momento. Talvez seja hora de pensar em uma substituição aqui.

 Módulo 4

Julgador: Paulo Paradela

  • Império – 9,8 (realização 4,8)
  • Grande Rio – 9,9 (concepção 4,9)
  • Mocidade – 9,7 (concepção 4,7)
  • U. da Tijuca – 9,8 (concepção 4,9 e realização 4,9)
  • Salgueiro – 10
  • Mangueira – 10
  • Tuiuti – 9,7 (concepção 4,9 e realização 4,8)
  • Portela – 9,9 (realização 4,9)
  • Vila Isabel – 10
  • Imperatriz – 10
  • Beija-Flor – 9,8 (concepção 4,8)
  • Viradouro – 10

Paradela mostrou mais uma vez porque o considero o melhor julgador do quesito e um dos melhores no geral. Extremamente atento, com justificativas bastante claras e de difícil contestação mesmo com aqueles textos extensos como lhe é característico. Este ano ele usou duas folhas de verso além dos espaços para as observações gerais.

Por mais um ano, Paradela soube avaliar com critério tanto a concepção como a realização, sendo o julgador que mais se preocupou com a função da fantasia de representar diversas partes do enredo, um ponto central nos critérios de julgamento de Fantasias. Ele despontuou Império, Grande Rio, Mocidade e Tuiuti corretamente por falhas aqui.

Além disso, ele manteve seu olhar bastante atento para os problemas de acabamento de fantasias, ainda mais estando no último módulo, onde naturalmente isso se acentua após o desfilante passar por quase toda a pista.

A dosimetria também foi impecável, sendo que como já de costume, Paradela muitas vezes junta dois ou três problemas pequenos para tirar um décimo. Afinal, como ele é bastante criterioso, sempre há uma quantidade razoável de problemas apontados para cada escola, especialmente em relação a acabamento quando se trata do último módulo.

Outro caderno excelente deste julgador.

Recomendações para a LIESA em Fantasias:

  • Rediscutir a subdivisão do quesito em concepção e realização, tendo em vista que tal divisão muitas vezes dificulta a dosimetria do julgador e para evitar de dar notas mais baixas do que o inicialmente pensado, alguns julgadores estão literalmente ignorando os subquesitos em algumas justificativas.
  • Clarificar no Manual do Julgador, no quesito Fantasias, se a despontuação por soluções similares em alas deverá ocorrer em concepção, por falta de criatividade, ou em realização, pela impressão causada pelas formas e cores.
  • Permitir a utilização do critério comparativo nas justificativas, desde que o julgador deixe claro o que “faltou” na comparação das escolas que perderam ponto em relação às que receberam 10, com exemplos se possível.
  • Clarificar no Manual do Julgador se uma escola deve ser descontada por “falta de tempo necessário para avaliar” a ala em virtude de uma evolução acelerada da escola.
  • Clarificar no Manual do Julgador que deverá haver maior complacência com o excesso de cores da própria escola.