Os cariocas tiveram o desprazer de assistir, nos últimos dias, aos vídeos com as peraltices da turma do governador Sérgio Cabral, em viagens realizadas a Paris e Monte Carlo em 2009. Muitos ficaram chocados com as relações perigosas entre o governador e o presidente da Delta Engenharia, construtora que parece estar mais suja do que pau de galinheiro.
As relações pouco republicanas do governador, infelizmente, não me surpreendem. O que me deixou particularmente impressionado, eu diria quase constrangido, com a tal da vergonha alheia, foi o comportamento da turma do Serginho. Homens com quarenta e tantos anos dançando a boquinha da garrafa, fazendo gracinhas sentimentais em público, cantando “com quem será que fulano vai casar” e se divertindo, em plena porranca, com juvenis guardanapos na cabeça a imitar os gorrinhos dos sete anões. Não resta dúvida: A turma do governador é composta de adultescentes clássicos.
(Registre-se que o algoz do governador Cabral, adultescente a começar pela ridícula alcunha de Garotinho, entende bem disso. A briga entre os dois meninos travessos exala, inclusive, o indisfarçável cheiro de um clássico napolitano entre a Camorra e a Cosa Nostra.)
É evidente que vivemos a praga da infantilização do mundo – e a essa desgraça somos submetidos cotidianamente. Os tempos atuais criaram a figura do adultescente, esse híbrido medonho – perdido entre o garotão e o adulto – que se recusa a conviver com o mistério do tempo e as suas marcas físicas e emocionais.
Visual bem transado, corpinho malhado de sibarita tardio, o adultescente frequenta micaretas, fala as gírias da garotada, conhece as boates da moda, curte o som do momento e alterna momentos de arrogância absoluta com instantes de fragilidade emocional. Vejo o adultescente, por exemplo, em certos apresentadores de televisão que, aos cinquenta anos, pulam serelepes enquanto hordas juvenis dançam ao som de uma música baiana sobre as delícias de um beijo na boca e do corpo molhado de suor. Adultescente que se preza, reparem, chama a cantora Ivete Sangalo de “a Ivete”, com inequívoca intimidade
Ser adultescente é frequentar festas plocs, bailinhos e shows na praia – tentando descolar, é claro, credencial para o espaço vip. O adultescente venera a alegria[e é por isso, paradoxalmente, um deprimido em potencial] e seu maior objetivo é ser feliz, como se isso fosse lá um horizonte decente para um sujeito. A felicidade desse bípede festivo, sua busca incessante, consiste em projetos de vida entusiaticamente elaborados, como a compra de abadás para pular o carnaval em Salvador ou a participação em uma festa de música eletrônica em Ibiza com o dj da moda.
Serginho Cabral e os seus amiguinhos são os adultescentes cheios de grana. Pintam cabelos de acaju ou de um preto mais preto que as asas da graúna, aplicam botox para driblar as rugas, tiram onda de que entendem de vinhos caros, viajam para os destinos da moda e esculhambam a coisa pública com hábitos de hedonistas rasteiros. Jatinhos particulares, ilhas em Angra, restaurantes proibitivos, uísque misturado com energético e aventuras sentimentais com modelos e manequins fazem parte do repertório da turma.
O melhor antídoto contra esse tipo infame, enquanto a praga de gafanhotos permanece tomando conta do milharal, é abrir uma gelada, sentar num boteco simples – onde esses elementos não entram – e ouvir um samba triste do mestre Silas de Oliveira, um tango do Discépolo ou do Gardel e uma seresta do velho Silvio Caldas. Prestamos, assim, reverência ao Tempo, divindade poderosa, e nos preparamos, nas esquinas da vida, para o dia em que o canto der espaço ao silêncio da noite grande – que, afinal, é o destino que nos aguarda.
Bem longe, de preferência, dos garotos superpoderosos, musculosos e minúsculos, fantasiados de menininhos felizes, com os bolsinhos cheios e as cabecinhas ocas.
Demais, professor! :) Saudade das suas aulas, tão boas quanto suas crônicas.