Mais uma quarta feira e mais uma coluna “Formaturas, Batizados & Afins”, assinada pelo Professor de Biofísica Marcelo Einicker Lamas.
Sem delongas, leiamos o texto, com alguns alertas importantes.
Cuidados com o nosso Meio Ambiente
“Caros amigos, nesta semana histórica quando o País escolheu democraticamente pela primeira vez uma mulher para comandar nosso destino – Dilma Vana Rousseff – esta coluna vem tratando de um tema que infelizmente não foi tão apropriadamente discutido durante toda campanha eleitoral. 
Nem mesmo a candidata do Partido Verde, Marina Silva, conseguiu chamar a atenção para este ponto, visto que por razões históricas de sua trajetória política queria fazer ver aos eleitores que ela tinha algo além de uma ligação forte com a preservação do meio ambiente. O fato é que nossa Presidente Dilma terá nestes quatro anos alguns desafios nesta área, desafios estes que devem ser encarados por toda sociedade; para que possamos minimizar as agressões ao meio ambiente e assim as catástrofes que tendem a acontecer pelas alterações impostas ao nosso Planeta, o que, aliás, também já foi discutido aqui nesta coluna.
Trago também este tema à tona, pois na semana passada, tive a oportunidade de participar em Arraial do Cabo (foto) de um encontro científico voltado à discussão dos problemas ambientais e que foi extremamente rico. A Primeira Escola Internacional em Ecologia e Ecotoxicologia Marinha não era simplesmente um fórum de discussão técnica sobre meio ambiente, mas também era um curso de treinamento em ciência. Uma disciplina compacta usando os problemas ambientais do ambiente marinho como ponto de partida e de chegada para o debate de diferentes aspectos da atividade científica, fundamentais para a formação do cientista moderno. Fui convidado pelo Prof. Mauro de Freitas Rebelo (UFRJ), coordenador do evento, para coordenar duas sessões muito diversificadas sobre diferentes causas de poluição ambiental e de que maneira diferentes grupos de pesquisa estão monitorando estas agressões ao ambiente. Estas apresentações foram feitas por estudantes de iniciação científica, mestrado, doutorado, pós doutorado e professores recém contratados em diferentes instituições. 
Foi realmente um momento muito especial para mim, que comecei minha vida científica em 1989 justamente estudando o problema da contaminação dos reservatórios de água da Cidade do Rio de Janeiro por cádmio, um metal pesado muito usado em diferentes indústrias como as de tintas e de baterias e pilhas. Durante todo o meu Mestrado (1992-1994), era este o tema central de minha vida científica: a poluição ambiental e suas conseqüências para as células, tema que talvez tenha tido naquela época uma enorme difusão devido a reunião histórica realizada no Rio de Janeiro em 1992, a Rio Eco 92. Assim, já se passavam mais de 5 anos desde que estive num evento inteiramente dedicado ao meio ambiente, o que de certa forma foi muito agradável (por eu gostar muito do assunto), mas ao mesmo tempo muito assustador, por ver que aqueles problemas que estavam na moda durante o período do meu mestrado seguem persistentes e em alguns casos até pioraram.
Um problema de todo o mundo
O meio ambiente não deve ser apenas cuidado aqui no nosso Brasil, mas sim em todo o mundo. Sabemos que alguns países que hoje cobram de países em desenvolvimento como China e Brasil ações enérgicas na preservação de ecossistemas, destruíram tudo ou quase tudo que havia de biodiversidade em seus países à custa do desenvolvimento. Assim, cobram ações quando eles próprios devastaram seus territórios. 
Neste evento que estive em Arraial do Cabo a grande maioria de participantes era de outros países. Estavam lá presentes pesquisadores do México, Uruguai, Colômbia, Chile, Portugal, Finlândia, Suécia, Sérvia, Estados Unidos, Itália e China. Do Brasil, pesquisadores da Universidade Federal do Rio de Janeiro, que foram os organizadores do evento, além de pesquisadores da PUC-RJ, Federal de Santa Catarina (UFSC), do Ceará (UFCE), de São Paulo (USP, USP-Ribeirão Preto, UNESP), do Rio Grande do Sul (UFRG) e de Pernambuco (UFRPE). Dentre os conferencistas as presenças destacadas do Dr. John Stegeman de Whoodshole-EUA, com grande atuação na área ambiental tanto por suas pesquisas como por suas ações junto a entidades de preservação mundo afora; a sueca Malin Celander, uma especialista em vida marinha e problemas ambientais que atingem esta biota; e o Dr. Francesco Dondero de Piemonte, Itália com seus estudos em biologia molecular de organismos marinhos, na busca de marcadores moleculares para agressões ambientais. 
Pelo Brasil, além de mim, o Prof. Mauro Freitas Rebelo (UFRJ) que foi o organizador e grande nome do evento por além de sua parte científica, ter dedicado parte da programação a aulas que sem sombra de dúvida enriqueceram os participantes. Aulas estas voltadas para esclarecer o que é uma boa pergunta científica, como abordar e investigar esta pergunta e também algumas aulas dedicadas a como escrever um texto científico ou de divulgação de forma clara e que permita a transmissão do conhecimento para pessoas leigas, por exemplo, sempre tendo o meio ambiente e a ecologia como pano de fundo. 
Pela audiência fica claro que o tema é importante em todas as partes do mundo, não apenas em países em desenvolvimento como os da América Latina, mas também nos países desenvolvidos e com excelente qualidade de vida como Suécia e Finlândia.
Os destaques
No evento, ficou clara a necessidade de se buscar indicadores precoces de poluição ambiental, os chamados bioindicadores. Normalmente tratam-se de proteínas ou peptídeos que são expressos por organismos submetidos a algum agente tóxico, seja um composto químico como um agrotóxico, ou um metal pesado como o cádmio já falado mais acima. 
As células do organismo produzem estas proteínas para tentar se livrar da ação tóxica dos poluentes e assim seguir vivendo mesmo na presença daquele agente externo. Entender os mecanismos que induzem a formação destas proteínas e também identificá-las de forma precoce podem ser boas ferramentas para identificar problemas ambientais e cessá-los a tempo de um estrago maior. Foram apresentados resultados deste tema praticamente por todos os participantes, o que mostra a relevância do assunto.
Outro destaque foi a conferência do Prof. João Paulo Machado Torres (UFRJ), que mostrou algumas falhas na forma que a política de cuidados com o meio ambiente vem sendo conduzida no Brasil, principalmente na regulamentação de uso e depósitos de rejeitos químicos. O Prof. João Paulo mostrou áreas onde funcionaram fábricas de agrotóxicos ou onde existiam depósitos de rejeitos destas indústrias e que estavam isolados apenas por cercas pouco restritivas ou mesmo simplesmente sinalizados por placas de perigo.
Algumas imagens mostradas pelo Prof. João Paulo, traziam tambores metálicos amontoados em áreas a céu aberto onde estão já a mais de uma década! É fácil imaginar a condição estrutural destes tambores. Muitos estão completamente deteriorados e enferrujados, deixando claramente vazar os seus conteúdos tóxicos que podem ser carreados por ventos e pela água da chuva atingindo áreas vizinhas onde irão contaminar a fauna e a flora, além é claro de provocarem doenças na população que mora nestas cercanias. Isso sem falar na contaminação dos corpos d’água à medida que estes compostos tóxicos são carreados pela água das chuvas para nascentes e lençóis freáticos e mesmo para rios e lagoas, poluindo e devastando estes ecosistemas. Ainda é muito frágil a legislação ambiental no Brasil e ainda é muito incipiente a fiscalização por parte das autoridades competentes. 
Um destes compostos tóxicos é o conhecido óleo ascarel, que foi muito utilizado como combustível em transformadores de energia, destes que encontramos presos aos postes de cidades por todo o Brasil. O uso do ascarel foi proibido por este ser considerado tóxico e cancerígeno; no entanto não existe muito cuidado com os depósitos para onde foram levadas toneladas desta substância, e mesmo não se tem notícia de onde podem estar outras tantas toneladas que muito provavelmente foram descartadas de forma inapropriada por aí. 
O mesmo vale para produtos químicos que eram usados como agrotóxicos e que foram proibidos pelas autoridades sanitárias, mas que da mesma forma, não tiveram regulamentada a forma de descarte e mesmo de estocagem o que constitui um enorme perigo ao meio ambiente.
Outra apresentação bastante interessante foi feita pelo Dr Marlon Fonseca (UFRJ e UNIR). O Dr. Marlon é um médico que se dedica ao estudo das comunidades ribeirinhas na Amazônia, com destaque para aquelas na região do lago Puruzinho. É sabido que toda região amazônica sofreu com a corrida do ouro nos anos 80, e que por conta disso muitos rios e terrenos foram contaminados com mercúrio, um metal pesado utilizado pelos garimpeiros para separar as partículas de ouro dos sedimentos de rios e barrancos. 
O mercúrio é extremamente tóxico e no ambiente pode ser convertido ou organificado em metil-mercúrio que é ainda mais tóxico que o mercúrio metálico. Assim organismos como peixes e algas incorporam e acumulam mercúrio e metil-mercúrio, que acabam chegando ao homem através da ingestão deste peixe contaminado. Uma das ações tóxicas mais conhecidas do mercúrio é sobre as células do sistema nervoso, o que pode acarretar em problemas neurológicos graves. Estes são o objeto de estudo do Dr. Marlon. 
Curiosamente, na amostra de indivíduos pesquisada, o Dr Marlon não observou qualquer sequela naquela população que pudesse ser associada a exposição ao mercúrio. É fácil ver homens e jovens se equilibrando em canoas primitivas para a pesca, que é realizada por uma espécie de arpão lançado por estes pescadores. Ou seja, uma pessoa com problemas neurológicos jamais conseguiria se equilibrar naquelas canoas e mesmo arpoar o peixe com uso da força dos braços isso sem considerar a acuidade visual de enxergar a presa naquela água escura. 
Um dos motivos para esta falta de correlação entre a alta incidência de mercúrio na região e as poucas sequelas encontradas pode se dever a alimentação dos ribeirinhos, que não apenas tem o peixe como elemento principal, mas também conta com muitas frutas e raízes da região. Já foi comprovado em estudos que estas frutas e raízes apresentam grandes quantidades de substâncias antioxidantes, que estariam atuando na proteção destes organismos à exposição ao mercúrio e a outros metais. 
Um destes antioxidantes é o selênio, que normalmente é encontrado em baixíssimas concentrações nos alimentos em geral, mas que se encontra enriquecido em determinados frutos amazônicos. Desta forma, a própria natureza degradada e agredida estaria de alguma forma, contrabalançando esta agressão e permitindo que os ribeirinhos tenham uma vida normal.
As iniciativas contra a destruição do meio ambiente
O desenvolvimento sustentável é o modelo que permitirá desenvolver regiões como a Amazônia, sem que isso signifique destruição de ecosistemas. É preciso, no entanto que a  população esteja sempre alerta para as ações que podem vir a destruir o meio ambiente e por em risco toda uma região. Não nos faltam exemplos para isso. 
Barragens de indústrias para conter rejeitos tóxicos que podem romper como o que aconteceu aqui no Brasil em Minas Gerais e mais recentemente na Hungria – onde cidades inteiras foram alagadas com produtos tóxicos causando problemas inestimáveis. 
A prospecção de petróleo nos mares pode ser um ponto de altíssimo risco como visto este ano no golfo do México, onde milhões de litros de petróleo vazaram contaminando uma extensa área. O próprio transporte do petróleo e de seus derivados por navios petroleiros e mesmo por oleodutos pode por em risco ecosistemas por onde passam à medida que acidentes podem acontecer. 
No caso dos petroleiros, o caso clássico do Exxon Valdez, que afundou e despejou milhões de litros de petróleo no Alasca – no que é considerado o maior acidente ambiental de todos os tempos na América. Além disso, o desmatamento, a transposição de rios e a falta de regulamentação de uso e descarte de substâncias tóxicas constituem problemas muito sérios que devem estar na prioridade de todos os governos mundo afora para que nosso Planeta tenha minimizados os episódios de agressão e para que assim, nossos netos tenham um mundo menos poluído para viver.
Até a próxima!”