O julgamento do quesito Mestre-Sala e Porta-Bandeira foi alvo de algumas polêmicas este ano, injustas na minha opinião como escreverei na coluna de hoje. Aliás, é importante lembrar que este quesito, defendido em apenas 2 ou 3min por cabine por apenas duas pessoas, tem o mesmo peso na apuração do que todo um conjunto de ricas e caras alegorias ou fantasias.

Módulo 1

Julgador: Paulo Rodrigues

  • Império – 9,8
  • Grande Rio – 10
  • Mocidade – 10
  • U. da Tijuca – 10
  • Salgueiro – 10
  • Mangueira – 9,9
  • Tuiuti – 9,9
  • Portela – 10
  • Vila Isabel – 9,9 
  • Imperatriz – 9,9
  • Beija-Flor – 10
  • Viradouro – 10

Paulo tem por hábito escrever bastante e acredito que os motivos dos descontos dados por ele tenham ficado claros mais uma vez para os casais.

Apesar disso, acredito que neste ano ele entrou em uma polêmica por mera falta de explicação, ao mesmo tempo que omitiu alguns fatos relevantes de sua justificativa, o que em minha visão acabou embaralhando um pouco tanto a própria dosimetria do caderno como a comunicação dele com o público em geral.

Começo aqui com a justificativa da “muita intensidade e vigor” para o casal da Mangueira. Eu assisti o desfile embaixo da cabine deste julgador e entendi sua justificativa. Todos sabemos do estilo único deste casal, diferente de tudo que estamos acostumados. Mas, um dos fundamentos da dança do mestre-sala e da porta-bandeira é demonstrar leveza, tranquilidade e, principalmente, cuidado com o símbolo maior da escola que é o pavilhão. Por isso, por mais intensidade que se coloque na dança, ela não pode parecer brusca. Em alguns momentos, nesse módulo, foi exatamente essa a impressão que me passou. Especialmente durante a longa 1a pegada do Matheus no pavilhão houve uma puxada muito brusca nele já no fundo da pista, deu a impressão que ele ia rasgar,

Podem dizer que é excesso de balé, que a culpa é de um júri formado por egressos do Theatro Municipal, mas eu tenho certeza que qualquer ex porta bandeira ou outra pessoa com conhecimento da dança do casal daria o mesmo desconto. Nesse ponto, o Theatro Municipal não tem culpa no meu entender.

Por isso eu acho que faltou palavras ao julgador aqui. Como ele não explicou essas minúcias acima, acabou criando uma interpretação errônea no público que interpretou essa menção ao vigor como um preconceito, seja racial ou contra uma dança mais popular.

Por outro lado, em relação ao Império, por mais que ele tenha relatado a óbvia lentidão e a falta de repertório da dança visto por todos, ele omitiu a gravíssima enrolada de bandeira no meio do giro que perdurou por tempo considerável.

Resultado, você olha a justificativa do Império e da Mangueira e não entende porque a primeira recebeu 9.8 e a outra 9.9, afinal, pensando apenas na justificativa escrita pelo julgador, os problemas ocorridos parecem de intensidade próximas (no caso da Mangueira ainda teve um desequilíbrio do Matheus).

Agora, comparem a justificativa dele para Império e Mangueira dos outros três 9,9. Essas últimas parecem de outro patamar superior. Dessa forma creio que aqui também faltou uma prateleira. Tivesse o julgador a coragem de dar o 9,7 para o Império, como outros julgadores tiveram, talvez ele tivesse espaço para dar 9,8 para Mangueira, manter os 9,9 e ter uma dosimetria mais coerente com suas próprias justificativas.

Mas são detalhes pequenos e Paulo tem ótimo histórico.

Por fim, houve pequenas reclamações às indumentárias de porta-bandeira de Império e Imperatriz, mas não me pareceu que elas sozinhas foram causadoras de perdas de décimo.

Módulo 2

Julgador: Fernando Bersot

  • Império – 9,8
  • Grande Rio – 10
  • Mocidade – 10
  • U. da Tijuca – 10
  • Salgueiro – 10
  • Mangueira – 9,9
  • Tuiuti – 10
  • Portela – 10
  • Vila Isabel – 9,9 
  • Imperatriz – 10
  • Beija-Flor – 10
  • Viradouro – 9,9

Bersot foi o único julgador estreante dentre todos os 36 julgadores deste ano. Talvez isso ajude explicar as oito notas 10 e apenas um mísero 9,8. Ainda sim, acredito que o julgador, além de criar a coragem de ter mais rigor na avaliação, o que muitas vezes vem com a experiência, precisa ficar mais atento com a escrita das justificativas, que ou não refletiram o ocorrido na pista ou em alguns casos poderiam ser mais detalhadas quanto aos problemas percebidos.

Inicialmente, apenas pelo que o julgador escreveu na justificativa, nem o 9,8 do Império se justifica por si. Ele apenas escreveu que “a indumentária parecia estar pesada e impossibilitando alguns movimentos da porta-bandeira -1. Faltou integração, troca de olhar e energia -1.”. Fiquei com a impressão de ter ficado vago demais para voarem dois décimos, mesmo que saibamos os reais motivos da nota, como bem pontuados na justificativa mais longa de seu colega de cabine dupla. Porém, não houve nenhuma palavra sobre a bandeira enrolada também.

Para a Mangueira, o décimo foi justificado no desequilíbrio do Matheus. Já na Vila, “Percebi um pouco de tensão com a troca da indumentária, o que tornou o início da apresentação um pouco nervoso.” no que, creio, seja a maior indefinição deste caderno. Perfeito, o casal passou a impressão de nervosismo com a troca da indumentária. Mas qual foi o real prejuízo para a apresentação que tal “tensão” percebida causou? Faltou explicar. Da forma curta como está escrito em algo tão subjetivo, pode passar a impressão do “tirei ponto porque quis”. Uma recomendação ao julgador para o futuro é ser mais detalhado para evitar possíveis críticas. A justificativa é a principal defesa, talvez a única na atual dinâmica, do trabalho de julgamento efetuado.

Por fim, na Viradouro ele escreveu: “poderia ter explorado um pouco mais a coreografia e deslocamentos no espaço”. Justamente pela falta de explicação, a impressão que pode passar é a do “eu acho que seria melhor assim”. Acredito que o julgador faria uma comunicação mais efetiva se explicasse com mais detalhes o que ele sentiu falta na coreografia (faltaram passos mais maior dificuldade de execução? Muitos momentos de pausa na apresentação?) e principalmente explicar os efeitos causados na apresentação da tal falta de deslocamento no espaço.

Espero que com a experiência adquirida com os desfiles acumulados, Bersot consiga dar o salto de qualidade que outros julgadores com estreias atrapalhadas tiveram e hoje são ótimos julgadores.

Em suas considerações finais o julgador aconselhou os casais a ficarem mais atentos às finalizações dos movimentos mais técnicos, explorar mais os espaço e diagonais, não ficando presos ao meio e a profundidade e manter o “olhar mais um no outro”.

Módulo 3

Julgador: João Wlamir

  • Império – 9,7
  • Grande Rio – 10
  • Mocidade – 10
  • U. da Tijuca – 9,8
  • Salgueiro – 10
  • Mangueira – 9,9
  • Tuiuti – 9,9
  • Portela – 9,8
  • Vila Isabel – 10
  • Imperatriz – 10
  • Beija-Flor – 9,9
  • Viradouro – 10

Wlamir tem a característica de ser rápido e direto nas justificativas, ao mesmo tempo que consegue passar exatamente os problemas percebidos.

Foi outro julgador que recebeu as mesmas críticas do módulo 1 por causa do uso da expressão “excesso de vigor” para o casal da Mangueira. Porém, considero tais críticas imerecidas. Wlamir escreveu com perfeição de detalhes o ocorrido, exatamente nas linhas do que escrevi acima. O excesso de intensidade e toda a apresentação prejudicou a cênica da apresentação nos momentos em que o casal deveria demonstrar mais leveza e simpatia como nos cumprimentos e nos movimentos típicos da dança. (ou no jargão do meio, meneios e mesuras, exatamente as palavras usadas pelo julgador). Essa é sim uma falha passível de desconto conforme os critérios de julgamento do Manual do Julgador.

Talvez a única justificativa de Wlamir que realmente possa criar alguma discussão é a da Beija-Flor na qual ele acaba apelando para o sempre polêmico “houve falta de ousadia e criatividade”, o que sempre nos deixa na dúvida do que exatamente o julgador sentiu falta, por mais que ele tenha complementado neste caso com “bem como agilizar a dinâmica do bailado”, dando a entender que penalizou o que seria uma certa lentidão do casal.

Em relação às indumentárias também ele retirou  décimo do figurino das porta-bandeiras de  Império, por saia curta demais, e da Unidos da Tijuca, por falta de volume e impacto visual. Além, é claro, da já famosa queda da peruca da Lucinha Nobre durante a apresentação da Portela.

Quanto à dosimetria, nada a acrescentar em mais um ótimo trabalho para o histórico deste bom julgador.

Em suas considerações finais, Wlamir fez algumas recomendações que tento apresentá-las em síntese: 

  • Que os casais trabalhem mais as diferentes dinâmicas no bailado, pois alguns casais na empolgação não dão valor às diferentes dinâmicas de cada movimento
  • Necessidade de explorar mais a criatividade de passos e sua forma de executá-los. nesse ponto ele ressaltou o bom trabalho de adaptação de alguns passos ao enredo proposto.
  • Cuidar mais dos figurinos, desde o comprimento até o volume passando pela firmeza dos sapatos e perucas (as palavras são do próprio julgador), bem como a riqueza artística e criatividade do mesmo.
  • Equilíbrio de emoções e dinâmicas iguais do casal, independente da idade ou experiência do parceiro ou parceira.

Módulo 4

Julgadora: Mônica Barbosa

  • Império – 9,7
  • Grande Rio – 9,9
  • Mocidade – 9,8
  • U. da Tijuca – 9,9
  • Salgueiro – 10
  • Mangueira – 10
  • Tuiuti – 10
  • Portela – 9,9
  • Vila Isabel – 10
  • Imperatriz – 10
  • Beija-Flor – 10
  • Viradouro – 10

Mônica como sempre foi muito clara nas suas justificativas, mas considerando seu caderno, tivemos apresentações excelentes no módulo 4. Salvo uma “coreografia pouco linear” no Império e uma justificativa mais detalhada para a Mocidade, com cansaço do mestre-sala impactando negativamente a apresentação, deixando a coreografia confusa e parando de dançar nas ligações e contrastando com a energia da porta-bandeira, todos os outros descontos foram por causa de indumentária.

Como lembrado na live no YouTube, isso pode ser causado por uma maior tranquilidade para a apresentação neste módulo. Com apenas 70min de desfile, enquanto nos primeiros módulos a escola está em ritmo acelerado, correndo para ocupar a avenida e com uma bateria mais acelerada, no último módulo a própria evolução da escola pede algo mais cadenciado para dar tempo de manobrar alegorias e bateria já entrou na pista reduzindo um pouco o andamento do samba. Talvez essa diferença de “ambiente” possa ter ajudado as apresentações a se saírem melhores.

Inclusive ficou a impressão de um raro desconto de dois décimos por indumentária para o Império, tanto pela saia curta como pelo corpete que limitava os movimentos.

Na Grande Rio e na Tijuca partes da fantasia caíram durante a apresentação e na Portela o desconto foi pela falta da peruca que havia caído no módulo anterior.

Recomendações para a LIESA em Mestre-Sala e Porta-Bandeira:

  • Permitir a utilização do critério comparativo nas justificativas, desde que o julgador deixe claro o que “faltou” na comparação das escolas que perderam ponto em relação às que receberam 10, com exemplos se possível. Isso talvez facilite o trabalho de julgamento das concepções coreográficas.
  • Debater melhor com os casais a questão da avaliação das coreografias na dança
  • Testar a inclusão de julgadores com experiência mais focada em dança popular para mesclar o júri.

 

[N.do.E.: conforme expliquei no vídeo, acredito que houve uma escolha infeliz de vocabulário nas justificativas dos módulos 1 e 3 e por isso passou a impressão de racismo para o grande público. Pedro Migão]