As eleições majoritárias do Rio de Janeiro trouxeram um quadro bastante previsível. As previsões se confirmaram e as análises prévias apontaram com exatidão vencedores e vencidos.
Para governador, Sérgio Cabral teve uma votação até um pouco superior à esperada. Creditaria a este movimento um certo “voto útil” de eleitores influenciados pelas pesquisas ou que optaram por não anular o voto.
O resultado indica, também, a tibieza das demais opções. Fernando Gabeira não conseguiu emplacar sua proposta de governo fora das zonas mais abastadas e nem mesmo conseguiu atrair para si os votos dos candidatos presidenciais que o apoiavam: Serra e Marina, somados, tiveram cerca de 54% dos votos, ao passo que o ex-guerrilheiro e neo-conservador ganhou apenas 21%.
Eu arriscaria dizer que houve um voto casado entre Cabral e Marina em áreas mais fortemente impactadas pelo denominado “voto evangélico”. A imagem pública do candidato do PV não o auxilia na penetração entre este grupo de eleitores, bem como sua opção tardia pela defesa dos interesses da elite aristocrática da cidade.
A grande novidade é a guinada ao centro dada pelo eleitor, que reelegeu Cabral com um leque de apoios mais à esquerda que em 2006. Pode ser o final de um predomínio que já durava 18 anos no Rio de Janeiro, até porque os líderes desta vertente política foram fragorosamente derrotados nas urnas.
Peregrino, o terceiro candidato, na verdade lançou-se apenas para permitir um palanque político a Antony Garotinho, ex-governador e candidado a deputado federal. Basta dizer que seu total de votos foi pouco acima do recebido pelo próprio Garotinho para o pleito proporcional. Entretanto Peregrino sai cacifado para cargos legislativos nas próximas eleições, certamente.
Como escrevi aqui neste blog na última sexta feira, o eleitor julgou que os feitos de Cabral foram maiores que os problemas do mandato. O desgaste da direita após anos de domínio absoluto e a falta de uma candidatura competitiva de centro esquerda também contribuíram para esta votação esmagadora.
Porém não dá para questionar a opção do PT em abdicar da candidatura ao governo e focar o Senado. O longo tempo perdido insistindo na figura de Benedita da Silva como candidata a cargos majoritários – como escrevi em março – havia deixado o partido sem quadros competitivos para empreitadas de maior fôlego. Como veremos abaixo, foi uma opção correta. Quanto à Benedita, elegeu-se deputada federal, mas com votação apenas razoável.

A grande notícia para o eleitor carioca, em especial àqueles setores de esquerda e centro esquerda foi a eleição para o Senado.
Após um jejum de longos doze anos, finalmente um candidato ligado às forças progressistas elegeu-se em um pleito majoritário: Lindberg Farias, como o senador mais votado pelo estado. Como também havia dito em março (de todos os nomes apontados ali, somente Brizola Neto não teve uma votação esmagadora, acabando por ficar fora da Câmara Federal por causa da votação estrondosa de Garotinho), o ex-prefeito de Nova Iguaçú revelou-se uma opção muito competitiva, confirmando o que premonitoriamente afirmara naquela ocasião.
Lindberg ligou a sua imagem à do Presidente Lula e do Governador Cabral e acabou beneficiado pela “onda vermelha” que varreu do Senado alguns dos nomes mais conservadores e anti-lulistas. Ainda terminou como primeiro colocado no pleito, começando a viabilizar o seu nome para disputar a sucessão do próprio Cabral – embora este diga que o candidato natural é seu vice, “Pezão”.
De qualquer forma o ex-prefeito cacifa o seu nome para vôos mais altos, tornando-se uma referência das forças progressistas no Rio de Janeiro. Após um longo período assistindo ao domínio das forças conservadoras, os progressistas estão de volta à arena política com chances de sucesso. Chico Alencar e Marcelo Freixo poderiam acompanhar o senador eleito, mas a política de alianças sectária do PSOL mais atrapalha que ajuda.

O leitor pode olhar o nome do atual Senador, Bispo Marcelo Crivella, e se perguntar: ué, é bom eleger um senador ligado à Igreja Universal ?

A questão é que os setores evangélicos, embora ainda significativos no espectro político carioca, demonstraram que não tem mais a mesma força de eleições passadas. O “Bispo” só foi eleito devido a uma significativa parcela de votos “úteis” dados por simpatizantes das forças progressistas a fim de evitar a eleição de Jorge Picciani e Cesar Maia. Isso mesmo, leitor: ao fim e ao cabo, quem reconduziu Crivella ao Senado Federal foram os votos ideológicos, de centro e de esquerda.

A favor do “Bispo” deve-se dizer que ele foi um dos senadores mais fiéis da base aliada de Lula. Este fator, com certeza, fez com que muita gente optasse por ele por, mal ou bem, votar no Congresso de forma progressista e significar menos problemas que seus dois principais adversários. Lembro que a diferença final entre ele e Picciani foi de pouco menos de 300 mil votos, o que demonstra quão decisivo este “voto útil” dos eleitores de esquerda foi.

O corolário desta eleição são duas notícias muito alvissareiras: a perda de imunidade parlamentar de Jorge Picciani e a aposentadoria do maior líder da “UDN” carioca, Cesar Maia.

Espécie de “eminência parda” do estado, Picciani atropelou na reta final puxado por Cabral e Lindberg, da forma como havia alertado na semana passada. Entretanto, a parcela da esquerda que se mobilizou para impedir a sua chegada ao cargo acabou por neutralizar a sensacional reação – ele praticamente dobrou seus votos em dez dias.

De qualquer forma, por ser quem é e ter eleito os dois filhos para os cargos proporcionais o político carioca deu uma demonstração de força. Entretanto, será interessante vê-lo sem imunidade parlamentar, a fim de que possa responder pelas suspeitas que pesam contra si – no mínimo, é um curioso caso de “gênio das finanças”: não tinha nada quando chegou à Assembléia Legialativa e hoje é um dos maiores empresários do ramo de touros para reprodução, dono de animais que chegam a valer US$ 2 milhões.

Por outro lado, finalmente assistimos à aposentadoria do ex-czar da cidade, Cesar Maia. Com uma votação decepcionante – pouco acima do pagodeiro e neo-pastor Waguinho, que obteve uma votação expressiva – sem dúvida estas eleições representam a aposentadoria do veterano político, dono da Cidade Maravilhosa por longos e insuportáveis 16 anos.

Ele sonhava sair do pleito como líder inconteste da direita nacional e acaba derrotado, aposentado e ainda tendo de se explicar sobre as muitas irregularidades da Cidade da Música

Há momentos em que a política nos serve pratos saborosos.

Mais tarde, o último texto da série, sobre o resultado das eleições proporcionais da cidade.

One Reply to “Eleições Majoritárias – Rio de Janeiro”

  1. Um comentário sobre o Senado, by Kibe Loco:

    “Lindberg, Renan Calheiros, Edison Lobão, Crivella, Roberto Requião e Marta Suplicy garantem vagas no Senado.

    Só faltou o Palpatine.”

    Não poderia ter dito melhor…

    Grande pergunta: Lindberg e Collor se tornarão grandes amigos? Dado o “pragmatismo” do PT, é bem capaz…

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