Nesta quarta, a coluna “Made in USA”, do advogado Rafael Rafic, escreve a quarta parte do compêndio sobre o conclave papal. Hoje indicando quais os possíveis nomes a serem utilizados pelo pontífice a ser eleito na semana que vem.
O Conclave Papal: Parte IV
Para compensar esse “defeito do meu radar” que mostrei ontem faço para o Ouro de Tolo um outro estudo, que também pode ser bastante interessante.
Dizem que o primeiro recado que o Papa dá ao mundo, até antes da famosa benção “Urbi et Orbi”, é a escolha do nome pontifício. Muitas vezes os papas escolhem seus nomes pontifícios de acordo com o que significam o santo relativo ao nome e ao último papa que adotou o nome.
Então listarei abaixo alguns dos nomes mais usados pelos últimos papas e que recados poderão estar embutidos nos mesmos. Observação: os nomes se seguirão em ordem aleatória, conforme eu me lembrei na hora em que escrevi o texto.
Iniciando, Paulo VII: São Paulo foi o grande pregador que propagou a fé cristã no início da Igreja e foi o primeiro a ter relações com fiéis de outras crenças – especialmente os judeus – criando as relações “inter-religiosas”. É exatamente disso que a igreja precisa: um papa pastor-pregador, que se faça entender por todos e que seja um grande embaixador da Igreja mundo afora (e a dentro também). Por sua vez Paulo VI foi o grande “papa de centro” do último século. Sempre que uma questão se dispunha em sua frente, ele ficava em algum lugar no meio do caminho.
É disso que a Igreja precisa: alguém que ao mesmo tempo abra a Igreja e não faça uma guinada brusca que a deixe completamente desnorteada nesse momento de crise. Principalmente: ao invés de chamar um Concílio Vaticano III, termine de pôr em prática o Concílio Vaticano II que foi um pouco travado por Montini e completamente esquecido por Wojtyla.
Para mim seria a melhor aposta para nome pontifício. O grande porém é que Montini não foi um papa reconhecido pelo seu pulso forte. Mas quem o foi recentemente além de Roncalli (João XXIII)?
João XXIV: Roncalli (João XXIII, foto) já inovara demais ao escolher esse nome e reabilitá-lo da “lista não-oficial de nomes pontifícios proibidos”, já que o último João, o XXII, morreu no longínquo ano de 1334 e já houve um antipapa chamado João XXIII entre 1410 e 1415. Normalmente, a existência de um antipapa com o nome automaticamente o coloca nessa lista.
Logo, o nome João está por demais atrelado à figura de Roncalli. E o que ele fez? Simplesmente não deixou pedra sobre pedra na Igreja em um papado curto. Portanto não espere outra coisa de um Papa João XIV: será outra revolução progressista muito forte na Igreja e não duvide de uma convocação quase instantânea de um Concílio Vaticano III.
Prevejo uns 10 Cardeais morrendo de infarto fulminante e outros 15 indo para o hospital em estado grave imediatamente após o anúncio desse nome pontifico pelo novo Papa.
João Paulo III: nome improbabilíssimo, dado ainda à grande força do vulto Wojtyla (João Paulo II). Além do mais, como o mesmo ainda é recente, daria uma idéia de continuidade. A continuidade desse papa seria a manutenção da visão conservadora apesar da extrema aparição pública e midiática do papa (o Papa Pop) além da continuação da bagunça administrativa atual, que é por opinião unânime a grande responsável por toda essa crise. Ou seja, tudo que eu não vejo saindo desse conclave.
Bento XVII: sobre o significado desse nome, já tratei na primeira coluna da semana passada. Seria um continuísmo sem qualquer fundamento. Claramente, apesar da intelectualidade extrema de Ratzinger e de seus maravilhosos escritos, a Igreja não deu certo neste último papado. Caso isso ocorra teremos mais do mesmo: conservadorismo, eurocentrismo e bagunça administrativa com muito menos brilhantismo intelectual (não vejo nenhum dos 115 votantes chegando perto de Ratzinger nesse ponto). Acho esse nome ainda mais improvável que João Paulo III.
Como o nome Pio entrou na tal “lista não-oficial de nomes pontifícios proibidos”, graças aos “trabalhos” de Pacelli (Pio XII), término os nomes escolhidos por Papas no Século XX. Abaixo coloco dois nomes um pouco empoeirados pela falta de uso, mas que poderiam ser úteis ao novo Papa – e por isso não descartaria seus usos.
Leão XIV: São Leão (que foi na verdade o Papa Leão I, indicado em 440) é um dos grandes da história do papado. Apenas ele, Gregório I e Nicolau I ficaram na história com o apelido de Magno. Pontificado longevo (como deverá ser o próximo), ainda mais pensando em termos de Século V, com sua habilidade diplomática salvou a população de Roma de sofrimentos decorrentes de derrotas em guerras. Foi um papa de pulso muito forte na parte litúrgica forçando a uniformidade da doutrina da Igreja, sendo um dos primeiros a afirmar a Monarquia do Bispo de Roma em detrimento da Pentarquia que comandou a Igreja em seu Princípio (Bispos de Roma, Constantinopla, Alexandria, Jerusalém e Antioquia). Foi o fim dessa pentarquia que muitos anos mais tarde criou o Grande Cisma do Oriente e causou a separação das Igrejas Cristãs em várias.
Por sua vez, o último papa Leão, Pecci, eleito em 1878, foi também um papa importantíssimo que, como nenhum outro em seu tempo, olhou com carinho as causas sociais, criando a semente do que seria o socialismo cristão. De papado bastante longevo, 24 anos, foi o escritor da grande Encíclica “Rerum Novarum”, que fundou as bases da Igreja Católica no novo mundo capitalista, extinguindo os últimos resquícios do pensamento feudal existentes na Igreja.
Foi nessa encíclica histórica que se escreveu o pensamento que não há porque a Igreja lutar contra o capitalismo, mas que ela deve envidar todos os esforços possíveis para guiar o capitalismo a ser mais humanitário e social. Ensinamento esse que até hoje está na base da doutrina católica. O porém do nome fica justamente pela criação por ele do “socialismo cristão” por Pecci, que por obra das presepadas de Leonardo Boff e do papa anti-comunista Wojtyla (João Paulo II) se tornou “pensamento non-grato” na Igreja atual. Porém ainda considero um forte nome para ser escolhido por um papa latino-americano.
Clemente XV: nome bastante difícil de ser escolhido. Ganganelli, o último Clemente, foi eleito em 1769 e teve um papado confuso. Porém ele foi eleito em um conclave de absurda duração: três meses e 179 escrutínios (sendo que alguns deles terminaram mais “acalorados” do que as apurações de antigamente do Carnaval no Rio de Janeiro).
Foi um exímio pregador, como se pede do novo Papa, teve pulso forte, especialmente contra os jesuítas. Além disso, entrou na história como homem virtuoso e íntegro, as duas virtudes necessárias do novo Papa. Como ponto fraco, apenas seu curto pontificado de quatro anos.
Já São Clemente (o Papa Clemente I), foi o quarto papa da história, tendo seu pontificado começado em 88, e foi, além de um grande pregador, uma pessoa que organizou muito bem a Igreja em seu começo (olha a excelência administrativa) apesar de todas as dificuldades. Para compensar Ganganelli, Clemente I teve um papado ligeiramente mais longo: nove anos.
É um nome interessante para se fazer uma escolha arriscadíssima (que pagaria fortunas nas casas de aposta).
Qualquer outro nome que saia seria uma tremenda surpresa (alias, o próprio Clemente já seria surpresa, sou o único a acreditar nessa possibilidade), mas nunca pode ser descartada. As escolhas baseadas nos nomes dos últimos papas estão ficando cada vez mais restritas e prevejo surpresas interessantes nas próximas escolhas. Será que já começará por essa?