Meus 19 leitores devem ter visto na imprensa o debate sobre o marco regulatório do petróleo, que deverá ser alterado após as descobertas dos campos do pré sal.

Basicamente, existem três modelos de exploração dos campos de petróleo hoje em dia no mundo:

1) Monopólio: existente em vários dos grandes produtores (Arábia Saudita, Irã, Venezuela, México), onde o Estado detém o monopólio da extração e do refino do petróleo. Normalmente, há uma empresa estatal que é a operadora deste monopólio.

À guisa de exemplo, a Saudi Aramco, a maior empresa de petróleo do mundo, é a estatal da Arábia Saudita, país que detém as maiores reservas provadas do mundo.

2) Contratos de Concessão: modelo adotado no Brasil atualmente, é utilizado em países que não sejam exportadores expressivos de petróleo. Leiloam-se áreas de exploração (os “blocos), e as empresas vencedoras ganham o direito de explorar aquela área por determinado período.

Se não encontrarem petróleo ou gás natural, podem devolver as áreas, mas não recuperam o investimento. Caso encontrem, possuem a propriedade do óleo e do gás encontrados, pagando ao Estado as taxas determinadas.

No Brasil, hoje, o modelo é este. As empresas concessionárias pagam royalties às cidades pelo uso do território das mesmas e a “Participação Especial”, que pode ser definida como um “pedágio” pago pela empresa para poder vender livremente o óleo prospectado, encontrado e extraído.

3) Partilha de Produção: utilizado em países exportadores como a Noruega e a Bolívia, é o seguinte: o Estado contrata – através de licitação ou não – empresas para explorar e extrair óleo e gás a seu serviço, e remunera a operadora através de percentagem do petróleo extraído. A área prospectada não pertence às empresas, que, na prática, prestam um serviço ao Estado e são remunerados em petróleo por este.

Com as descobertas do pré sal, faz-se necessário mudar o atual marco regulatório brasileiro. Por quê ?

Porque somente com as descobertas já anunciadas, o Brasil muda totalmente de patamar na geopolítica do petróleo, pois passa de auto suficiente para um potencial exportador. Além disso, a decisão sobre a utilização ou não das reservas passa a ser política de Estado outra vez.

Outro ponto que deve ser considerado é a taxa de sucesso de praticamente 100% encontrada na perfuração dos poços na camada pré sal. Normalmente, a cada dez poços furados se acha óleo em, no máximo, quatro.

Vem se falando na criação de uma empresa nova, estatal, para administrar as reservas brasileiras. Seguiria o modelo da Noruega, onde a Statoil, empresa de economia mista, é a operadora dos campos, sozinha ou em parcerias, mas existe a Petoro unicamente para administrar as reservas.

Outro ponto importante é a participação da Petrobras no processo. Existe a possibilidade de a empresa ser “contratada” para operar os campos novos, por ser uma empresa de economia mista e por ser a líder tecnológica nas condições extremamente inóspitas de exploração em águas ultra-profundas.

Outra corrente defende o aumento da participação do Estado na empresa, tornando desnecessária a criação de uma nova empresa estatal. A Petrobras seria a fiel depositária e a operadora destes campos.

Setores da oposição parlamentar e da imprensa advogam a manutenção do sistema atual de parceria, com a proibição da atuação da Petrobras nas novas áreas e ampliação da presença transnacional na exploração de petróleo. Este seria transformado em pura “commodity”, com o Estado renunciando ao papel geopolítico de deter grandes reservas de óleo e gás.

No modelo de partilha de produção, o Estado fica com a maior parte da mesma. Daí, poderemos ter três formas de operação:

1) O Estado remunera com parte da renda do petróleo a empresa contratada;
2) Uma empresa, estatal, é determinada como operadora destas reservas;
3) Um modelo misto, formam-se consórcios, mas com a empresa operadora dos campos determinada pelo Estado;

Outro fator que precisa ser levado em consideração é o reembolso à Petrobras dos investimentos feitos no desenvolvimento da tecnologia adequada à perfuração (campos de sete quilômetros de profundidade, incluindo uns dois de sal, este em forma líquida devido à absurda pressão) e à pesquisa destes campos.

Parece mais ou menos claro que, mesmo que a empresa não seja determinada como operadora do Estado, seja reembolsada através da entrega de áreas sem licitação – que, neste modelo de partilha, é opcional.

Não arrisco indicar o modelo que o governo adotará, mas pessoalmente acredito que a Petrobras, através de um aumento de capital, estaria perfeitamente apta a desenvolver o papel de guardiã destas reservas e destes campos petrolíferos. A empresa é de controle estatal, tem tecnologia, tem acesso a crédito e pessoal qualificado.

Quanto ao modelo, acredito que é necessária a mudança para o modelo de partilha de produção. Todos os países exportadores não-monopólios procedem assim, pois contempla o papel geopolítico do óleo e do gás no tabuleiro internacional. Até porque não se sabe quanto de óleo há nas áreas não prospectadas.

Lógico que não esgoto o tema neste texto, mas já dá uma boa noção dos interesses que o tema envolve. E explica a CPI da Petrobras…

(Foto: Petrobras)

12 Replies to “Petróleo, Pré Sal e Marco Regulatório”

  1. Se realmente houver essa capacidade de produção da camada pré sal, a Petrobrás vai ser pelo menso uma das treis maiores produtoras/extratoras de Petróleo…
    Hummmmmmmm!!!!!!!
    Será que o LuLa e sua troupe ainda vão estar no poder?????

    Migão agora sério, me parece pelo que eu li a respeito, para extração desse petróleo do pré sal, será necessário um investimento absurdo que hoje a Petrobrás não possui…
    Será verdade???

    Abs

  2. Tarcísio, infelizmente muita coisa eu não posso falar, mas seu chute não parece tão chute assim não.

    Mas procure ver o que já foi anunciado de reserva e extrapole para o total da área.

    Quanto à questão financeira, não parece ser o maior problema, porque este desembolso é ao longo do tempo.

  3. Acabei de perder um comentário…:-(
    vamos lá, de novo:

    Oi Migão!
    .
    Ainda acho que o problema maior está por vir, principalmente quando forem discutir este novo modelo de concessão, se é que terá um novo modelo.
    Se não estou enganada, o governo anterior já queria mudar este esquema de leilão, ou não?
    Outra coisa, o TCU afirma não ter aprovado o que exatamente? quais tipos de contas?
    E se vc, que atua lá dentro diz que seria necessário um novo modelo de partilha, imagine para o governo que está(rá) no poder quando este lucro todo começar a jorrar da bacia?
    Aí, acho eu, que pra evitar um comportamento populista,seria necessário tornar sim a empresa menos estatal.
    Outra coisa,esta matéria da carta capital está disponível no site?

  4. Li, achei muito bom, levanta uma bola excelente. Não formei opinião sobre o melhor modelo, mas três coisas têm que ser salvaguardadas:
    1 – A soberania nacional, inclusive e principalmente a possibilidade de tomada de decisões estratégicas quanto às reservas e seu uso. Com os novos campos, o Brasil passa a ter a dobradinha àgua potável+energia disponível, o que coloca o País numa posição privilegiada nas próximas décadas.

    2 – O direito da Petrobrás, na posição de instituição de direito privado, e desenvolvedora das pesquisas e tecnologias necessárias para a descoberta e exploração das áreas.

    3 – A competitividade econômica do País, principalmente em se levando em conta a utilização política das estruturas do Estado.

    A meu ver, uma das opções possíveis – e nunca colocada à mesa – é um novo modelo societário/gerencial para a Petrobrás, blindando-a do Estado. Mais ou menos como a gente discute para o Flamengo. (rsrsrsrsr)

    Se você permitir, gostaria de postar seu texto (com créditos, claro) para amigos meus.

    Affonso Romero

  5. Affonso, é claro que pode postar. Deve. Só peço para colocar junto o endereço do blog.

    Quanto às suas ponderações, a única ressalva que eu faço é de que o petróleo é política de Estado em todos os detentores de grandes reservas. Portanto, a Petrobras não pode se dissociar de política de Estado. Fica meio difícil blindá-la, a partir do momento em que é a administradora da riqueza nacional.

    Agora, por incrível quanto pareça a ingerência política na empresa diminuiu muito nos últimos anos.

  6. Tati, eu acabei não escrevendo isso, mas a legislação também vai prever o destino dos recursos. Vai blindar também o uso político dos mesmos.

    De uma coisa vocês podem ter certeza: petróleo é questão de Estado. Não dá para dissociar das empresas. Dissociar é entregar ao capital estrangeiro, entregando soberania.

    Quanto ao TCU, abafa o caso. Mas diria, por alto, que eles procuram chifre em cabeça de galinha.

  7. E quanto à ingerência política, imagino que possa mesmo ter diminuído, apesar do oba-oba da imprensa e da oposição em contrário. Eu trabalho numa empresa estatal num governo tucano, sei bem que estas coisas são universais.
     
    O que eu dizia sobre blindagem, vale menos para o aspecto estratégico (que tem mais é que ser político mesmo, no sentido correto da expressão) e mais para a política pequena, do empreguismo, do contrato viciado, estas coisas. É varejinho, mas somando tudo dá um impacto fodido na competitividade de uma empresa (novamente, vide Flamengo). E como a Petrobrás é muito importante na economia brasileira, impacta na competitividade nacional.
     
    Na minha época de petroleiro, havia (já) um conceito desenvolvido de gestão por delegação e resultados, com regras que liberassem a empresa da influência cotidiana de Brasília, deixando o dia-a-dia para a gerência técnica formada dentro da empresa. É meio utópico, mas deveria ser aprimorado e apresentado á sociedade como opção para algumas empresas e serviços do Estado.

    Affonso Romero

  8. Cara, eu lido com contratação de serviços aqui. Você não tem idéia dos controles que temos. Empreguismo também não ocorre porque é via concurso.

    Só para dar um exemplo, o Diretor de E&P, apesar de indicação política, é um geólogo respeitadíssimo, com 30 anos de companhia.

    Outra coisa ? Compare o lucro ano passado e o de 2002, último ano tucano lá.

    Quanto ao seu último parágrafo, de certa forma já ocorre isso na Cia.

  9. Observados o tamanho e o poder das duas empresas, a declaração de Morais é um despautério. As receitas da estatal mineira são hoje uma fração do faturamento da Petrobras, de 215,5 bilhões de reais no ano passado. O lucro, de 3,3 bilhões de reais em 2008, é um décimo do lucro da petrolífera, de 33 bilhões. O plano de investir 3 bilhões de reais até 2012 pode ser considerado tímido diante da previsão da Petrobras de aplicar 174 bilhões de dólares no mesmo período para explorar o pré-sal. Mas, guardadas todas as devidas proporções, há, sim, muitas semelhanças entre as duas. Assim como a Petrobras, que, sozinha, é a campeã em pagamento de impostos no Brasil, a Cemig é a maior arrecadadora de Minas.

    tomei a liberdade de copiar e colar parte de uma matéria da revista exame para conhecimento de todos,a matéria como um todo está neste link e trata sobre a CEMIG,a menina dos olhos do governo aécio,abraços.

    http://portalexame.abril.com.br/revista/exame/edicoes/0949/negocios/petrobras-aecio-489412.html

  10. Ronaldo, tem outra diferença: os tucanos ODEIAM a Petrobras. O pesoal aqui conta histórias do arco da velha.

    as eleições de 2010 serão decisivas, a meu ver, para o futuro do pré sal e da própria Petrobras.

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