O excelente blog “Classe Média Way of Life” – que descobri através de matéria na Carta Capital – coloca em seu post mais recente uma ilustração que, por si só, é auto-explicativa.
Existem classes médias e classes médias. Neste caso refiro-me à classe média metida a rica. Aquela gente da Barra e do Leblon, sabe ?
Fazem questão de manter distância da “gentalha” e sonham com um mundo onde pobres não existam. Entretanto, não pelos últimos deixarem de ser pobres e se juntarem à classe média; e, sim, através do extermínio puro e simples destes. De preferência, incendiando as favelas com os moradores dentro.
Domingo passado o jornal O Globo, que vem se notabilizando na defesa intransigente dos valores desta elite distorcida, veio com uma matéria defendendo abertamente a remoção das favelas. De preferência, para lugares onde as pessoas não sejam vistas e não atrapalhem a elite em seu consumo desenfreado e inútil.
Não por acaso, o ídolo desta classe é o falecido Carlos Lacerda que, reza a lenda, transformou o Rio Guandu em matadouro de mendigos.
Algo que pouca gente sabe é que favelas formaram-se na Zona Sul exatamente para atender à comodidade das classes ricas. Era importante naquela época, com o sistema de transportes ainda bem precário, que os empregados morassem próximos a seu local de trabalho. Portanto, não houve “invasões” ou coisas parecidas.
Chega a ser esquizofrênico, porque ao mesmo tempo em que se utiliza dos serviços prestados, da força de trabalho necessária e que defende o seu ganha-pão com muito suor e honestidade (às vezes mais honestamente que aqueles que os contratam), esta mesma unidade defende o seu exílio, de preferência acompanhada em sua viagem pelo “Zé Maria”.
“(…) para a Classe Média, a solução para este país é uma limpeza geral, eliminando mendigos, prostitutas, sem-terra, miseráveis, favelados, pessoas feias e desempregados. Ainda não se sabe quem ficaria responsável por lavar o carro e as panelas da Classe, mas pelo menos se evitaria problemas de grande repercussão, porque os filhos adolescentes não teriam a quem queimar ou espancar nos pontos de ônibus madrugadas adentro.”
Como vêem, apesar de classe média baixa eu também seria eliminado. Por ser feio…
Este extrato da população, felizmente, só é maioria nos editoriais de jornal e no DEM. O problema é que faz um barulho tão grande que acaba impondo à força algumas, ou boa parte, de suas idéias segregacionistas e de apartheid econômico e social.
Este tema não se esgota aqui e voltarei a ele proximamente. Entretanto, chamo a atenção para este fosso social que, cada vez mais, vemos em nossa sociedade. Isto é extremamente perigoso.
É claro que existem pessoas assim, com este ódio classista no coração, mas daí atribuir este ódio a todo um conjunto de moradores é meio demais além da conta. É o preconceito às avessas. Até pq favelamento é um problema? É. Fato. E porque? Porque consiste de moradias irregulares, mutias vezes redutos de criminalidade, e vivem as margens da lei (pagamento de impostos zero). Isto é fato. Não seria ideal que não existisse favela? Seria, claro. Que todos seus moradores vivessem em lares regulares, com segurança, correio, etc. E pode ser até mesmo onde estão. O sentido de reconstrução da favela em “comunidade” é algo exemplar. Não precisa remover as favelas, basta transformá-las, incluindo presença do Estado, cessão de direitos de propriedade, e regularização dos imóveis, regularização de endereços, etc. Não precisa de um lugar inteiro ficar as margens da lei. A ponto da polícia não poder comparecer para registrar ocorrências. Isto é um absurdo e até desumano com a maioria dos seus moradores honestos.
O peculiar é que o autor solta o verbo falando de uma “classe média” que existe na imaginação preconceituosa dele. Cadê dados de pesquisa sobre a opinião do pessoal? Inventar dados e generalizar sobre um público genérico não é algo salutar (nem honesto) de ser feito. Até pq a “classe média” não tem voz. Mas no Brasil serve para duas coisas: Pagar impostos escorchantes e tomar porrada de intelectual…classe média.
Pedro,
Como você sabe eu andei muito próximo dessa classe (afinal, estudei na PUC…) e diria que neste caso você foi mais restrito…
O que você escreveu é mais genérico. Vendo o caso da Uniban e a situação de remoção das favelas sob uma mesma ótica e minha experiência de vida, diria mais.
É ódio à diferença.
Quando você escreveu que seria eliminado por ser feio, diria que é o ponto perfeito. Você não pode ser magro demais, gordo demais, feio demais, usar roupa que “a sociedade” ache inadequada, gay ou lésbica demais, ou (a questão do post) ser pobre ou até rico demais.
Nossa sociedade valoriza o “bovinismo”. Comportamento de boi no pasto, manso, ignorando o que acontece em volta e todos parecidos demais para . Se preferir, trate como ovelhas, chame minha definição de “ovinismo” e pense numa “ovelha negra” no meio de ovelhas branquinhas… Daí vem a expressão “ovelha negra”, ora.
Ser “ovelha negra”, questionador, pobre, muito rico, gordo (hoje em dia, em qualquer quantidade…), muito magro, de opção sexual ou cor da pele diferente neste país pode ser uma desgraça. A não ser quando estes se juntam e resolvem fazer exatamente o mesmo que seus perseguidores fizeram…
O nosso problema se chama respeito à diferença. E não vejo solução a curto prazo. Pois as grandes religiões (catolicismo, judaísmo, islamismo), que abracam mais da metade da população mundial, ajudam a pregar o desrespeito às outras se afirmando como únicas. Você que faz parte de uma que prega respeito às convicções de outros, pode tocar no assunto.
Vamos lá, Henrin:
Quanto ao primeiro comentário, concordo quando fala que a solução é a urbanização. Não remover e tacar fogo como vejo muita gente boa defender.
Sobre o segundo: pelo menos a observação que faço me leva a achar que pode haver certa hipérbole irônica no texto, mas que mentiroso ele não é.
Bruno, você “pegou na veia”. É isso mesmo. Golaço.
E com certeza os dois temas que você propõem estão na pauta, pra volta do feriado. como escrevi no post, voltarei ao tema.
p.s. – Bruno, eu to quetendo escrever um texto sobre os evangélicos exatamente pegando isso que você escreve, mas ainda não consegui achar o tom exato. O tema é MUITO polêmico.
muito bom o texto, o leblon life style é propagado para o brasil todo as 9 da noite por zé mayer e compania limitada
Eu escrevi nos primórdios do blog um texto sobre novelas, como estímulo à maldade