Sexta feira e nossa sugestão de música para o final de semana será um pouquinho diferente. Preparando o aniversário da Majestade do Samba, três sambas da escola. São composições que não costumam ser elencadas entre as “grandes” da escola, mas em uma agremiação com uma qualidade tão rica como a Portela sempre há espaço para a descoberta de pérolas.

São três sambas de estrutura bastante diferentes em relação às fracas e pasteurizadas músicas que vem embalando os desfiles em geral nos últimos anos.

O primeiro, do vídeo acima, é “Adelaide, a Pomba da Paz”, de 1987. Vejam como eram melhores os desfiles naqueles tempos, com a melodia do samba valorizada e a dança do samba se impondo sem esta aceleração absurda a que assistimos hoje.
Vamos à bela letra:
Adelaide, a Pomba da Paz
(Neném, Mauro Silva, Isaac e Carlinhos Madureira)
 
Como se fosse magia
Nosso poeta alcançou
O afã da poesia
Foi aí que clareou

Clareou é do infinito
Oh! Que tema tão bonito
Adelaide, a pomba da paz
Está escrito

Voa, voa, voa
Deixa a tristeza de lado
Voa, voa, voa
Vai levar o seu recado 

Leia esse matutino vai mudar o seu destino
Disse o tucano falador
Preciso de um mensageiro
Que seja bem ligeiro
Que leve a paz aonde for

Pomba, entre na floresta
Aproveite, a hora é esta
De aliviar a sua dor
Ilumine a escuridão
Faz feliz o coração
De qualquer sofredor, ô ô ô ô
São quatro letras
Que fazem sonhar
É o amor, que se espalha no ar
Neste dia de folia
Sigam o exemplo desta pomba
Desativem esta bomba
Prá ninguém se machucar

Amar é bom, amar é bom
É bom demais, é felicidade
É sinônimo de paz

1991 marca o ano de “Tributo à Vaidade”, o último samba da escola dedicado totalmente a si mesma. Escrito sob a ótica da própria escola – por isso sendo o único samba enredo com narração “feminina” que se conhece – a letra conta aquele que é o ápice para qualquer vaidoso: tornar-se o centro de uma conversa.
Este samba jamais ganharia a disputa nos dias de hoje por não repetir a sinopse do enredo “ipsis litteris”. Provavelmente ganharia uma versão da sinopse musicada, com muito menor qualidade. Aliás, algo que precisa ser repensado é este modelo atual de escolha dos sambas enredo.
Tributo à Vaidade
(Carlinhos Madureira, Café da Portela e Iran Silva)
 
Eu sou vaidosa
Eu sou assim
Vaidade não tem preço
Mas eu tenho seu apreço
Pois você gosta de mim

Eu sei que faço seu corpo arrepiar
Eu sei que você não vai sem me ver passar
Eu já vi você chorar
Na hora do meu desfile encerrar

Perguntei ao espelho meu
Qual delas é mais linda do que eu
Ele então me respondeu
Mas linda do que eu só eu

O meu azul veio lá do infinito
O meu canto é mais bonito
Salve Oswaldo Cruz e Madureira
Me chamam celeiro de bamba
A majestade do samba
Da velha guarda formosa e faceira

Eu sou e sei que sou
Mais fascinante, deslumbrante, mais amor
Bem sei que você aprova
Pois meu visual comprova
Eu sou luxo e esplendor

Olha eu aí
Cheguei agora
Cheguei pra levantar o seu astral
Posso perder, posso ganhar, isso é normal
Vinte uma vezes campeã do carnaval

O samba que fecha a nossa noite de sexta, 1994, é um de que gosto muito apesar dos percalços do desfile, com carros quebrados. Samba do campeoníssimo Cláudio Russo, então com vinte anos e assinando em sua escola do coração, o enredo sobre os primórdios africanos do samba gerou uma composição forte e de cadência deliciosa na avenida, como podemos observar acima. Gostaria de ter desfilado naqueles tempos.
Quando o Samba era Samba
(Wilson Cruz, Cláudio Russo, Zé Luiz)

África encanto e magia
Berço da sabedoria
Razão do meu cantar
Nasceu a liberdade a ferro e fogo
A Mãe Negra abriu o jogo
Fez o povo delirar
Deixa falar, ô, ô, ô
Deixa falar, ô, iaiá
Esse batuque gostoso não pode parar
Entra na roda ioiô
Entra na roda iaiá
Lá vem Portela é melhor se segurar

Axé vem de Luanda
Sacode negritude da cidade
Trazendo a bandeira do samba
N’apoteose da felicidade

Samba é nó na madeira
É moleque mestiço
Foi preciso bancar
Resistência que a força não calou
Arte de improvisar

Capoeira
O samba vai levantar poeira
Tem zoeira
Em Oswaldo Cruz e Madureira